Política

Bolsonaro “atravessou barreira legal” ao fazer campanha no 7 de Setembro, diz cientista política

A cientista política Carolina de Paula, no entanto, aposta que a justiça não levará adiante pedidos de adversários de Jair Bolsonaro para avaliar se ele cometeu abusos nos eventos do 7 de Setembro

Bolsonaro faz motociata no 7 de Setembro, no Rio de Janeiro. Foto: Ivan PACHECO / AFP
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Analistas e políticos afirmam que o presidente Jair Bolsonaro ultrapassou as linhas da legalidade ao fazer dos atos oficiais pelos 200 anos de Independência do Brasil um claro palanque eleitoral. Se haverá punição, é outra história. Partidos políticos adversários do presidente anunciaram ações na justiça alegando abuso do poder político e econômico por parte de Bolsonaro na data nacional.

“Ficou claro que ele atravessou a barreira legal fazendo dos atos um comício eleitoral, mas acho muito difícil haver punição. Acredito que o TSE e o Supremo Tribunal Federal vão segurar o quanto puderem essas ações, até para não abrir caminho para os apoiadores de Bolsonaro usarem desse ambiente de guerra jurídica e questionarem a validade das eleições como um todo”, disse à RFI a cientista política Carolina de Paula, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio do Janeiro (UERJ).

“Era uma data representativa que pedia um balanço de nossa história e reflexões sobre nosso futuro”, lamenta a analista da UERJ. Ela lembra que não é a primeira vez que o presidente usa da estrutura montada pelo poder público para fazer discurso de campanha e que em nenhuma ocasião houve sanção da justiça. “Ele poderia perder parte do horário eleitoral, por exemplo, para que seus adversários tivessem o direito de resposta, mas isso dificilmente irá acontecer.”

7 de Setembro vira palanque eleitoral

Bolsonaro discursou pela manhã em Brasília assim que terminou o desfile cívico-militar de 7 de Setembro, no qual atacou adversários, sugeriu comparação entre as primeiras-damas em declarações machistas e jogou para seu eleitorado mais conservador e religioso. À tarde no Rio de Janeiro ele pegou novamente no microfone e falou abertamente de eleição enquanto aviões da Força Aérea faziam acrobacias no céu pela data comemorativa.

“Vocês sabem o que é preciso fazer para que esse governo continue a melhorar o Brasil. Esse é um governo que respeita seus militares, que respeita a família, que honra a Deus. E faremos um governo muito melhor com a reeleição”, afirmou Bolsonaro.

Adversários do presidente disseram que o feriado nacional foi sequestrado pelo presidente em benefício próprio, passando por cima da regras eleitorais. “Participei de dois feriados do 7 de Setembro em época eleitoral como presidente da República. E a gente nunca usou essa data como instrumento de política eleitoral”, disse o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva. “O presidente atual, ao invés de discutir os problemas do Brasil, de dizer como vai acabar com a fome, com o desemprego, com o arrocho do salário mínimo, ele tenta me atacar.”

Para o candidato do PDT, Ciro Gomes, o balanço do feriado foi um misto de alívio, por não ter havido violência nas ruas, e revolta pelas atitudes de Bolsonaro. “Aliviado por não ter havido mortes, porque a gente temia que a irresponsabilidade do presidente pudesse estimular atos que descambassem para ações violentas. Mas profundamente frustrado, humilhado por assistir aos 200 de independência liderado por esse espetáculo de vulgaridade, de promiscuidade, de uso despudorado do dinheiro público para fazer comício, usando toda a estrutura do pode público”, criticou Ciro.

A candidata do MDB, Simone Tebet, destacou: “triste o país que tem um presidente preocupado com a sua masculinidade enquanto milhões passam fome, enquanto cinco milhões de crianças vão dormir sem ter o que comer. Um dia tão importante como esse e ele não fala em unir o país, não apresenta um projeto para tirar o país dessa situação. Lamentável o personalismo, o populismo desse presidente”.

Reflexo nas urnas

A analista ouvida pela RFI acredita que o tom conservador, ofensivo às mulheres e agressivo do presidente não atrai aquele eleitor que hoje é a menina dos olhos dos candidatos, os 20% de indecisos. “Não acredito que esse tipo de discurso tenha poder de convencer aquele eleitor que é menos radical, que ainda não decidiu o voto. A forma de falar, os assuntos abordados, isso tem ressonância entre os que já apoiam o presidente”, avalia Carolina de Paula.

Orientado por sua equipe, o presidente não falou em urnas eletrônicas e dosou as palavras sobre o sistema judiciário. “Todos temos que jogar dentro das quatro linhas da Constituição. Com a reeleição, irei colocar dentro dessas quatro linhas todos aqueles que insistem em atuar fora delas”, discursou Bolsonaro. Antes, num café da manhã, ele havia falado que a “história pode se repetir”, após citar eventos de tensão na política brasileira, alguns inclusive que terminaram com a ruptura institucional, como o golpe militar de 1964.

“Ele deixa no ar o que fará com o resultado das urnas. De todo jeito não vejo que Bolsonaro tenha apoio político para levar adiante um golpe, por exemplo. Veja que os presidentes da Câmara, do Senado e do STF não foram ao desfile, um evento que costuma contar com a participação dessas autoridades, ainda mais um bicentenário”, analisa de Paula. “Se o Exército estaria com ele numa ruptura institucional, não dá para saber com certeza. Acredito que não, pelas informações que temos hoje, mas podemos errar. De todo jeito, ele não conta com o apoio dos demais poderes”, completa.

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