Política

10 projetos de lei conservadores que podem avançar com Lira e Pacheco

Pautas de costumes perdem espaço para as econômicas, mas podem prosperar com aliados de Bolsonaro no comando do Congresso

O presidente Jair Bolsonaro celebra eleição dos seus aliados como novos presidentes do Congresso. Foto: Alan Santos/PR
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A chegada de dois aliados nas presidências do Congresso Nacional abre o apetite de Jair Bolsonaro em relação às chamadas “pautas de costumes”. O presidente da República já demonstrou abertamente o seu interesse em desenterrar projetos de lei e propostas de emenda à constituição que estão parados no Parlamento e que, por atenderem os anseios de apoiadores, podem alavancar sua campanha para 2022.

Para avançar nesse sentido, um importante passo já foi dado: derrotar Baleia Rossi (MDB-SP) na eleição da Câmara. Resta saber qual o poder que o chefe do Planalto terá por meio de Arthur Lira (Progressistas-AL).

Parlamentares e assessores legislativos ouvidos por CartaCapital creem que o Congresso dará prioridade à agenda econômica neoliberal, em consonância com o programa do ministro Paulo Guedes, o que minaria o espaço para a agenda de costumes. Entre as pautas prioritárias, estão a reforma administrativa, a autonomia do Banco Central e as privatizações de estatais, como a Eletrobras. Ainda assim, não significa que propostas de costumes sejam ignoradas.

“Em relação a outras pautas [fora da economia], ele se manifestou pouco”, diz o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ). “Convém a gente observar com atenção.”

Entre 2019 e 2020, foram 46 votações nominais que se referiram aos temas “defesa e segurança”, “direitos humanos e minorias” e “arte, cultura e religião”, conforme mostrou levantamento do Observatório do Legislativo Brasileiro, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Essas votações se referiram a somente nove projetos e proposições; desses, seis foram transformados em lei, e cinco dizem respeito à segurança pública.

Se, por um lado, o número revela baixa preocupação do Congresso com essas pautas, por outro, é possível perceber que as pautas relacionadas a segurança pública se mostram mais viáveis. Um indicativo de que Bolsonaro olha de forma estratégica para o assunto.

O cenário melhora se for confirmada a deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF) no comando da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, a instância mais importante da Casa, por avaliar a legalidade de todos os projetos que tramitam entre os deputados.

Cientista política e pesquisadora do OLB, Débora Gershon afirma que a conjuntura econômica não favorece as pautas de costumes. Mas textos que tratem de armamentismo, como regras para registro, porte, posse e comercialização, além de endurecimento de punições, têm mais chances de prosperar.

“Desde 2019, temos uma Casa mais conservadora, convergente com o governo na economia e na segurança”, diz a professora. “Mesmo em 2020, a bancada da bala teve força para levar à frente parte dos seus projetos. Isso pode continuar acontecendo, e agora mais facilmente organizado com a presidência do Lira na Casa.”

A seguir, CartaCapital elencou, junto com o OLB, dez projetos de interesse do governo que podem encontrar caminhos mais abertos na nova gestão da Câmara e do Senado.

Arthur Lira e Jair Bolsonaro. Fotos: Luis Macedo/Agência Câmara e Sergio Lima/AFP

1) Ampliação do direito ao porte de armas

Apresentado pelo próprio governo federal, o PL 6.438/2019 altera a Lei 10.826/2003 e estende o direito ao porte de armas para diversas categorias: guardas municipais, guardas portuários, agentes socioeducativos, polícia penal, auditores agropecuários, agentes de trânsito, oficiais de Justiça e do Ministério Público, agentes de fiscalização ambiental, membros da Defensoria Pública e advogados públicos federais.

Profissionais dessas categorias, portanto, terão o direito de andar armados durante a atividade de trabalho. Em alguns casos, o porte de armas poderá ser permitido em todo o território nacional, a depender de critérios estabelecidos pela Polícia Federal e autorizados pelo Sistema Nacional de Armas.

O PL aguarda designação de um relator na CCJ e na Comissão de Segurança Pública; falta também um parecer do relator na comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional.

Também está nas vistas do governo o PL 3.723/2019, que estende o mesmo direito a caçadores, atiradores e colecionadores. O texto já foi aprovado na Câmara e aguarda votação no Senado. A matéria está mais avançada porque foi aprovada em acordo conjunto com o PL 6.438/2019. Esse último foi postergado por ser mais polêmico.

2) Propagandas de armas na televisão

O tema do armamento também é favorito de um dos filhos do presidente, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

Há pouco tempo, em dezembro de 2020, Eduardo propôs a liberação da propaganda de armas de fogo, por meio do PL 5.417/2020. Atacadistas, varejistas, exportadores e importadores poderiam divulgar vendas de armas, munições e acessórios na televisão, no rádio, em jornais e revistas, redes sociais e aplicativos de mensagens.

O texto ainda não foi avaliado em nenhuma comissão da Câmara.

3) Excludente de ilicitude

Proposto pelo Executivo, o PL 6.125/2019 foi defendido por Bolsonaro para “prestigiar o policial”. O texto aguarda despacho do presidente da Câmara dos Deputados.

O objetivo é eliminar a culpabilidade de condutas ilegais em determinadas situações. Na prática, ações policiais que seriam consideradas ilegais poderão ser interpretadas como “legítima defesa”, quando praticadas em operações de Garantia da Lei e da Ordem, situações em que fica autorizado o uso das Forças Armadas.

Segundo o texto, o militar ou o agente que “repele injusta agressão” não poderá ser preso em flagrante. Fica prevista apenas a prisão preventiva, “desde que presentes os requisitos legais, nos casos em que existir indícios de excesso ou a não-incidência do excludente de ilicitude”.

Estão sob atenção também dois projetos da bancada da bala da Câmara que podem reduzir o poder dos governadores sobre a Polícia Militar e a Polícia Civil.

Segundo informações do jornal O Estado de S. Paulo, cria-se a patente de general para Polícia Militar e as listas tríplices para que a nomeação do comandante saia da indicação dos integrantes da corporação.

4) Redução da maioridade penal

Parada no Senado, a PEC 32/2019 muda a idade em que uma pessoa pode ser presa, de 18 anos para 16 anos, por crimes previstos na legislação. Ainda segundo o texto, menores de 14 anos podem ser presos por crimes hediondos, como tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo, organização criminosa e associação criminosa.

O projeto tem a autoria de dezenas de parlamentares, encabeçados por Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Falta o parecer do relator no Senado, Marcelo Castro (MDB-PI), para que ele avance. Segundo o colunista Leonardo Sakamoto, do UOL, o texto já tem o aval da Secretaria Nacional de Juventude do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, chefiado por Damares Alves. Gestores de áreas voltadas à juventude se manifestaram contrários.

Em agosto de 2019, Bolsonaro disse que pediria a Alcolumbre para dar andamento à proposta, pelo menos no que diz respeito aos crimes graves, mas o texto não foi votado.

5) Exploração mineral em terras indígenas

Também do governo federal, o PL 191/2020 aumenta condições de exploração de minerais e hidrocarbonetos em terras indígenas. Por restringir o usufruto dessas áreas, a proposta prevê indenizações a esses povos.

Órgãos e entidades já apontaram preocupação com esse projeto, como o Ministério Público Federal e o Conselho Indigenista Missionário, porque o projeto poderia levar à destruição de áreas ambientais hoje protegidas e ao desaparecimento físico de povos indígenas.

Para o OLB, a proposta tem natureza diferente às anteriores, por se confundir com a agenda econômica, “mas é um projeto conservador e muito caro ao governo”.

6) Ensino domiciliar na educação básica

Propostos por Jair Bolsonaro e por Eduardo Bolsonaro, os PLs 2.401/20193.261/2015 foram juntados a outro PL que trata do mesmo tema, mas já tramitava antes, o PL 3.129/2012. A ideia é autorizar o ensino domiciliar na educação infantil, no ensino fundamental e no ensino médio, para menores de 18 anos.

Entidades de educação afirmam que o projeto pode facilitar a privatização do ensino público e prejudicar o processo de ensino-aprendizagem pela falta do convívio entre alunos e professores.

7) Escola sem Partido

A ideia de uma escola “sem política ou ideologia de gênero” já foi defendida por Bolsonaro e figuras do seu círculo. Vários projetos tramitam na Câmara com esse espírito. O principal, o PL 7.180/2014, de Erivelton Santana (PSC-BA), dá “precedência aos valores de ordem familiar sobre a educação escolar, nos aspectos relacionados à educação moral, sexual e religiosa”. Uma nova versão (PL 246) foi apresentada por Bia Kicis em 2019, e analisada em comissão instalada naquele mesmo ano, mas em 2020 a pauta perdeu espaço para a pandemia.

Apesar de Bolsonaro ter simpatia com a pauta, ele já foi criticado por falta de engajamento pelo próprio movimento Escola Sem Partido. O fundador, Miguel Nagib, anunciou o fim de sua participação em agosto do ano passado.

8) Estatuto da Família

Na Câmara há mais de sete anos, o PL 6.583/2013 já foi aprovado por comissão especial em 2015 e teve amplo apoio de Bolsonaro quando era parlamentar. Em dezembro do ano passado, propostas dessa pauta foram defendidas em lançamento da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos, formada por 206 deputados e senadores.

Propostas do Estatuto da Família, de autoria de Anderson Freire (PR-PE), define a entidade familiar como o núcleo formado a partir da união entre um homem e uma mulher.

Como resposta à matéria, a oposição fez tramitar o Estatuto das Famílias do Século XXI (PL 3.369/2015), de autoria do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), na Comissão de Direitos Humanos e Minorias. O projeto amplia o conceito de família para que o estado reconheça a diversidade de configurações. No entanto, acabou sendo retirado de pauta em 2019, alvo de informações falsas. O texto voltou ao relator, Túlio Gadêlha (PDT-PE), mas não tramitou mais.

A ministra Damares Alves. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

9) Estatuto do nascituro

Antes de assumir o cargo, Damares Alves defendeu a aprovação do Estatuto do Nascituro, projeto que restringe os direitos das mulheres em relação ao aborto. O PL 478/2007 recebeu vários anexos de projetos similares e aguarda parecer na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher. O estatuto classifica o nascituro como ser humano concebido, incluindo os in vitro.

O projeto reforça punição contra o aborto, prevendo prisão entre seis meses e um ano para “apologia” ao procedimento e de um a dois anos para “indução” de outra mulher a realizá-lo. Para Damares, o melhor texto sobre o tema foi apresentado pelo deputado Diego Garcia (Podemos-PR).

“Visa a proteção da criança no ventre materno. Acho que tem interpretações equivocadas com relação a isso. O objetivo é a proteção do bebê no ventre materno. Assim como tem o Estatuto da Criança e do Adolescente, a gente quer ter um Estatuto do Nascituro”, disse Damares, em 2018.

10) Voto impresso

Sem apresentar provas para suas acusações de fraude no processo eleitoral brasileiro, Bolsonaro tem defendido a instalação do voto impresso para as próximas eleições de 2022.

A PEC 135/2019, de Bia Kicis, torna obrigatória a impressão de cédulas em papel na votação e na apuração de eleições, plebiscitos e referendos no Brasil. As cédulas não substituiriam a urna eletrônica, mas poderiam ser conferidas pelo eleitor e depositadas em urnas para fins de auditoria.

O texto já foi aprovado na CCJ da Câmara e ainda não foi ao plenário.

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