Diversidade

Contra o assédio, festival de música na Suécia proíbe homens

O Statement Festival só aceita mulheres, transexuais e não-binários. O objetivo é denunciar os abusos e as agressões

No Statement Festival, homem não entra
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Em protesto contra o assédio e a violência sexual, a Suécia iniciou na sexta-feira 31 um festival de música só para mulheres, transexuais e não-binários – aqueles que não se identificam nem como homem e nem como mulher. O Statement Festival, na cidade de Gotemburgo, é uma zona proibida para homens: trata-se, segundo os organizadores, de um evento histórico.

“Este é o primeiro grande festival de música do mundo sem a presença de homens, e que faz uma denúncia contra todos os abusos sexuais em nossa sociedade. Queremos simplesmente que mulheres, não-binários e transexuais sejam capazes de participar de um festival de música e se sentirem ao mesmo tempo seguros”, diz o comunicado do evento. 

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Para a criadora do festival, a apresentadora de rádio e comediante sueca Emma Knyckare, é razoável excluir os homens de um festival de dois dias de duração, “uma vez que as mulheres são discriminadas durante todo o tempo”:

“Posso entender as críticas, e o fato de que homens também gostariam de participar do festival. Mas espero que eles possam compreender o propósito maior do festival, e procurar outras atividades interessantes para ocupar seu tempo durante o evento. Creio que a maioria dos homens também gostaria de ver uma mudança na cultura de assédio”, disse Knyckare à rádio sueca. 

Agressões e estupros 

O festival foi organizado como um ato de repúdio aos crimes sexuais ocorridos em festivais de música do país no verão passado. A edição de 2018 do Bråvalla – o maior festival de música da Suécia – chegou a ser cancelada, por conta de denúncias de quatro estupros e 23 casos de abuso sexual ocorridos em 2017. 

“Fiquei aborrecida com o fato de que o foco principal da mídia, ao noticiar os casos de abuso sexual, eram sempre os imigrantes e o álcool, e não os homens em geral”, conta a fundadora do evento.

A ideia de criar o Statement Festival começou a tomar corpo a partir de um tuíte de Emma, em que ela escreveu: “O que vocês acham de criarmos um festival em que nenhum homem possa entrar, até que todos os homens aprendam a se comportar?”

Organização solidária

A resposta foi surpreendente. Na campanha de crowfunding lançada para financiar a ideia, a meta era arrecadar 500 mil coroas suecas (cerca de 230 mil reais) em um mês. Mas em apenas 21 dias, a contribuição de três mil doadores tornou o projeto possível. O festival é organizado pela Statement, uma entidade sem fins lucrativos. E a própria direção do festival Bråvalla, que havia decidido cancelar o evento de 2018, se ofereceu para apoiar os preparativos. 

“O objetivo principal é essencialmente conscientizar sobre a necessidade de acabar com a cultura do assédio, e fazer com que o Statement Festival não seja mais necessário no futuro”, disse Emma Knyckare ao jornal Göteborgs Posten.

Após o anúncio da criação do festival, sete homens apresentaram queixas ao Ombudsman sueco para casos de discriminação, que chegou a anunciar uma investigação sobre o caso.

Em uma das queixas, um homem argumentou que não achava justo ser impedido de assistir ao concerto da cantora sueca Frida Hyvönen – ao que os organizadores do festival responderam que ele teria oportunidade de assistir a outros shows da artista. Recentemente, o Ombudsman afirmou que não seria possível apresentar uma conclusão sobre as queixas apresentadas antes da data marcada para o início do festival. 

Proibido para machos

O palco do Statement Festival será uma zona proibida para homens – não só o público, como também os artistas e funcionários da organização do evento, serão compostos por mulheres. 

“Não se trata de punir os homens, e sim de dar a mulheres e transexuais a oportunidade de se divertir em um festival de música sem precisar ter medo”, argumentou Emma em declarações à TV sueca. 

A única exceção à proibição da presença de homens serão os transexuais masculinos. 

“Assim como as mulheres, os homens transexuais são frequentemente vítimas de assédio, violência e ameaças. Formam portanto um grupo extremamente vulnerável, e por isso são bem-vindos ao Statement Festival”, observam os organizadores. 

Entre os artistas, participam do festival nomes como Frida Hyvönen, Joy, Beatrice Eli, Maxida Märak e Tami T. Também estarão se revezando no palco algumas das melhores comediantes suecas, como Nour El Refai e Petrina Solange. 

“Uma mulher de Kiruna (norte da Suécia) me disse que finalmente ela vai ter coragem de ir a um festival de música, pela primeira vez desde Woodstock (em 1969, nos Estados Unidos). É muito bom saber que podemos passar uma sensação de segurança às mulheres”, disse Knyckare ao jornal ETC Göteborg. 

É possível até, diz a fundadora do evento, que o festival tenha cumprido parte de seu objetivo: “É difícil afirmar o que for. Mas de qualquer forma, não tenho ouvido falar sobre casos de violência sexual nos festivais de música deste verão na Suécia”.

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