CartaCapital

Ucrânia diz que aceita conversar, enquanto se fecha o cerco russo a Kiev; o essencial do 2º dia de conflitos

Horas após o Kremlin acusar o governo Zelensky de ‘desaparecer’, a Ucrânia afirmou que resta definir o local das tratativas

FOTO: DANIEL LEAL/AFP
Apoie Siga-nos no

Chegou ao fim o segundo dia de operação da Rússia contra a Ucrânia. A sexta-feira 25 foi marcada, no plano militar, pelo cerco das tropas de Vladimir Putin à capital Kiev. No campo diplomático, o destaque é o conjunto de sanções anunciadas por potências ocidentais contra o presidente da Rússia e outras figuras relevantes do governo.

Já na madrugada do sábado 26 pelo horário local, o porta-voz da Presidência da Ucrânia, Sergii Nykyforov, afirmou que o presidente Volodymyr Zelensky está disposto a negociar um cessar-fogo com a Rússia. Restaria definir o local e o timing das tratativas.

“Tenho de refutar as alegações de que nos recusamos a negociar”, disse Nykyforov. “A Ucrânia estava e continua pronta para falar sobre cessar-fogo e paz”, acrescentou, citando que “as partes estão se consultando sobre o local e o momento do processo de negociação”.

Trata-se de uma resposta ao governo russo. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou horas antes que a Ucrânia “desapareceu” após concordar com o início de negociações – escolhendo, inclusive, a Polônia como local para as conversas.

O governo da Rússia anunciou a disposição de enviar uma delegação para as tratativas com a Ucrânia. A reunião de cúpula poderia acontecer em Belarus, segundo o Kremlin. Por lá, o presidente Alexander Lukashenko já disse a Putin que “criaria as condições” para o encontro.

Segundo Peskov, “o lado ucraniano disse que reconsiderou a ideia de realizar negociações em Minsk (capital de Belarus), escolheu Varsóvia e desapareceu”.

O Kremlin estabeleceu suas condições para negociar o fim da operação militar: a “desmilitarização” e a “desnazificação” da Ucrânia, que deveria voltar a um status “neutro” – ou seja, longe dos tentáculos da aliança militar ocidental, a Otan.

Para os Estados Unidos, a oferta de diálogo por parte da Rússia não é crível. O porta-voz da diplomacia americana, Ned Price, disse que Moscou “sugere que a diplomacia se realize sob a mira de uma arma, quando as bombas, os disparos de morteiro e a artilharia de Moscou visam os civis”.

Enquanto isso, porém, as ações militares prosseguem. Nos primeiros minutos de sábado, o jornal norte-americano New York Times reportou diversas rajadas de tiros no centro de Kiev. Militares ucranianos registram que soldados russos entraram em um distrito ao norte da capital e que “grupos de sabotagem” já operam na cidade.

No fim da sexta 25, o prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, alertou que as tropas russas estão “muito perto da capital”. Ele projetou que a madrugada seria “difícil” para a cidade.

“Os grupos de sabotagem estão neutralizando as agências militares e policiais da cidade. As pontes estão sob proteção e controle especial na capital. Equipamentos militares e soldados das Forças Armadas estão na patrulha”, disse Klitschko em uma mensagem publicada via Telegram.

Pouco depois, Zelensky reforçou o alerta do prefeito: “Não podemos perder a capital. Falo com nossos defensores, homens e mulheres em todas as frentes: hoje à noite, o inimigo vai usar todas as suas forças para romper nossas defesas da maneira mais vil, dura e desumana. Vão tentar um ataque”.

Em meio ao avanço das tropas russas sobre o coração de Kiev, Putin pediu ao exército ucraniano para “tomar o poder” e derrubar Zelensky e seu entorno, a quem chamou de “neonazistas e viciados em drogas”.

“Tomem o poder em suas mãos. Acho que vai ser mais fácil negociar entre vocês e eu”, instou Putin em um discurso transmitido pela TV.

As sanções e a reação da Rússia

A União Europeia decidiu congelar os bens de Putin e de seu ministro das Relações Exteriores, Serguei Lavrov, no continente.

“O mais importante é que Putin e Lavrov, responsáveis por esta situação, sejam severamente punidos pela UE”, argumentou a ministra alemã das Relações Exteriores, Annalena Baerbock, em Bruxelas. “Vamos atingir o governo de Putin onde deveria ser atingido: não apenas o plano econômico e financeiro, mas no centro do poder.”

Mais tarde, a Casa Branca anunciou que os Estados Unidos também apresentarão novas sanções aos dois. Não há, porém, detalhes da extensão dessa medida.

Ainda na sexta-feira, o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, prometeu um pacote contra Putin, Lavrov “e seus companheiros arquitetos desta guerra bárbara”. O canadense também comunicou punições contra Belarus “por ser cúmplice da invasão do presidente Putin a uma nação livre e soberana.”

Diante das promessas de sanções, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, declarou que a Rússia “responderá, como sempre fez”.

“Faremos todo o resto da maneira que for benéfica para nós. Não consideramos mais necessário nos justificar ou reportar de alguma forma”, afirmou. Ela ainda enfatizou que o Ocidente demonstra “a impotência total de sua própria política externa ao impor sanções à Rússia”.

“O fato é que estamos perto do momento em que começa o ponto de não-retorno”, disse também Zakharova, que alertou tanto a Finlândia quanto a Suécia que enfrentarão “consequências militares e políticas prejudiciais” se tentarem ingressar na Otan, a exemplo da Ucrânia.

Já na madrugada de sábado no leste europeu, a Rússia vetou uma resolução do Conselho de Segurança da ONU promovida pelos Estados Unidos e pela Albânia para condenar uma “agressão” à Ucrânia.

A votação contou com as abstenções de China, Índia e Emirados Árabes Unidos. O Brasil, que ocupa assento temporário no conselho, se manifestou em prol do texto.

A resolução obteve o voto favorável de 11 dos 15 membros, mas a Rússia, que possui direito de veto, condenou a redação.

A Otan dobra a aposta

Peça central no xadrez geopolítico que levou à ação da Rússia contra a Ucrânia, a Otan não recua. O secretário-geral da aliança militar ocidental, Jens Stoltenberg, afirmou que reforçará a presença de tropas no leste da Europa e continuará a armar o governo de Kiev.

Além disso, a Força de Resposta da Otan foi ativada pela primeira vez como “medida defensiva”, em resposta à ação russa.

A Força, sob a liderança do comandante supremo da aliança, o general Tod Wolters, é composta por contingentes terrestres, aéreos, marítimos e de operações especiais. Isso não significa, porém, que militares serão enviados para a Ucrânia, país que não compõe a Otan.

Essa Força não foi mobilizada, mas está em stand-by, ou seja, de prontidão.

Segundo Stoltenberg, a Otan também continuará a enviar armas para a Ucrânia, inclusive para defesa aérea. Ele declarou, sem fornecer detalhes, que “alguns” dos 30 países que integram a aliança informaram o tipo de armamento que despachariam a Kiev.

O que mais você precisa ler:

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo