Política

Mensagens indicam que Aras tentou barrar inquérito a pedido de empresário golpista, diz site

Troca de mensagens interceptada pela PF mostra o dono da construtora Tecnisa, Meyer Nigri conversando com o PGR

O ex-procurador-geral da República, Augusto Aras. Foto: Evaristo Sá/AFP
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Mensagens interceptadas pela Polícia Federal indicam que a cúpula da Procuradoria-Geral da República supostamente agiu para proteger de investigação o dono da construtora Tecnisa, Meyer Nigri, após pedido do próprio empresário ao chefe do órgão, Augusto Aras. A informação foi obtida com exclusividade pelo site UOL nesta quinta-feira 24.

Nigri, um dos empresários mais próximos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), acionou Aras quando teve conhecimento que poderia ser um dos alvos de uma investigação que apurava a disseminação de mensagens golpistas.

Nos diálogos, Aras afirma que iria procurar o processo, e ainda antes de se manifestar nos autos, declarou ao empresário que a investigação ‘se tratava de mais um abuso do fulano’, uma possível referência ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.

A defesa de Meyer Nigri negou que ele tenha solicitado interferência no pedido de inquérito e disse que o empresário apenas “perguntou a opinião” de Aras sobre a investigação que iria tramitar na PGR.

Semanas após a troca de mensagens, a PGR pediu ao Supremo Tribunal Federal o trancamento da investigação contra Nigri e outros empresários, bem como a anulação de uma operação de busca e apreensão deflagrada por ordem do ministro Alexandre de Moraes.

O celular de Nigri foi apreendido pela Polícia Federal em agosto do ano passado.

Segundo a PF, Nigri usou de uma rede de contatos para criar proximidade de Augusto Aras para que o PGR atendesse suas demandas privadas.

“A análise das mensagens constantes no aplicativo do WhatsApp demonstraram que o empresário Meyer Nigri se aproveita da proximidade que possui com o sr. Augusto Aras, atual procurador-geral da República, para apresentar demandas privadas e/ou de interesse de grupos específicos (jurídico, políticos e/ou ideológicos)”, diz trecho do relatório da PF.

Além das mensagens trocadas com Aras, os diálogos ainda mostram que houve um encontro do empresário com a vice-procuradora-geral da República Lindôra Araújo.

Apesar da tentativa, a estratégia de Aras não obteve êxito, uma vez que o ministro Alexandre de Moraes autorizou a busca e apreensão contra os empresários sem a manifestação da PGR.

Veja trecho da troca de mensagens:

Meyer Nigri (18/08/2022 – 07:14:20): Bom dia
Meyer Nigri (18/08/2022 – 07:14:33): Pode falar?
Meyer Nigri (18/08/2022 – 07:20:53): “Exclusivo: Empresários bolsonaristas defendem golpe de Estado caso Lula seja eleito; veja zaps” (encaminha link de reportagem)
Meyer Nigri (18/08/2022 – 07:20:53): “Randolfe pede ao STF que PGR avalie prisão de empresários que defenderam golpe” (encaminha link de reportagem)
Meyer Nigri (18/08/2022 – 08:11:23): Que achou?
Augusto Aras (18/08/2022 – 08:12:14): Vou localizar o expediente, pois se trata de mais um abuso do fulano
Meyer Nigri (18/08/2022 – 08:12:23): Concordo

Nos bastidores de Brasília, Aras já havia se mostrado incomodado com a quantidade de pedidos de investigação protocolados pelo senador Randolfe Rodrigues.

Atuação da PGR

Após a PF ter deflagrado a operação contra Nigri, a PGR tentou enterrar a operação e anular as provas colhidas.

A vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, apresentou um recurso ao STF no dia 9 de setembro pedindo a anulação das buscas contra os empresários e o trancamento do caso. O pedido foi rejeitado por Moraes.

Em 20 de novembro, novamente Lindôra de manifestou contra o compartilhamento das provas do caso ao STF.

Além do fácil acesso à Lindôra e Aras, Nigri ainda mantinha contato frequente com um assessor da PGR, Antônio Rios Niko Palhares, com quem trocava mensagens com informações falsas de teor bolsonarista.

Em uma das visitas do empresário à Brasília, Palhares se ofereceu para buscá-lo no hotel usando o carro oficial da PGR, mas o empresário alertou que poderia haver problemas.

Posterior ao encontro com Lindôra, Nigri relatou a conversa com Aras.

“Oi amigo, tudo bem? Como é que está a tua viagem? Honfleur é um charme, não é? Olha, ontem, pena que você não estava lá, fui recebido pela Lindôra. Espetacular! É super legal! Adorei ela, muito legal, me tratou muitíssimo bem. Adorei conhecê-la. Ela combinou, pediu para se pudesse me passar o contato dela? Que eu quero falar com ela, tá bom? Mandar uma mensagem. Então aproveite. E parabéns pelo artigo de hoje, maravilhoso. Parabéns”, diz Meyer Nigri em áudio enviado em 20 de abril de 2022 a Augusto Aras, obtido pela PF.

Para além do pedido de intervenção da investigação que visava as mensagens golpistas, o fundador da Tecnisa ainda encaminhou diversas outras demandas privadas ao PGR.

Em 14 de março de 2022, Meyer Nigri enviou a Aras uma publicação contra um filme criado pelo humorista Danilo Gentili, acusado por bolsonaristas de fazer apologia à pedofilia. Aras respondeu: “Chocante. A competência é do primeiro grau. Provavelmente em São Paulo. Vou encaminhar para lá!”.

Em fevereiro de 2022, o empresário encaminhou a Aras a demanda de um advogado sobre uma disputa jurídica em tramitação no STF.

Na mesma época, Nigri pediu a Aras ajuda para que o Brasil pudesse declarar os grupos islamitas Hamas e o Hezbollah como grupos terroristas sem necessidade de aprovação do Congresso Nacional. Nigri é um dos empresários mais influentes da comunidade judaica no Brasil.

Em nenhum dos casos, Aras propôs efetivamente ajuda aos pedidos.

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