Entrevistas

Giannazi critica aproximação do PT com indicado de Tarcísio e diz que governo será ‘um horror’

Em entrevista a CartaCapital, o deputado do PSOL afirma que planejava formar uma chapa de esquerda na Alesp, em oposição a André do Prado (PL)

O deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL-SP. Foto: Agência Alesp
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A um mês da eleição para a direção da Assembleia Legislativa de São Paulo, o deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL) diz achar “péssima” a aproximação do PT com André do Prado (PL), o indicado do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) à presidência da Casa. A declaração ocorreu no mesmo dia em que a bancada petista se reuniu formalmente com Prado pela primeira vez, para apresentar as suas demandas.

O PT faz articulações para obter a 1ª secretaria, cargo mais importante da Alesp depois da presidência.

A justificativa dos petistas é que a bancada tem o “direito consolidado” de exercer a função, por obter a maior quantidade de deputados eleitos da Alesp, junto ao PL. Dessa forma, o PT deve não só compor a mesa diretora da Alesp com um aliado de Tarcísio, mas também votar nele para a presidência.

Já o PSOL, que elegeu seis deputados em sua federação com a Rede Sustentabilidade, lançou um manifesto em que declarou que nenhum dos seus integrantes votará em um aliado de Tarcísio.

Em entrevista a CartaCapital, Giannazi diz que tinha a ideia de formar uma chapa de esquerda com uma candidatura de oposição a André do Prado. O deputado afirma ter tentado atrair o PT para essa estratégia, mas a legenda não teria demonstrado disposição para esse acordo.

Dessa forma, o PSOL deve lançar a candidatura de Giannazi para a presidência, com o intuito de “fazer contraponto ao consórcio do bolsonarismo”. A sigla também deve se abster nas votações para os outros cargos.

Historiador e professor universitário, Giannazi foi eleito pela quinta vez à Alesp.

Em 2022, foi o 2º parlamentar estadual mais votado, perdendo apenas para Eduardo Suplicy (PT). Por ser o deputado paulista mais experiente e mais popular do PSOL, ele diz que seu nome é praticamente um consenso na bancada para a disputa na Alesp.

Para o deputado, Prado deve atuar como “soldado” de Tarcísio e pautar na Alesp os projetos de privatização de empresas públicas, como a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, a Empresa Metropolitana de Águas e Energia e a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos.

Confira os principais trechos da entrevista.

Na Assembleia Legislativa de São Paulo, petistas pretendem compor mesa diretora com candidato do PL. Foto: Alesp

CartaCapital: O PSOL terá candidatura única à presidência da Alesp?

Carlos Giannazi: Nós estamos tentando trazer o PT, o PCdoB e o PSB para uma chapa de oposição de esquerda. Se a gente não conseguir, nós vamos lançar uma candidatura própria da bancada do PSOL, para fazer um contraponto a esse consórcio de apoio ao bolsonarismo. Agora a candidatura à presidência não é mais o PSDB. É mais grave ainda. São Paulo virou um abrigo do bolsonarismo. É o principal ponto de apoio do Bolsonaro. Tanto é que ele já nomeou alguns secretários, como o Derrite, que são bolsonaristas. Apoiar uma mesa diretora que tenha o bolsonarismo encabeçando é grave. Nós até abrimos mão da cabeça de chapa se o PT vier, se o PCdoB vier.

CC: Nós sabemos que o PT pretende ocupar a 1ª secretaria e, hoje, inclusive, eles se reuniram com o André do Prado. Qual a sua avaliação sobre essa aproximação?

CG: Eu acho péssima. O PT não tem nenhuma vantagem, nem a luta social, nem a esquerda, em participar da mesa diretora. A mesa diretora só tem um cargo importante para a política, que é o de presidente. É ele quem tem a autonomia para pautar projetos. Quase um poder imperial. Os outros dois cargos da mesa diretora não têm poder nenhum. Eles cumprem a função de prefeitura, de administrar os recursos humanos e o prédio. Não têm uma importância política. Agora, apoiar um presidente que é bancado por um governador negacionista e bolsonarista, que fez parte de um governo que cometeu vários genocídios, entre eles o da pandemia e o dos indígenas, é grave. Não vale a pena. Para falar que tem espaço na mesa? Mas o espaço na mesa representa só mais cargos. Tem 200 cargos que são distribuídos. Tem uma questão fisiológica gravíssima dentro da mesa diretora.

CC: Mas o PT argumenta que, por ser uma bancada de muita expressão, teria esse direito consolidado de estar na 1ª secretaria.

CG: Não é bem um direito. Na verdade, tem uma tradição, uma lógica de proporcionalidade. Mas, na legislatura passada, por exemplo, o PL tinha a maior bancada e não ficou com a presidência, nem fez parte da mesa diretora. Depende muito. É mais uma tradição, mas nós não concordamos. O PSOL sempre disputou para fazer o debate, mostrar contradições, mostrar que a Assembleia não pode continuar sendo um puxadinho, um cartório, um departamento do Palácio dos Bandeirantes. É isso o que vai acontecer agora. Nós não queremos fazer parte disso. Não queremos legitimar esse tipo de comportamento.

CC: O senhor acha que o PT tem o interesse fisiológico de distribuir cargos?

CG: Eu não sei se ele tem esse interesse. Não posso afirmar. Mas eu não iria por esse caminho, mesmo tendo uma bancada forte. O PT sempre teve a maior bancada de oposição. Já teve 24 deputados, depois caiu para menos, e agora, nessa legislatura, tem 10. Do ponto de vista simbólico, isso é muito ruim.

CC: Mas o fato de participar da mesa diretora pode comprometer a qualidade da oposição do PT?

CG: Não, não. Eu acho que não. Mas eu acho que é um sinal ruim do ponto de vista simbólico. A oposição não. Depois, na oposição, nós nos unimos todos contra o governo Tarcísio, logicamente.

O deputado André do Prado (PL) é favorito de Tarcísio de Freitas para a Alesp. Foto: Reprodução/Instagram

CC: Qual seria o problema simbólico?

CG: Simbólico para a população. Como que um partido de esquerda compõe com uma chapa de um candidato que representa um governo negacionista, privatista, que é contra todas as nossas pautas? Um governador que foi ministro de um governo genocida. 700 mil pessoas morreram por conta do governo Bolsonaro, e esse governador fez parte e continua fazendo, porque ele tem uma base bolsonarista forte aqui em São Paulo. Simbolicamente, não dá, é impossível. Mesmo que o PSOL tivesse 30 deputados, não faríamos parte. Nós poderíamos entrar nesse consórcio. Hoje, com a Rede, nós somos seis deputados na Alesp. É uma bancada razoável. Poderíamos fazer parte da mesa, ter alguns cargos. Mas nós não entramos nisso.

CC: Isso não seria, também, fazer política? Se o governador está indicando um presidente que tem muitas chances de ser eleito, não é melhor estar na direção e ter esse espaço de negociação, em vez de apostar em uma candidatura com pouquíssimas chances de ganhar?

CG: Estar na mesa diretora não significa nada, porque o 1º secretário não tem poder nenhum. São questões administrativas e sobre distribuição de cargos.

CC: Mas, talvez, aumente a possibilidade diálogo com quem vai presidir a Casa.

CG: Não, nenhum. Olha, o PT votou no Cauê Macris e no Carlão Pignatari. Foi um verdadeiro massacre. [Os deputados foram presidentes da Alesp nos governos do PSDB de João Doria e Rodrigo Garcia]. Eles massacraram o funcionalismo público, privatizaram parques, florestas, cavernas. Não teve a mínima condição. Não tem acordo. Vem o rolo compressor do governo, e ter apoiado ou não o presidente não significa absolutamente nada. Nós nunca perdemos tanto como na gestão Doria e Rodrigo Garcia.

CC: E qual o rolo compressor que o André do Prado pode trazer junto com o governo?

CG: A privatização da Sabesp, da Emae, da CPTM, do Metrô. Ele [Tarcísio] vai trazer toda essa pauta privatista que ele já anunciou. Ele é mais privatista que os tucanos, que privatizaram quase tudo. O André do Prado vai ser um soldado dele aqui. Como todo presidente da Alesp, ele vai representar os interesses do governo e pautar os projetos, na hora que ele quiser, sem necessariamente ter o apoio do colégio de líderes. E o que o Tarcísio mandar, ele vai fazer, porque ele é bancado pelo Tarcísio.

CC: Em uma entrevista que fizemos, a líder do PT, Márcia Lia, disse considerar o André do Prado como “uma pessoa do diálogo e do consenso”. O senhor concorda?

CG: Ele é uma pessoa de diálogo e civilizada. Não é um bolsonarista de raiz. Como pessoa, eu não tenho nada contra ele. Agora, do ponto de vista político, ele vai trazer a pauta do governo Tarcísio para a Assembleia. Vai ser um horror para nós aqui. Agora mesmo, aqui na tribuna, estavam falando contra a Ouvidoria que fiscaliza a polícia. Essa pauta será fortalecida. Os bolsonaristas vão ter espaço nas comissões permanentes de direitos humanos e segurança pública. O governo Tarcísio é bolsonarista.

CC: A sanção da lei da cannabis e da proteção às mulheres em bares não demonstra que o governador pode ser menos feroz que o bolsonarismo?

CG: Sim. O Tarcísio não tem a mesma força em São Paulo como o PSDB tinha. O PSDB tinha uma blindagem da Alesp, do Tribunal de Contas, de setores do Tribunal de Justiça, do Ministério Público e da mídia empresarial. Ele [Tarcísio] já não tem tanta força, então, é mais enfraquecido e sensível à pressão. Extinguiram a Secretaria da Pessoa com Deficiência, nós fizemos mobilização, eu acionei o Ministério Público, fizemos atos, e ele recuou. Ele sentiu o desgaste. Mas a essência dele é o bolsonarismo. Sem o Bolsonaro, ele não existiria. Ele sabe disso.

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