Entrevistas

Por que o PT-SP quer compor direção da Alesp com indicado de Tarcísio

Em entrevista a CartaCapital, a líder Márcia Lia diz que petistas têm direito de ocupar 1ª secretaria e que vê André do Prado (PL) como ‘pessoa do diálogo’

A líder do PT na Alesp, Márcia Lia. Foto: José Antonio Teixeira/Assembleia Legislativa de São Paulo
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O Partido dos Trabalhadores de São Paulo abriu nesta semana as discussões formais entre os deputados eleitos sobre a votação que decidirá o novo presidente da Assembleia Legislativa.

Agora sob o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos), os petistas se preparam para a vitória de André do Prado (PL). Prado é indicado de Tarcísio e filiado ao partido do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do histórico cacique político Valdemar da Costa Neto.

O PT na Alesp pretende manter um nome na 1ª secretaria da Assembleia, o cargo que vem logo abaixo do presidente. Conforme mostrou CartaCapital, três petistas já disputam a candidatura ao posto.

Em entrevista, a deputada estadual Márcia Lia, líder do PT na Alesp, diz que ocupar a 1ª secretaria é um direito do partido, por conta do número de deputados da bancada: são 19 parlamentares da federação, mesma quantidade que o PL conseguiu eleger em 2022.

A participação na mesa diretora, sustenta ela, não comprometerá o caráter crítico do partido ao governo estadual. A parlamentar argumenta que a legenda ocupou o mesmo cargo nos governos do PSDB, quando os tucanos também dirigiram a assembleia, e mesmo assim os petistas não evitaram o enfrentamento.

“Nós seremos oposição ao governo do Tarcísio de Freitas, não tenha dúvida, afirma. “Não é porque a gente está na 1ª secretaria que vai deixar de fazer oposição.”

Ao mesmo tempo, a deputada avalia que o indicado de Tarcísio à Presidência é “uma pessoa do diálogo”.

Para serem eleitos a esses cargos, cada candidato precisa de 48 votos entre 94 parlamentares, na sessão que ocorrerá em 15 de março. A expectativa é de que o PSOL, também da oposição, marque posição divergente e também lance candidato à Presidência, em vez de aderir a uma chapa com o PL.

O deputado André do Prado (PL) é favorito de Tarcísio de Freitas para a Alesp. Foto: Reprodução/Instagram

Confira os principais trechos da entrevista.

CartaCapital: O eleitor não pode achar difícil de compreender por que a bancada do PT, que se diz oposição, coloca-se na mesa de um deputado do mesmo partido de Bolsonaro?

Márcia Lia: Vamos por partes. Primeiro, dizer que, internamente no PL, eles sequer têm um consenso ou são devotos do Bolsonaro. O PL é rachado no meio. Então, tem uns que são mais bolsonaristas, e os que não são tão bolsonaristas assim e que dialogam, inclusive, com outras linguagens. Isso é um ponto.

O segundo ponto é que a bancada do PT tem o mesmo tamanho da bancada do PL. Nós somos 18 deputados, mais a Leci Brandão, que é da federação. Então, nós somos 19 deputados, e o PL também tem 19 deputados. O tamanho é idêntico.

O governador, provavelmente, vai trabalhar na perspectiva de que seja o André do Prado. Pelo menos é o que a gente escuta nos corredores da Assembleia. E a gente, que está aqui já faz bastante tempo, a gente conhece o André e sabe que ele é uma pessoa do diálogo, uma pessoa do consenso.

Nossa bancada, por direito, tem assumido a 1ª secretaria há muitos anos. Que a bancada do PT, por ser a 2ª maior bancada da Assembleia Legislativa, ocupe o 2º melhor posto. Isso é uma disposição histórica dentro da Assembleia, a gente tem esse direito consolidado.

CC: É um direito ou um acordo?

ML: É um direito que nós temos consolidado ao longo dos anos dentro da Assembleia. É regimental que a 2ª maior bancada possa ocupar o 2º maior posto. Então, nós estamos calçados. Uma coisa é administrar a Assembleia, outra coisa é fazer oposição. Nós seremos oposição ao governo do Tarcísio de Freitas, não tenha dúvida disso.

Ocupamos a 1ª secretaria nos últimos anos dos governos do PSDB e fizemos oposição. Entramos com uma ADIN contra um projeto de lei que votamos contrariamente aqui. O Rodrigo Garcia foi chamado, porque discordávamos da Lei 17.557. Houve uma manifestação da AGU favoravelmente ao PT.

Então, não é porque a gente está na 1ª secretaria que vai deixar de fazer oposição. Mas, também, uma oposição consensuosa, que entenda que, quando um projeto seja bom para o estado de São Paulo, não vamos fazer oposição por oposição, porque é o PSDB ou o PL.

Por exemplo, nós somos terminantemente contra a privatização da Sabesp. Vamos fazer seminários, audiências públicas, vamos para a base discutir a não-privatização da Sabesp.

CC: Não há risco de ceder ao projeto do governador de privatização da Sabesp?

ML: De jeito nenhum, em hipótese nenhuma. Aliás, privatização nenhuma. Nós somos contrários.

Na Assembleia Legislativa de São Paulo, petistas pretendem compor mesa diretora com candidato do PL. Foto: Alesp

CC: O que pode haver de mudança com a saída do PSDB da Presidência da Alesp e a entrada do PL com a gestão do André do Prado?

ML: Acho que muda a correlação de forças dentro da Assembleia Legislativa, na medida em que os partidos de oposição têm mais deputados. Em alguns momentos, a bancada do PSDB pode dialogar com algumas sugestões que nós vamos dar. Já tivemos isso em dezembro. Em alguns momentos, o PSDB votou conosco, em projetos nossos.

A diferença entre o PSDB e o PL significa que nós teremos mais apoio na oposição. Isso abre a possibilidade de vencermos algumas batalhas.

CC: A nova gestão estadual tem a participação de Gilberto Kassab, uma figura muito forte, agora na secretaria de governo. Como a senhora entende o papel dele?

ML: Acho que o Kassab tem um papel muito importante, porque para o governo, porque ele é uma pessoa do diálogo, da política. Quando tiver algum projeto engasgado, tenho certeza de que ele vai abrir a porta para discutir.

A gente fazia isso com o PSDB. Quando a gente discordava de alguns pontos de um projeto, a gente apresentava emendas, realizava audiências públicas, fazia o debate e mudava, às vezes, pontos importantes. A partir do diálogo.

CC: Por mais que vocês sejam oposição, é por meio do Kassab que será possível um entendimento com o governador?

ML: O Kassab, hoje, ocupa três ministérios do governo Lula. Então, ele compõe, de uma certa forma, a base de apoio do governo Lula em Brasília. Eu penso que ele não tem interesse em arrumar confusão com os partidos de oposição. Nem com o PT, nem com o PSOL, nem com a Rede, nem com o PSB. A configuração política do Brasil hoje é outra. Bolsonaro não é mais presidente da República.

Eu estava lendo que alguns de partidos da direita, do próprio grupo evangélico, estão aderindo ao governo Lula. Só não vão discutir as pautas de costumes, porque são evangélicos. Mas, no restante, estão vindo. E é uma bancada que foi extremamente bolsonarista.

CC: A senhora já teve a oportunidade de conversar com o Kassab?

ML: Nós conversamos sobre questões pontuais que ficaram pendentes do governo anterior, em dezembro. Desde 2019, nós temos emendas parlamentares impositivas, que não estavam sendo pagas. A gente fez várias conversas com o Cauê [Macris, presidente da Alesp entre 2019 e 2021], com o secretário do governo do [João] Doria e do Rodrigo [Garcia].

Havia promessas de que elas seriam pagas, e elas não foram. Então, a gente conversou sobre a necessidade [do pagamento], porque nós estamos com uma ação judicial pronta. Na eventualidade de o governo dizer que não iria pagar, nós iríamos ingressar com a ação.

Não ingressamos, porque a sinalização foi no sentido de que olha, não fomos nós, mas a gente assume o bônus e o ônus, então nós vamos pagar. E estão pagando. Uma ou outra, não estão pagando tudo ainda, porque depende do fluxo de caixa.

CC: Qual a dimensão dessas emendas?

ML: É pouca coisa. No ano passado, nós tivemos seis milhões de emendas, para todos os deputados. A impositiva vem a partir da lei orçamentária e tem um percentual. Era 0,3% da receita líquida.

CC: Então, isso já é um gesto de diálogo do governo?

ML: Sim, é um gesto de diálogo do governo, de acertar coisas que ficaram atrasadas. Essas emendas são direitos nossos porque estão na lei. O que estamos pedindo é nada mais, nada menos, do que o direito nosso.

CC: O PT participou da discussão sobre o tema do salário do governador. Como a senhora tem pautado esse assunto? [A deputada votou a favor de projeto a respeito. Veja aqui]

ML: Na verdade, há oito anos não havia reajuste. Eram reajustes de ajustes, de duzentos reais, quinhentos reais, trezentos reais. A gente achava que, há oito anos, sem que a gente tivesse podido, vamos dizer assim, acompanhar a reposição inflacionária, não era correto. Então, nós optamos por fazer o debate. Fizemos o debate e concordamos com o aumento do salário. Mas isso é matéria vencida já.

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