Política

Entidades criticam ‘campanha de sabotagem’ e pedem avanço na vacinação infantil

Em manifesto, signatárias do Pacto pela vida e Pelo Brasil repudiaram ‘declarações enganosas de autoridades do governo’ com intuito de minar confiança de pais para imunizarem seus filhos

Foto: NELSON ALMEIDA / AFP
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Entidades signatárias do Pacto pela Vida e Pelo Brasil, lançado em 2020 face ao agravamento da pandemia no país, criticaram o que chamam de “campanha de sabotagem” à vacinação infantil e conclamaram o avanço da imunização em crianças e adolescentes. Em posicionamento divulgado nesta sexta-feira, repudiaram as “declarações enganosas de autoridades do governo” com a finalidade de minar a confiança de pais.

No manifesto, as entidades citam o desprezo ao direito à saúde e à vida, bem como o desrespeito à Constituição e ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nas falas de integrantes e apoiadores do governo. O presidente Jair Bolsonaro (PL) recentemente atacou a vacinação infantil e minimizou as mortes de crianças com idade entre 5 a 11 anos. Embora tenha falado que o número de óbitos é “quase zero”, o Ministério da Saúde contabilizou mais de 300 vítimas nesta faixa etária desde o início da pandemia.

No dia em que as primeiras doses de vacinas contra a Covid-19 foram aplicadas em crianças, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, evitou recomendar a imunização infantil e disse que os pais têm liberdade de escolha quanto a esta questão. O ministro já havia contestado a decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de aprovar a vacinação nesse grupo. Ele também chegou a defender a apresentação de pedido médico para vacinar crianças sem comorbidade.

“Declarações enganosas de autoridades do governo, na contramão do que tem sido feito pela autoridade sanitária, a Anvisa, poderiam sugerir que o Brasil pouco ou nada aprendeu nesses mais de dois anos de luta contra o vírus. Que falhamos como Nação. Que abrimos mão de compromissos éticos. Que retrocedemos no tempo. Mas, não nos enganemos: a sociedade brasileira não vive dentro da bolha do negacionismo“, escrevem as entidades.

As entidades conclamam que governadores e prefeitos tomem medidas para agilizar a vacinação e pedem que pais e familiares cobrem o Estado brasileiro. Elas lembram que o Brasil “conquistou reconhecimento internacional pelo seu programa de imunização” e controlou doenças que afetavam o público infantil.

“Manobras para desacreditar as vacinas, com o bombardeio incessante de declarações infundadas, têm tão somente por finalidade minar a confiança dos pais diante do que é correto e inadiável fazer: vacinar as crianças, garantindo-lhes proteção diante de um agente infeccioso grave”, afirmam.

Assinam a manifestação a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, a Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

No mais recente episódio, aliados do governo questionaram a vacinação infantil após uma menina de 10 anos apresentar alterações cardíacas horas depois de ser imunizada em Lençóis Paulista (SP). Uma investigação conduzida por mais de 10 especialistas, no entanto, apontou que seu quadro clínico não tinha relação com a vacina. A análise descobriu uma doença congênita rara, até então desconhecida pela família da criança.

A deputada bolsonarista Carla Zambelli, que solicitou que Ministério da Saúde e Anvisa suspendessem a vacinação infantil para apurar supostas reações adversas, foi uma das que disse que iria acompanhar o caso de perto. Ela não se manifestou após o resultado da investigação do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. A ministra da Mulher, Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, e o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, visitaram a menina no hospital.

Leia a íntegra do posicionamento:

PACTO PELA VIDA DAS CRIANÇAS BRASILEIRAS

Nós, entidades signatárias do Pacto pela Vida e Pelo Brasil, lançado em 7 de abril de2020 face ao agravamento da pandemia, voltamos a unir nossas vozes no clamor por aqueles que assistem, silentes e sem poder de ação, a situações que colocam em risco a sua própria vida. Falamos de milhões de crianças e adolescentes brasileiros, sobre os quais é urgente pensar com lucidez, responsabilidade e profundo sentido ético.

O enfrentamento da Covid-19, no curso de uma crise sanitária que abalou o mundo, prenunciou a necessidade de imunização da população infanto-juvenil, como já vem ocorrendo em vários países. Sabia-se que a vacinação teria que chegar às crianças, protegendo-as de um vírus contagioso e mutante, com impactos diversos sobre o organismo. No entanto, chegada a hora, mais uma vez armou-se o circo da insensatez no Brasil, buscando semear o tumulto e afastar o país do seu destino.

Manobras para desacreditar as vacinas, com o bombardeio incessante de declarações infundadas, têm tão somente por finalidade minar a confiança dos pais diante do que é correto e inadiável fazer: vacinar as crianças, garantindo-lhes proteção diante de um agente infeccioso grave.

O Brasil, e não é de hoje, conquistou reconhecimento internacional pelo seu programa de imunização. Gerações cresceram atendendo às convocações para vacinações diversas e assim foi possível controlar doenças que assombraram a população infantil e tantas famílias — entre elas, o sarampo e a poliomielite. Imunizou-se muito e bem, num país de dimensão continental e grande desigualdade.

Hoje não se pode aceitar a campanha de sabotagem em torno da vacinação pediátrica, no curso de uma pandemia ainda longe de ser controlada, desprezando o direito à vida e à saúde de uma faixa etária com cerca de 69 milhões de brasileiros — porque é disso que se trata, em flagrante desrespeito à Constituição e ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Estarrece constatar que tal situação esteja acontecendo no país que, tristemente, tornou-se um dos recordistas de mortes por Covid no planeta – cerca de622 mil óbitos até o momento, boa parte deles evitável.

Declarações enganosas de autoridades do governo, na contramão do que tem sido feito pela autoridade sanitária, a Anvisa, poderiam sugerir que o Brasil pouco ou nada aprendeu nesses mais de dois anos de luta contra o vírus. Que falhamos como Nação. Que abrimos mão de compromissos éticos. Que retrocedemos no tempo. Mas, não nos enganemos: a sociedade brasileira não vive dentro da bolha do negacionismo. Ela conhece muito bem a dura realidade, sente na pele os desafios, escuta o que diz a ciência e assim defenderá o direito à vacina infantil, contra o SARS-CoV-2.

Certos disso, conclamamos governadores e prefeitos a não poupar esforços para que a imunização pediátrica avance rapidamente pelo país, em grandes mutirões, alcançando todas as crianças, e sem esquecer jamais das que vivem em condição de vulnerabilidade. Conclamamos mães, pais, familiares e professores a exigir do Estado brasileiro o que é preciso neste momento, para garantir não só a saúde, mas o futuro dos mais jovens. E, por fim, mas não por último, conclamamos cidadãos e cidadãs a formar conosco um cinturão de lucidez no enfrentamento da pandemia, que esperamos ver superada. Como uma sociedade livre e democrática, construída sobre os pilares da ética, do bom senso e do bem comum, sairemos disso mais fortes.

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