Política

Câmara aprova regras para atendimento de mulheres indígenas vítimas de violência doméstica

Projeto segue para votação no Senado

Câmara aprova regras para atendimento de mulheres indígenas vítimas de violência doméstica
Câmara aprova regras para atendimento de mulheres indígenas vítimas de violência doméstica
A deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG) teve seu projeto que prevê regras de atendimento a mulheres indígenas vítimas de violência doméstica aprovado na Câmara. Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados
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A Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que estabelece medidas para o atendimento de mulheres indígenas vítimas de violência doméstica e familiar. O texto será enviado ao Senado.

De autoria da deputada Célia Xakriabá (Psol-MG), o Projeto de Lei 4381/23 foi aprovado na forma de um substitutivo da relatora, deputada Juliana Cardoso (PT-SP). O parecer da relatora foi lido em Plenário pela deputada Jack Rocha (PT-ES).

O texto aprovado lista procedimentos de atendimento, requisitos para as delegacias cumprirem as normas e direitos das mulheres indígenas.

São consideradas indígenas aquelas que assim se identificarem em qualquer fase da apresentação da queixa, do procedimento investigatório ou do processo judicial.

Célia Xakriabá afirmou que a proposta é necessária para evitar ações como a morte de mulher da etnia guarani kaiowá nesta quarta-feira 19 por golpes de foice na cabeça. “Quando a mulher indígena é morta, a floresta e as águas morrem junto”, disse.

A deputada informou que o projeto, o primeiro a ser protocolado em duas línguas indígenas, será traduzido para outros 274 idiomas de etnias indígenas no Brasil.

Uso de intérprete

De acordo com o texto, o atendimento à mulher e à criança indígena vítima de violência doméstica e familiar deve ser realizado de forma presencial e individualizada, com respeito a suas crenças e valores, desde que não afetem os princípios constitucionais. Sempre que necessário, deverá ser utilizado um intérprete, e o atendimento deve ser feito com garantia de sigilo e confidencialidade das informações.

O trabalho de intérprete deverá ser, preferencialmente, voluntário e poderá ser prestado à distância, com meios de tecnologia da informação.

O atendimento com esses parâmetros envolve a rede de apoio multidisciplinar composta pelos órgãos públicos responsáveis pela defesa dos direitos políticos e das garantias constitucionais, pela política nacional de saúde e pela política indigenista.

Os órgãos envolvidos deverão tomar providências para evitar a revitimização da mulher ou da criança.

Direitos previstos

Quanto aos direitos, o texto aprovado prevê que a mulher indígena vítima de violência doméstica e familiar:

  • será recebida por servidor capacitado para o seu atendimento;
  • terá o direito de narrar os fatos sem interrupções ou constrangimentos;
  • poderá solicitar medidas protetivas de urgência, nos termos da Lei Maria da Penha;
  • poderá ser acompanhada por um familiar ou representante da comunidade indígena, se desejar;
  • terá direito a receber orientação jurídica e psicológica.

Por parte de outras estruturas do Estado, a mulher indígena terá direito a acompanhamento e proteção por meio de serviços de assistência social e programas de apoio psicológico e social. Poderão ser adotadas ainda ações de proteção territorial em articulação com os órgãos responsáveis pela proteção das terras indígenas.

A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o Ministério Público Federal e a respectiva comunidade indígena serão intimados para se manifestar se têm interesse em intervir na causa. O objetivo dessa intervenção é fazer com que sejam considerados e respeitados: a identidade social e cultural do povo indígena, os seus costumes e tradições e as suas instituições.

Delegacias de polícia

Nas delegacias de polícia, o texto determina que os servidores sejam capacitados para atender a mulher indígena vítima de violência doméstica e familiar, além de garantir a presença, sempre que possível, de mais de um intérprete em casos de violência para evitar conflitos de interesse.

Terão ainda, se possível, que manter o texto de leis e normas traduzidos nas línguas indígenas da região ou acessíveis por outros meios. Entre esses textos incluem-se a lei derivada do projeto, a Lei Maria da Penha e demais normas sobre o tema.

Adicionalmente, as delegacias de polícia poderão requerer à Funai, como instrumento auxiliar ao inquérito, dados técnicos de notório saber referentes ao contexto sociocultural da vítima.

As ações de capacitação serão realizadas com a participação de lideranças das comunidades indígenas locais.

Contexto cultural

O inquérito e o processo judicial deverão levar em conta o contexto cultural da comunidade indígena, inclusive os modos tradicionais de resolução de conflitos.

Já os órgãos públicos responsáveis pela implementação das normas da futura lei deverão se articular entre si e com as comunidades indígenas para garantir a efetividade dos direitos das mulheres indígenas vítimas de violência doméstica e familiar.

Semana da Mulher Indígena

O texto aprovado prevê também que, na semana do dia 19 de abril, ocorrerá a Semana da Mulher Indígena, voltada à conscientização sobre os direitos e os instrumentos de proteção à mulher indígena.

Ao longo dessa semana, o poder público poderá promover ações como:

  • distribuição em comunidades indígenas de textos traduzidos das leis e normas sobre o tema de violência contra a mulher;
  • caravanas itinerantes, em suas comunidades, de serviços públicos relacionados à proteção das mulheres indígenas;
  • debates e seminários sobre a temática das violências contra a mulher indígena, envolvendo profissionais, agentes públicos, especialistas no tema e lideranças e demais mulheres de comunidades indígenas; e
  • criação e distribuição de cartilhas para a prevenção da violência contra as mulheres indígenas.

Proteção efetiva

A relatora, deputada Juliana Cardoso, defendeu algumas alterações feitas no texto, como a presença de intérprete para melhor acolhimento da mulher indígena vítima de violência doméstica e relatório antropológico vinculado ao inquérito. “É mister envolver os povos indígenas diretamente interessados nas ações de capacitação dos profissionais responsáveis pelo atendimento”, disse.

A deputada Silvia Waiãpi (PL-AP) afirmou que as mudanças no texto garantiram a completa proteção da mulher indígena. “Apesar de divergentes em posições políticas, chegamos ao melhoramento do projeto para que ele realmente garanta em todas as instâncias essa proteção à mulher indígena.”

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