Ingrid Farias

Diretora de Articulação e Parcerias do Instituto Update, pesquisadora sobre interseções de política de drogas, gênero, raça e participação política na América Latina

Opinião

Participação política e o caminho para justiça climática de gênero e raça

Não há volta: o caminho da justiça climática precisa da participação ativa e igualitária das mulheres nos processos políticos

Créditos: Marcello Casal Jr / Agência Brasil
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A reivindicação das mulheres, da população negra, dos povos indígenas e das comunidades tradicionais por justiça climática é parte da luta por uma nova democracia que seja completa e chegue à vida de todas e todos. Do mesmo modo que a precisamos reestruturar espaços de poder que se beneficiam com as desigualdades, a natureza nos alerta que é urgente a mudança do comportamento humano para dar continuidade a nossa jornada na terra.

É urgente reconhecer como as mudanças climáticas vem alterando a vida das pessoas e quais são as suas causas. Para dar respostas a esse contexto devemos reconhecer a luta dos povos e comunidades que, ao defenderem condições de justiça climática, estabelecem também modelos éticos solidários e sustentáveis para a nossa vida no planeta.

Justiça climática é a necessidade de abordar as desigualdades sociais e econômicas relacionadas às mudanças climáticas causadas pelo comportamento humano. Ela reconhece que as comunidades vulnerabilizadas são as mais impactadas pelos efeitos adversos das mudanças climáticas, embora tenham contribuído em menor escala para a crise climática global. Nesse grupo estão as mulheres negras, indígenas e pobres, que em sua maioria são impactadas pelo racismo ambiental.

Um estudo realizado pelo Instituto Polis aponta que a maior parte da população que vive em áreas com risco de inundações, deslizamentos e outros desastres é pobre e negra. São as mulheres as principais responsáveis pelas tarefas domésticas, pelo abastecimento de água e pela produção de alimentos. Portanto, quando os recursos naturais se tornam escassos devido às mudanças climáticas, essas tarefas se tornam mais difíceis e exaustivas, aumentando a carga de trabalho. São as mulheres quem também enfrentam maior vulnerabilidade em relação à violência de gênero em situações de desastre e deslocamento forçado. Nesse contexto, é essencial compreender e abordar as interseções entre gênero e raça para a justiça climática, pois esses aspectos sociais têm um papel significativo na determinação de quem é mais impactado e como e com quem as respostas devem ser desenvolvidas.

As desigualdades de gênero e raça estão intrinsecamente ligadas às estruturas de poder presentes em nossa sociedade e têm um impacto profundo na forma como as pessoas são afetadas pelas mudanças climáticas. Sem a construção e implementação de políticas públicas, a crise climática não se resolve: são necessários esforços coletivos entre governos e sociedade para transformações estruturais.

Em pesquisa realizada pelo British Medical Journal em 115 órgãos de tomada de decisão e de aconselhamento de 87 países, foi constatado que mais de 85% são compostos maioritariamente por homens e apenas 11% têm mulheres em maior número. Há paridade de gênero em apenas 3,5%. No Brasil, os espaços de tomada de decisão não refletem a presença daquelas pessoas que mais são atingidas por esses fenômenos climáticos: nosso país permanece sendo governado em sua maioria por homens, brancos e ricos, revelando as contradições que fragilizam as democracias.

O envolvimento e a participação política de mulheres, pessoas negras e indígenas e LGBTQI+ é fundamental no processo de formulação de políticas públicas e programas que efetivem soluções mais inclusivas, equitativas e eficientes para as adaptações climáticas. A igualdade de gênero e raça é uma condição indispensável para alcançar a justiça climática. Ao abordarmos as interseções entre esses aspectos sociais, podemos melhorar a resiliência das comunidades afetadas pelas mudanças climáticas, garantir a participação plena de todos os grupos sociais e construir um futuro sustentável e inclusivo para as gerações presentes e futuras.

Essas mulheres, justamente por serem as mais afetadas pelos impactos das mudanças climáticas, possuem conhecimentos e habilidades valiosas de mitigação e adaptação, e trazendo perspectivas únicas de um conhecimento profundo das necessidades de suas comunidades. Sua participação política é um componente crucial na formulação de políticas climáticas que abordam as desigualdades existentes. Além disso, a capacitação política das mulheres também desempenha um papel importante na conscientização e mobilização de outras pessoas para enfrentar a crise climática.

Não há volta: o caminho da justiça climática precisa da participação ativa e igualitária das mulheres nos processos políticos, desde a formulação de políticas até a implementação e monitoramento de soluções de adaptação climáticas. Isso envolve a criação de espaços inclusivos e o fortalecimento da liderança feminina, bem como a garantia do acesso igualitário a recursos, informações e oportunidades para que as mulheres possam contribuir plenamente e beneficiar-se das ações climáticas. Só assim poderemos alcançar resultados significativos e garantir um futuro sustentável, democrático e justo para todas e todos.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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