Política

Prefeito que se casou com adolescente enfrenta novas denúncias de nepotismo e fraude

Hissam Hussein Dehaini, prefeito da cidade de Araucária (PR), foi alvo de uma operação do Gaeco nesta quinta-feira

Créditos: Reprodução
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Hissam Hussein Dehaini, o prefeito do município paranaense de Araucária, na região metropolitana de Curitiba, volta aos holofotes nesta quinta-feira 1º com uma operação do Ministério Público do Paraná em parceria com o Gaeco que mira possíveis crimes contra a administração pública. Ele ganhou notoriedade ao casar com uma adolescente de 16 anos.

Os detalhes do procedimento, que fez busca e apreensão na sede da Prefeitura e da Câmara de Vereadores, estão sob sigilo. CartaCapital, porém, recebeu uma Notícia de Fato encaminhada pelos servidores municipais ao Ministério Público do estado poucos dias antes das buscas e apreensões realizadas nesta quinta.

As suspeitas descritas ao longo do documento estariam intimamente ligadas aos fatos que ensejaram a operação do MP. O órgão já confirmou em abril deste ano estar apurando possível prática de nepotismo na cidade. Na operação de hoje, a única informação divulgada diz que o grupo estaria apurando crimes contra a administração pública, prática descrita em detalhes ao longo das 32 páginas da denúncia.

O alerta elaborado pelo Sindicato dos Funcionários e Servidores Públicos do Município de Araucária ao MP  se divide em três grandes suspeitas:

1. nepotismo;

2. troca de favores usando cargos da prefeitura;

3. fraude em exonerações e nomeações para o recebimento ilícito dos valores de férias.

O sindicato identificou ao menos 12 casos de nepotismo na atual gestão. Entre os empregados estão suas filhas Yasmim Hissam Dehaini e Ryam Hissam Dehaini, que ocupam cargos de secretárias de Administração e Gestão de Pessoas, respectivamente. Há também ex-mulheres, ex-cunhados, ex-genros e nora que foram ou ainda são empregados de Hissam ao longo de suas duas gestões.

“Aproveitando-se da proximidade do fim de seu segundo mandato vem praticando nepotismo de forma desenfreada, descarada e mediante fraude aos princípios constitucionais e à probidade administrativa”, diz um trecho da denúncia ao MP.

O nepotismo, que veio à tona no auge da polêmica do casamento do prefeito com a adolescente, ganha contornos ainda maiores. Naquela ocasião, os casos revelados eram os da mãe e tia da atual esposa de Hissam. As duas foram exoneradas após a repercussão negativa do caso. Desde então a lista subiu para os atuais 12 parentes identificados, o que motivou o pedido de novas investigações protocolado pelo sindicato no dia 22 de maio.

Para além do nepotismo, pesa ainda contra Hissam o fato de que boa parte dos parentes nomeados não teriam formação ou experiência prévia para ocupar os cargos aos quais foram nomeados.

Aline Dehani, sua ex-mulher, por exemplo, é enfermeira, mas foi nomeada como Secretária de Comunicação Social da prefeitura durante cerca de cinco meses. “Ryam Hissam Dehaini […], igualmente não detém capacidade técnica para atuar na Gestão Pública, não detendo qualquer experiência prévia na área, não tendo jamais laborado na gestão pública. Assevere-se que a gestão de negócios não capacita para a administração pública”.

A nomeação de pessoas que não possuem parentesco direto com o prefeito, mas tem ligações com irmãos e outros parentes próximos a Hissam também evidência, segundo o sindicato, a troca de favores pessoais por cargos na Prefeitura praticada em grande volume pela atual gestão.

Hissam, inclusive, no seu segundo mandato, ampliou o número de cargos comissionados ou indicações políticas, bem como os vencimentos das ocupações. A prática contrasta com o aperto no plano de carreira, salário e aposentadoria ofertada aos servidores concursados da Prefeitura.

O impasse na negociação salarial e tentativa de reforma administrativa e da previdência na cidade culmina em um indicativo de greve adotada pelos funcionários. Com apoio de vereadores, Hissam quer passar um ‘pacotaço’ de 7 projetos que, segundo o sindicato, precarizam o vencimento e as carreiras na cidade.

Fraude em exonerações e nomeações

Um novo caso enviado ao MP também aponta para o cometimento de fraudes usando exonerações e nomeações na Prefeitura. Comandada pela filha de Hissam, a pasta de Gestão de Pessoas tem reiteradamente exonerado aliados com férias vencidas, que são recontratados dentro de poucos dias. A ação faz com que eles recebam ‘valores vultosos’ a títulos de férias vencidas e outras indenizações. A ‘venda’ de férias é vedada aos servidores. A ação promovida pela gestão, portanto, seria uma maneira encontrada para driblar a legislação e beneficiar os aliados.

As indicações contidas na Notícia Crime mostram que praticamente todos os secretários de Hissam foram beneficiados. A exceção são os poucos que têm menos tempo de nomeação e que ainda não tiveram direito a férias. A ilegalidade, portanto, beneficiou os membros da família do prefeito.

“A Secretária de Gestão de Pessoas e o Prefeito têm como prática fraudar a lei 1703/2006 para receber indevidamente valores vultosos a título de férias vencidas utilizando-se do cargo para se beneficiar indevidamente e causando dano patrimonial ao erário, em evidente enriquecimento ilícito”, resume a denúncia.

“Verifica-se portanto que trata-se de mecanismo em que Prefeito intencionalmente atua em prejuízo do patrimônio público, dispendendo de recursos públicos para pagar verbas rescisórias ilícitas, com o intuito em proporcionar enriquecimento ilícito a seus familiares nomeados em cargos públicos, no qual estes familiares auferem vantagem patrimonial indevida em razão do exercício do cargo ao qual foram nomeados, configurando improbidade administrativa nos termos da lei 8429/02”, diz também o texto.

O documento traz recibos de cerca de 160 mil reais pagos a Ryam Hissam (entre 2021 e 2023) e 119 mil reais pagos a Yasmim em ‘rescisões relâmpagos’. Na manobra, Ryam deixou o cargo por 7 dias em 2021 e 15 dias em 2023. Já Yasmin ficou fora da gestão por uma semana em 2021 e mais 7 dias no ano seguinte.

“Outros nomeados por nepotismo foram também favorecidas pelo prefeito com a mesma manobra ilegal, de exoneração, rescisão e nova nomeação para auferir recursos em prejuízo ao erário”, argumenta o sindicato em outro trecho da Notícia de Fato. “O mesmo ‘esquema’ pode ter sido utilizado pelo prefeito para favorecer vários outros servidores nomeados para cargos políticos ou em comissão pelo prefeito, gerando prejuízo ainda imensurável ao patrimônio público, requerendo portanto, apuração”, insiste ao MP.

Procurada por CartaCapital, a Prefeitura de Araucária não comentou as suspeitas contra Hissam e seus familiares membros da atual gestão.

O MP, por sua vez, informou apenas que a operação junto ao Gaeco desta quinta-feira correria em sigilo, mas que foi autorizada pelo Tribunal de Justiça do Estado em razão do foro por prerrogativa de função dos alvos. Foram 10 mandados de busca e apreensão em diferentes endereços da cidade – incluindo a Prefeitura e a Câmara de Vereadores.

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