Política

Ação de Bolsonaro na PF coincide com avanço de apurações sobre milícias digitais

Inquérito do Supremo a cargo de delegado chega perto de empresários bolsonaristas financiadores da rede de fake news

Jair Bolsonaro (Foto: Marcos Corrêa / PR)
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Jair Bolsonaro decidiu controlar ele próprio a Polícia Federal (PF), com a troca do chefe da corporação. Escolhido pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, o atual diretor-geral da PF, delegado Mauricio Valeixo, esteve na mira do presidente em agosto de 2019, mas escapou da degola. Por que o ex-capitão voltou a carga agora?

A ofensiva presidencial coincide com o avanço de um inquérito sobre milícias digitais bolsonaristas em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) e que é conduzido no dia a dia por um delegado da PF, Alberto Ferreira Neto, e por outro da Polícia Civil de São Paulo, Maurício Martins da Silva. A investigação ameaça não apenas a arma política e comunicacional do ex-capitão e seu clã, como também empresários bolsonaristas que financiam a rede de mentiras.

Uma das descobertas desse inquérito é a de que empresários gastam ao menos 5 milhões de reais por mês para bancar as milícias, conforme noticiado em março pelo Estadão. Foram identificados também crimes associados ao patrocínio, como lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e evasão de divisas. Na PF, o delegado Neto é da Delegacia Especializada em Repressão a Crimes Fazendários.

Com um homem de sua confiança no comando da PF, Bolsonaro talvez consiga sabotar o inquérito ou, no mínimo, obter informações antecipadas e privilegiadas, para se defender a alertar a outros.

O inquérito, sigiloso e de número 4781, foi criado pelo STF em março de 2019, para apurar ameaças e fake news contra a corte. O juiz do caso é Alexandre de Moraes, que espera concluí-lo até junho. Por ordem dele, um ano atrás a PF foi à casa de um general bolsonarista aposentado, Paulo Chagas. Recentemente, a polícia informou a Moraes que achou na deep web (internet subterrânea, à prova de Google) mensagens contra togados do tribunal e que eles deveriam se precaver.

Acaba de cair com Moraes uma nova apuração capaz de abastecer o inquérito 4781 (e vice-e-versa) e ajudar a desvendar as relações entre bolsonarismo, milícias digitais e mecenas empresariais. É uma averiguação pedida pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, sobre o ato bolsonarista de rua a favor de golpe militar e ditadura de que o presidente participou em Brasília em 19 de abril.

 

Aras enfrentou recentemente um levante de procuradores, por blindar Bolsonaro. Na Procuradoria, há quem diga que ele foi, digamos, aconselhado por juízes do Supremo a requerer o novo inquérito. “Saberemos quem convocou, quais foram as iniciativas, haverá quebra de sigilo”, disse, a propósito dessa apuração, o juiz do STF Gilmar Mendes. Quem financiou cai no capítulo “outras iniciativas”.

A CPI das Fake News é outra frente de apuração dos elos entre as milícias digitais bolsonaristas e seus patrocinadores. Não por acaso o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, acaba de entrar no Supremo com uma ação para tentar extinguir a comissão, renovada em 13 de abril por mais seis meses. Eduardo deu azar: sua ação caiu com Gilmar Mendes.

“A principal questão hoje do Brasil não está no ministério da Saúde e nem no ministério da Economia. Está no Congresso. É a CPI das Fake News. Se destamparem o bueiro, o Brasil avançará léguas na escala civilizatória”, tuitou o deputado Fabio Trad (PSD-MS), em 17 de abril.

A CPI nasceu por obra de Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara. Maia já falou abertamente sobre empresários bolsonaristas estarem financeiramente por trás das milícias digitais bolsonaristas. “Temos a convicção que um grupo de empresários no Brasil bancam isso”, disse em 5 de abril, no programa Canal Livre, da Band.

A julgar por Maia, são empresários do comércio e do setor de serviços, provavelmente integrantes do Instituto Brasil 200, entidade criada em 2018 para apoiar a campanha presidencial de Bolsonaro. Dessa entidade, fazem parte figuras como Luciano Hang (lojas Havan), Sebastião Bomfim (Centauro) e Carlos Apolinário (Polishop).

Maia já tinha aberto o jogo de suas suspeitas em fevereiro, na reabertura do Congresso depois de férias. A prioridade dele para o ano era uma reforma tributária que contraria o comércio e o setor de serviços. Empresários destes ramos realizaram em São Paulo um protesto público contra a reforma, enquanto o Brasil 200 levava adiante nas redes sociais uma campanha para sabotar a reforma.

“Não é justo que, em vez de a gente estar em uma grande mesa de debates da sociedade, inclusive com os empresários, parte dos empresários estar fazendo campanha contra. Não foi assim que eles trabalharam na Previdência. Mas, na Previdência, eles não pagam a conta”, declarou Maia em 17 de fevereiro. Segundo ele, os sabotadores usavam “agressão”, “chantagem”, “mentira” e fake news.

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