Justiça
A justificativa de Garnier para os blindados em Brasília no dia da análise do voto impresso na Câmara
Moraes, ao perguntar, lembrou de um provérbio chinês que diz que ‘coincidências não existem’


O ex-comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, justificou ao Supremo Tribunal Federal o que motivou sua decisão de promover um desfile de blindados em Brasília no dia 10 de agosto de 2021, data em que a Câmara votava um projeto para a implementação do voto impresso. O militar é um dos réus interrogados nesta terça-feira 10 na ação que apura a trama golpista.
Na ocasião, o desfile de tanques na capital federal foi promovido para que a tropa entregasse um convite ao então presidente Jair Bolsonaro (PL) para participar de um exercício militar em Formosa (GO). A leitura política, na época, porém, apontou que o comboio serviu para que o ex-capitão pudesse pressionar a Câmara para que aprovasse o projeto que era uma de suas obsessões.
O ministro Alexandre de Moraes, que conduz o interrogatório da trama golpista, ao perguntar sobre o episódio, citou um provérbio chinês que diz que “coincidências não existem”. Garnier, por sua vez, disse discordar. “Não existem até certo ponto”.
Segundo o ex-comandante, o desfile já estava programado antes da votação na Câmara, não sendo possível qualquer alteração no cronograma pela grande logística envolvida para transportar os veículos.
“Isso não foi programado para o dia da votação no Congresso. O que tenho na memória é que essa votação seria feita em comissão especial e, ao chegar na comissão, o presidente da Câmara decidiu levar ao Plenário. Eu não sei se era obrigatório ou uma escolha, mas ele marcou para a data que já estava marcada para esse desfile”, alegou.
O militar também apresentou ao STF uma explicação do que o motivou a promover o inédito desfile de blindados em Brasília. Segundo Garnier, a iniciativa serviria para “prestar contas à sociedade” dos recursos públicos usados pela Marinha.
“Uma das missões que eu me atribuí ao assumir o comando era dar a conhecer à sociedade as capacidades da Marinha. É comum, quando vemos fardados, camuflados ou um blindado, que as pessoas acham que é o Exército que está ali. Mas a Marinha tem essa capacidade”, disse.
“Os blindados vêm do Rio de Janeiro [para a operação em Formosa], inclusive os ‘esfumaçados’. Eles não ficam aqui [em Brasília]. Eles vem e fazem um exercício maravilhoso, mas o povo pagador de impostos, que deveria conhecer como o recurso é gasto, não vê essa situação. Então, ao assumir o comando em abril, falei: ‘vamos fazer uma visitação pública aos veículos no Planalto’. E teve muita gente lá, até mães que levaram crianças”, justificou.
Foto: Reprodução
Interrogatório
Garnier é o primeiro interrogado nesta terça-feira 10 na ação que apura a existência de uma trama golpista no entorno de Bolsonaro. O depoimento é o terceiro de uma lista de oito: na véspera, foram ouvidos Mauro Cid, delator no caso, e o deputado Alexandre Ramagem (PL), ex-chefe da Abin.
O militar é apontado como o único chefe das Forças Armadas a topar participar do plano de golpe. Ele teria, segundo as investigações, disponibilizado tropas para Bolsonaro dar curso ao golpe. No depoimento, porém, negou ter adotado a postura.
Depois de Garnier, o STF deve ouvir outros cinco réus no caso. São eles:
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
- Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
- Jair Bolsonaro, ex-presidente;
- Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-ministro da Defesa; e
- Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e ex-candidato a vice-presidente.
Os interrogatórios, pela programação da Corte, podem se alongar em mais três audiências, programadas para as manhãs de quarta-feira 11, quinta-feira 12 e sexta-feira 13.
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