Educação

Mais um ministro alucinado

O governo Bolsonaro parece procurar ministros nas listas dos inomináveis

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Apenas 97 dias depois de nomear Ricardo Vélez Rodríguez, sem dúvida o ministro da Educação mais incompetente da história do País, Bolsonaro anunciou Abraham Weintraub para seu lugar. Além de difícil pronúncia, o novo nome do MEC, que comandará o maior orçamento do governo federal, era praticamente desconhecido por quem discute há décadas a educação pública no País e impensável como ministro de uma área tão crucial para nosso desenvolvimento.

O que se descobriu até agora do novo ministro não é apenas desanimador: é o anúncio de mais uma tragédia. Agente do mercado financeiro por décadas, fã de carteirinha de Olavo de Carvalho e professor de carreira medíocre, Weintraub não passou sequer um dia na vida como gestor público na educação. Como notou Daniel Cara, da Campanha Nacional pela Educação: “é um MEC de iletrados em pedagogia”.

 

Em palestras recentes, Weintraub passou longe de temas como acesso à educação básica e superior, combate à evasão escolar e iniciativas para melhores indicadores de aprendizado. Preferiu exorcizar o “marxismo cultural” nas universidades e descrever uma realidade delirante onde drogas como o crack chegaram no Brasil de caso pensado pelo “Foro de São Paulo” e onde os “comunistas” ocupam o topo do poder nos bancos, grandes empresas e meios de comunicação do país. A conspiração bolchevique dos camaradas Trabuco, Lehman e João Roberto manda lembranças.

Em relação à pluralidade e ao pensamento crítico, o novo ministro também deixa claro a que veio. Na esteira das redes sociais e da caixa de comentários dos portais de notícias, quem pensa diferente é “comunista” e quando um desses “chegar com papo”, Weintraub é claro: “faz como o Olavo de Carvalho diz pra fazer: xinga!”.

 

Se em palestras o nível é esse, seus raros artigos acadêmicos não ficam pra trás. Mal escritos e desconexos, sua redação beira o incompreensível. E, pior, na temática da aposentadoria e Previdência, supostamente sua especialidade, as propostas são escandalosas. Em artigo publicado em uma revista chilena, Weintraub chega ao cúmulo de defender o BPC de 200 reais para idosos com 65 anos, 400 reais com 70 e 600 reais com 75 anos. O teto máximo seria 800 reais, mas só com 80 anos! Até ser nomeado ministro, o autor do texto trabalhava na Casa Civil especificamente na reforma da Previdência.

Nada disso se compara, no entanto, à declaração recente que deu em relação aos nordestinos. Como apontou Josias de Souza, o responsável por gerir a educação de mais de 53 milhões de pessoas que vivem na região literalmente disse: “Em vez de as universidades do Nordeste ficarem aí fazendo sociologia, fazendo filosofia no agreste, [devem] fazer agronomia, em parceria com Israel.” O ministro não só ofende milhões de pessoas e merece ser processado. Ele desconhece a história de seu país e não deve ter lido o paraibano nascido no sertão Celso Furtado, o baiano Milton Santos e a cearense Rachel de Queiroz.

O governo Bolsonaro parece procurar ministros nas listas dos inomináveis. Os currículos que incluem trajetória em gestão pública, experiências exitosas e traquejo político são rapidamente rasgados. A busca prefere incluir a lista de inscritos dos cursos à distância de Olavo de Carvalho e fundamentalistas em cruzada contra um “comunismo” e “a ditadura gay” imaginários.

Quem paga o preço é a população que depende de serviços públicos e tem certeza que o problema da educação no país não é doutrinação ou ideologia, mas falta de valorização dos professores e de investimento adequado para melhorar o ambiente e a qualidade do ensino. Mais cedo ou mais tarde, os ministros alucinados de Bolsonaro sairão de seus cargos. Mas as sequelas de seus atos podem causar danos ao país por muito tempo.

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