Justiça

STJ mantém Witzel afastado do governo do Rio

Em sessão nesta quarta-feira, maioria da Corte acompanhou o voto do relator do caso

Foto: Carlos Magno Foto: Carlos Magno
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A maioria da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, nesta quarta-feira 2, manter o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), afastado do cargo por 180 dias.

 

O ministro Benedito Gonçalves, relator do caso, votou pela manutenção do afastamento e foi acompanhado por outros 13 magistrados. Dos 15 votos possíveis na Corte, eram necessários dez para confirmar a decisão do relator.

Pelo Twitter, Witzel se manifestou e disse que jamais cometeu atos ilícitos.

Os votos dos ministros

Em seu voto, Gonçalves argumentou que a decisão de aplicar a Witzel medidas cautelares diversas da prisão é uma alternativa menos grave à decretação da prisão preventiva.

“Foi pedida a prisão preventiva. Optei por medida menos gravosa, que era o afastamento”, disse.

O ministro Francisco Falcão acompanhou o relator ao falar “da gravidade dos fatos”. “Os fatos são graves, merecem uma apuração e no momento em que vivemos, numa pandemia, onde já tivemos mais de 120 mil vítimas, é impossível que alguém que esteja sendo acusado e investigado possa continuar exercer o cargo tão importante de maior dirigente do Estado do Rio de Janeiro”, afirmou.

A ministra Nancy Andrighi disse que o afastamento se faz necessário já que “a participação do governador “assume maior relevo na prática de atos administrativos inerentes à função pública”.

Já a ministra Laurita Vaz argumentou que as medidas cautelares são necessárias para cessar as atividades criminosas, para impedir a reiteração.

“Há fortes evidências do cometimento de crimes gravíssimos, envolvendo em primeiro plano supostamente o governador do estado e a primeira-dama, que na condição de advogada teria recebido entre agosto de 2019 e maio de 2020 mais de 500 mil, em repasses considerados ilícitos de empresas ligadas à prestação de serviços hospitalares, algumas de fachada e operadas por laranjas”.

Logo depois, a ministra Maria Thereza Assis Moura defendeu que o afastamento do chefe do Poder Executivo estadual deve ser uma medida a ser sempre tomada de forma colegiada. Mas afirmou que não viu prejuízo porque a decisão judicial foi prontamente trazida à Corte Especial.

O ministro Napoleão Nunes Maia Filho votou contra o afastamento. Para ele, a medida não deveria ter sido adotada por uma decisão individual do relator e o STJ deveria ter ouvido a defesa antes de decidir sobre o tema.

“Uma decretação de medida como essa devia ser mais do que colegiada, devia ser prestigiada com a oitiva dos advogados para se prestigiar um mínimo de contraditório”, disse. “Será que podemos falar em ampla defesa num julgamento que não comporta a fala do advogado?”, questionou.

O ministro Og Fernandes foi outro que votou com o relator.

“Esse afastamento da função seria pelo prazo de 180 dias. Isso quer dizer que, apurados os fatos que são objeto de investigação, concluído esse prazo, o ministro Benedito e o tribunal como um todo verificará sobre a necessidade ou não do período do afastamento”, ressaltou.

Luís Felipe Salomão acompanhou o relator e afirmou que “há uma apuração em curso com valores totais ainda não levantados totalmente, ainda não dimensionados”.

O ministro Mauro Campbell observou que, apesar de considerar que a decisão do afastamento deveria ter sido colegiada, há fatos que justificam o afastamento.

“Não possui justificativa forte o bastante para ter sido deferida monocraticamente, mas tal raciocínio resta prejudicado pela atual sessão. Portanto, convalida-se aqui essa legitimidade. Essa decisão tem que ser sempre colegiada. Tais fatos justificam a decretação de uma medida cautelar tão imperativamente agressora da democracia? Creio que a resposta é positiva”, afirmou

Outro que votou pela manutenção do afastamento foi Raul Araújo. Para ele, o STJ “tem competência para impor a governador medidas cautelares penais, dentre outras prisão preventiva e afastamento do cargo, independentemente de autorização da Assembleia Legislativa”.

A ministra Isabel Gallotti, além de votar com o relator, disse que há fortes indícios de prejuízo ao erário ao longo de toda a gestão de Witzel.

O ministro Antonio Carlos Ferreira afirmou que a decisão é tomada “sem prejuízo de uma nova, uma futura análise, diante da natureza provisória que caracteriza as medidas cautelares”.

Marcos Buzzi também disse que há fortes indícios de materialidade e autoria para manter o afastamento. “Entendo no mesmo sentido apontado pelo relator que estão evidenciados os serviços que se negam ter sido prestados, as minutas com as empresas contratadas, as evidências das relações espúrias entre Estado e empresas e agentes, a ativação da banca da advocacia da primeira-dama. São dados objetivos que estão, sim, nesta altura e nesta fase demonstrados”, afirmou.

Por fim, Sergio Kukina  divergiu do relator para também decretar a prisão preventiva de Witzel. “Esse governador está rotulado, e há elementos, por ora, que sinalizam no sentido de ser ele o governador, o cabeça da organização criminosa. A meu sentir parece contraditório que todos os demais permanecessem presos e exatamente o cabeça estivesse em liberdade”.

Posição do STF

Mais cedo, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, negou o pedido da defesa de Witzel para adiar o julgamento.

“Anoto que a premissa invocada para suspender o julgamento colegiado do referendo da decisão de afastamento cautelar do requerente não é juridicamente válida para autorizar que esta Suprema Corte intervenha na organização jurídico-administrativa do Superior Tribunal de Justiça, soberano na condução das pautas de julgamento dos processos de sua competência”, afirmou o presidente do STF.

MPF defende afastamento

Em manifestação favorável ao afastamento do governador, a subprocuradora Lindôra Araújo – que chegou a ser citada por Witzel como alguém de relações conhecidas com a família Bolsonaro – reafirmou que as provas do esquema criminoso são robustas o suficiente para incriminá-lo.

Além de retomar pontos da denúncia, Lindôra afirma ser “nítido” que a alteração no regime de bens de casamento entre Helena Witzel e o governador, atualizada para “comunhão universal de bens” dias antes do recebimento das supostas propinas no escritório de Helena, assegura “a livre disponibilidade das vantagens ilícitas”.

A subprocuradora também argumentou que decisões monocráticas semelhantes ao caso atual já foram tomadas em outras circunstâncias. Como exemplo, citou a prisão do ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB), em novembro de 2018, após uma decisão do ministro Felix Fischer posteriormente submetida a uma Corte Especial.

Juristas questionam decisão

Na sexta-feira 28, o ministro Gonçalves ordenou  o afastamento de Witzel. Na visão de especialistas ouvidos por CartaCapitala decisão foi temerária.

“Governadores são afastados por

impeachment e não por cautelar substitutiva de prisão preventiva”, avaliou Lenio Streck, procurador aposentado e professor de Direito Constitucional.

Um dos mais atuantes defensores das garantias penais, o advogado Marco Aurélio de Carvalho avalia que a decisão da Corte sem receber a denúncia pode ser um precedente perigoso.

“Afastar um governador sem uma denúncia recebida é ignorar completamente o rito correto. Hoje, é com o Witzel. Amanhã, pode ser com qualquer governador ou prefeito. Não se pode ser garantista só para uns “, disse Carvalho, coordenador do grupo Prerrogativas.

“Embora previsto na lei, é um precedente muito negativo”, criticou Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay.

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