Justiça

Prefeitura de Maceió entra na mira do MP por compra de hospital inacabado com indenização da Braskem

O caso deve render novos capítulos à briga política que opõe o senador Renan Calheiros (MDB), aliado do governador Paulo Dantas, e o deputado federal Arthur Lira (PP), aliado do prefeito

Divulgação/HCor
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A aquisição de um conjunto hospitalar inacabado em Maceió ao custo de 266 milhões de reais entrou na mira de procuradores do Ministério Público de Alagoas por indícios de superfaturamento, em mais um foco de desgaste para o prefeito João Henrique Caldas (PL) às vésperas da disputa eleitoral.

O dinheiro utilizado na negociação é oriundo do acordo bilionário firmado pela prefeitura com a Braskem em julho passado, a título de indenização pelo afundamento de bairros na capital alagoana – o desastre deixou ao menos 50 mil desabrigados. A apuração é conduzida pela Promotoria de Fazenda Pública da capital.

Em outra ponta, o Tribunal de Contas do Estado realiza uma auditoria formal nos trâmites da aquisição. O procedimento foi autorizado por unanimidade durante sessão plenária em novembro passado. Após a auditoria, a Corte enviará os achados ao Ministério Público de Contas.

A compra do conjunto hospitalar foi anunciada com pompas pela gestão municipal, que prometeu inaugurar o empreendimento e oferecer ao menos 220 leitos para a população ainda no primeiro trimestre de 2024. O local, contudo, ainda está em obras, com alguns andares sem piso, revestimento ou equipamentos médicos.

O investimento envolve a desapropriação de dois prédios: o Hospital do Coração, que pertencia à empresa Cardiodinâmica, orçado em 180 milhões; o outro era de propriedade do Centro Médico HCor Empreendimentos Imobiliários e saiu ao custo de 86 milhões – os imóveis são conectados através de uma passarela.

Embora possuam CNPJs diferentes, as empresas têm uma médica como sócia e foram representadas pela mesma pessoa no termo de desapropriação. Todo o processo de compra foi concluído em tempo recorde: em 30 dias, a prefeitura avalizou o negócio e pagou, à vista, o valor integral da unidade.

Questionada por CartaCapital, a prefeitura de Maceió afirmou que a aquisição “seguiu todos os ritos formais com absoluta transparência”. Sustentou também que três auditorias independentes e credenciadas no Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia constataram a “viabilidade técnica e financeira” do negócio.

Com a unidade, acrescentou a prefeitura em nota, a cidade passará a contar com o “melhor e mais bem equipado hospital da região, que terá como especialidade os atendimentos de média e alta complexidade”.

Um dos laudos disponibilizados pela gestão municipal indica que os imóveis estavam concluídos à época da negociação, o que abriu caminho para a desapropriação.

Ocorre que, durante inspeção feita em outubro, os vereadores Joãozinho (PSD) e Zé Márcio Filho (MDB) puderam constatar que o prédio administrativo, de 10 andares, construído em frente à estrutura do hospital, não tem nada.

“As salas não têm nem piso”, disse Joãozinho à reportagem. A estrutura onde funciona o hospital, segundo o parlamentar, tem cinco andares, e três estavam prontos no dia da visita. Outros dois estão em obra.

Alguns andares do prédido estão sem piso, revestimento ou equipamentos médicos – Divulgação/vereador Joãozinho (PSD)

As reformas na unidade são conduzidas pela Cavalcante Peixoto Engenharia, que possui como sócio-administrador Anderson Cavalcante Peixoto, um dos empresários beneficiados com a venda do imóvel à gestão municipal. O serviço é amplamente divulgado pela construtora em seu site oficial.

O caso deve render novos capítulos à briga política que opõe o senador Renan Calheiros (MDB), aliado do governador Paulo Dantas, e o deputado federal Arthur Lira (PP), padrinho político de JHC, no estado.

A aquisição foi alvo de críticas do grupo liderado por Calheiros. O ministro dos Transportes, Renan Filho, chegou a afirmar que a compra “cheira a desvio de recursos da milionária indenização do caso Braskem”.

Seu pai também alfinetou o prefeito JHC. Nas redes sociais, o senador emedebista disse que uma pesquisa feita pelo partido apontou que 70% da população da capital alagoana se declarou insatisfeita porque a cidade não tinha hospital próprio.

“Duas semanas depois, o prefeito comprou um hospital por quase 300 milhões de reais. É assim, fazendo nossa parte, cumprindo nosso papel na oposição, que nós ajudamos a melhorar a vida das pessoas”, afirmou Calheiros, no X (ex-Twitter).

Em nota, a prefeitura de Maceió acrescentou que o grupo de trabalho de transição da unidade segue com suas atividades para a entrega o Hospital nos próximos meses.

“Importante destacar que o Hospital do Coração, unidade pública mais moderna do Nordeste, já iniciou o atendimento ao SUS, realizando até aqui 1650 exames de tomografia, ultrassom e ecocardiograma. Também conseguiu zerar a fila de espera para exames de ultrassonografia de próstata durante a campanha municipal do Novembro Azul”, completou.

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