Justiça
Mendonça abre divergência em julgamento sobre indenização para vítimas de balas perdidas em operações policiais
Ministro afirmou que acatar o modelo de indenização proposto pelo relator fomentaria “inércia da Polícia” para investigar os casos


O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal, abriu divergência no julgamento sobre o pagamento de indenização por morte, por parte do Estado, de vítimas de balas perdidas durante operações policiais, ainda que não seja possível identificar a origem do disparo.
No voto, Mendonça optou por condenar somente a União e não o estado do Rio de Janeiro, por considerar que, no episódio analisado – a morte de Vanderlei Conceição de Albuquerque, em 2016 – não houve participação da Polícia Militar.
O ministro chamou de “linha drástica da responsabilização automática” do estado por vítimas de disparos. Segundo o voto apresentado pelo magistrado no plenário virtual da Corte, “não há razão para que o Poder Judiciário fomente a inércia” das forças de segurança pública.
Mendonça justificou seu posicionamento como uma forma de “não desestimular a atuação pública” na busca do chamado “nexo de causalidade entre a morte por bala perdida” e a ação do Estado.
O ministro, que não foi totalmente contra a indenização, fez uma proposta que disse considera estar “em linha com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade”, permitindo a aplicação de critérios de responsabilização do Estado “de maneira facilitada, sem, contudo, tomar a linha drástica da responsabilização automática”.
Assim, Mendonça defende a “possibilidade de o Estado se eximir da responsabilização quando demonstrar que, no caso concreto, apesar de todos os esforços técnicos, e em tempo razoável que não inviabilize a colheita de provas ou informações, a perícia invariavelmente seria não conclusiva”.
O julgamento havia sido interrompido em outubro de 2023, por um pedido de vista de Mendonça.
O relator do caso, ministro Edson Fachin, votou no sentido de considerar o Estado responsável pela reparação de danos causados às vítimas e familiares.
Para o ministro, diante da falta de investigação sobre a morte, o Estado deve ser responsabilizado. O episódio discutido é de 2016. Segundo o processo, não há informações sobre a finalização do inquérito que apura a morte de Vanderlei Conceição de Albuquerque, no Rio de Janeiro.
O tema já foi analisado pela Corte em processo anterior semelhante. Na ocasião, os ministros votaram para responsabilizar o Poder Público pela morte das vítimas.
Em seu voto, o ministro sugeriu uma uniformização da jurisprudência, que deverá, se aceita pelos demais ministros, ser usada como repercussão geral em processos semelhantes em trâmite em todas as instâncias da Justiça.
“O Estado é responsável por morte de vítima de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, quando a perícia que determina a origem do disparo for inconclusiva, desde que se mostre plausível o alvejamento por agente de segurança pública; Poderá o Estado se eximir da responsabilização civil, caso demonstre a total impossibilidade da perícia, mediante o emprego tempestivo dos instrumentos técnicos disponíveis, para elucidação dos fatos”, cita a proposta de uniformização.
Antes do adiamento, a ministra Rosa Weber, agora aposentada, apresentou seu voto, acompanhando o entendimento proferido pelo relator. O prazo para votos se encerra na sexta-feira 8.
No entendimento que prevalece até aqui, os familiares de Vanderlei devem receber 300 mil reais de indenização, sendo 200 mil reais para os pais e 100 mil reais para o irmão, além de ressarcimento dos gastos com funeral e pensão vitalícia.
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