O governo do presidente Jair Bolsonaro, desde 2018, tenta interferir no conteúdo do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), apontam servidores do órgão que conversaram com o jornal O Estado de S. Paulo.
À publicação, funcionários do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) revelaram que a gestão federal busca estratégias para analisar previamente as perguntas do exame, comprometendo a inviolabilidade da prova e determinando a supressão de “questões sensíveis”.
Na semana passada, 37 servidores ligados à elaboração da prova pediram exoneração da autarquia responsável pela aplicação do Exame.
De acordo com eles, o diretor de Avaliação da Educação Básica do Inep, Andreson Oliveira, dirigente designado pelo presidente do Inep, Danilo Dupas, teria lido as questões que a equipe técnica havia montado e solicitou a exclusão de mais de 24 delas.
Em entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo, uma ex-funcionária afirmou que as questões excluídas tratam da história recente do País.
Em viagem diplomática, Bolsonaro afirmou que o Enem começa agora a “ter a cara” do governo e que “ninguém precisa estar preocupado com aquelas questões absurdas do passado”.
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, e o vice-presidente, Hamilton Mourão, negam que tenha havido interferência.
O Enem é elaborado a partir de um banco de dados de questões feitas por professores contratados. No entanto, segundo servidores, o atual presidente do órgão determinou que as perguntas escolhidas não poderiam ser consideradas inadequadas pelo governo.
Ex-funcionários denunciaram que havia uma pressão excessiva e assédio moral no departamento. Eles afirmaram ainda que o clima de pressão atual já levou a uma autocensura dos grupos que escolhem as questões.
Interferências anteriores
Em 2018, descontente com uma questão relacionada ao dialeto gay e travesti, o presidente Bolsonaro determinou a criação de uma comissão para avaliar a pertinência do Banco Nacional de Itens do Enem com a “realidade social” do Brasil.
O então ministro da Educação, Abraham Weintraub, afirmou que as questões não viriam carregadas “com tintas ideológicas”.
A comissão desaconselhou, no ano seguinte, 66 questões selecionadas por profissionais da educação por promover “polêmica desnecessária” e “leitura direcionada da história” ou ferir “sentimento religioso”.
Já neste ano, o Inep tentou criar um grupo permanente para analisar a prova e retirar “questões subjetivas”, que contivessem “itens com vieses político-partidários e ideológicos”.
No entanto, o Ministério Público Federal recomendou a dissolução da comissão.
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