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André Barcinski: ‘O Brasil não tem a dimensão da grandiosidade de Nelson Ned’

O jornalista, autor da biografia do cantor, estima que ele e Roberto Carlos tenham sido os brasileiros que mais venderam discos no exterior

O cantor Nelson Ned (Foto: Reprodução)
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No recém-lançado Tudo Passará – A Vida de Nelson Ned, o Pequeno Gigante da Canção, de André Barcinski (Companhia das Letras, 256 páginas) – já resenhado pela CartaCapital –, um ponto que chama bastante atenção é a abordagem do crítico de música sobre a carreira internacional do cantor e compositor.

Nelson Ned lançou seu primeiro LP em 1964, aos 17 anos. Era um disco de intérprete. Quando se mudou para São Paulo em 1966, começou a se apresentar nas boates da chamada Boca do Luxo.

“Ele percebeu que o repertório romântico de boleros agradava muito as pessoas e começou a tocar boleros clássicos”, conta Barcinski. Numa ida à Argentina, no final de 1967, Ned percebe um mercado latino inexplorado por cantores brasileiros.

“Nelson fez a opção desde o início da carreira por gravar em espanhol, o que é notável para alguém com 19, 20 anos, começando na profissão. Em 1970, quando foi pela primeira vez aos Estados Unidos para se apresentar em um festival, já gravava um compacto em espanhol. Aí, ele deslanchou.”

André Barcinski conta ainda que Nelson Ned fazia questão de gravar todos os seus discos em espanhol, chegando também a fazer registros em inglês, italiano, francês e até em japonês.

Nelson Ned teve uma carreira relativamente curta, de 20 a 25 anos, mas Barcinski aponta que ele é um dos dez maiores vendedores de discos da história da música brasileira – junto com Roberto Carlos, foi o maior cantor brasileiro em vendas de discos no exterior.

O jornalista relata ainda que de 1973 até os anos 1980, ele era um dos artistas brasileiros mais famosos no mundo. “Ele se apresentava na Colômbia para 80 mil pessoas, era recebido em Luanda (capital de Angola) por 3 mil pessoas no aeroporto. Fazia dois shows no mesmo dia no Carnegie Hall, lotava o Madison Square Garden (ambos em Nova York). Os próprios brasileiros não têm a dimensão exata da grandiosidade de Nelson Ned no exterior”, avalia.

“Muitas músicas que ele compôs falavam sobre sua condição de pessoa com nanismo”, afirma. “Quando você conhece a vida de Nelson e lê as letras que ele escreveu, percebe como elas são autobiográficas. Uma tristeza profunda sempre marcou sua vida pelo fato de se sentir rejeitado.”

Com problemas sérios de saúde por conta do nanismo, Nelson Ned achava que morreria cedo. “Ele dizia isso para várias pessoas, que tinha que aproveitar a vida porque não sabia quanto tempo viveria”, conta o biógrafo.

Com esse quadro, Nelson Ned levou uma “vida louca”, com drogas, bebidas e mulheres, além do vício em morfina para controlar as intensas dores nas costas que carregava desde a infância por conta do problema congênito.

A derrocada de Nelson Ned veio a partir dos anos 1980, com a queda no chamado mercado de música brega no Brasil e o foco da indústria no público jov em.

Nelson caiu no limbo como vários cantores identificados com canções de extremo apelo popular. “É preciso lembrar também que naquela época surgiu um movimento musical no Brasil que capturou o público romântico, que foi o sertanejo”, destaca Barcinski.

“Ele não conseguiu fazer a transição para um público mais moderno e os discos diminuíram de vendas, assim como os shows. Tanto que a decadência financeira dele começou aí.”

Com a saúde cada vez mais debilitada e menos shows (e, portanto, menos dinheiro em meio a uma vida perdulária), “Nelson Ned passou de um homem muito rico para um homem muito pobre” em pouquíssimo tempo.

André Barcinski chegou a entrevistá-lo em 2012, dois anos antes de sua morte. O livro sobre a vida de Nelson Ned é muito bem escrito e envolvente, sobre um personagem fascinante.

Assista à entrevista:

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