Midiático
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Adolescentes assistem mais ao BBB, mostram os números. O que fará a Globo?
A crescente participação de adolescentes na audiência e o sucesso comercial do BBB 24 impõem à Globo uma responsabilidade ampliada na curadoria dos conteúdos
No ar há dois meses, o Big Brother Brasil 24 celebra uma trajetória de êxitos comerciais como um fenômeno multiplataformas que já foi visto por mais de 100 milhões de telespectadores em todo o país, consolidando uma participação de mais de 40% no Painel Nacional de Televisão. De acordo com o Ibope, os índices ultrapassam a edição do ano anterior em aproximadamente 6%. Há também um crescimento expressivo de 34% das menções nas redes sociais em comparação ao mesmo período do ano passado, evidenciando a capacidade do programa de engajar o público em múltiplas plataformas.
No entanto, dentre os dados revelados recentemente pela Globo, destaca-se uma particularidade: o aumento de 7% na audiência entre adolescentes de 12 a 17 anos. Esta mudança na demografia do público sinaliza uma evolução para o mercado no apelo do programa, desafiando a noção pré-estabelecida de que a juventude, imersa no dinamismo das redes sociais, possa ter interesses distanciados da televisão tradicional. O fenômeno abre um leque de questões sobre os fatores que estão atraindo este segmento mais jovem, sugerindo uma interseção entre a cultura televisiva e as tendências digitais e refletindo uma mudança significativa nas preferências de entretenimento dos adolescentes.
Os números justificam a estratégia adotada pela emissora em renovar a dinâmica do programa, buscando sintonizar com os anseios de uma audiência diversificada, especialmente os mais jovens. A recente intervenção de Tadeu Schmidt, ao repreender Leidy e Davi por uma discussão que escalou até culminar em roupas jogadas na piscina e acaloradas trocas de acusações, demonstra a nova postura do programa. “Ninguém quer ver isso”, declarou ele. A regra anterior era “fogo no parquinho”. A mudança de direcionamento ficou ainda mais evidente com a substituição do tradicional e polêmico “Jogo da Discórdia” pelo “Sincerão”. Antes marcado por confrontos diretos, onde os participantes eram incentivados a usar termos agressivos e até mesmo a simbolizar agressões físicas contra adversários, o programa optou por uma dinâmica mais amena. Em uma das edições do “Sincerão”, os brothers foram convidados a construir contos de fadas, identificando entre si quem seriam as princesas e os lobos maus da narrativa. A abordagem alivia a tensão do jogo, que tenta apostar no lado divertido das desavenças.
A crescente atração dos adolescentes pelo BBB 24 pode ser fortemente atribuída à sua eficaz integração com as redes sociais e ao engajamento em tempo real que o programa oferece. Vivendo na era digital, onde as redes sociais formam o epicentro de suas interações diárias, os jovens encontram no BBB uma extensão desse universo virtual, onde momentos marcantes e debates acalorados transcendem a tela da TV e ganham vida em plataformas como o Instagram, TikTok e o X. Essa transposição do conteúdo televisivo para o digital permite que os adolescentes não apenas assistam, mas também participem ativamente das narrativas, compartilhando opiniões, criando memes e engajando-se em discussões com uma comunidade ampla e diversificada.
Além disso, a natureza ao vivo do programa, que possibilita a participação em votações e outras formas de interação em tempo real, confere aos jovens um sentimento palpável de influência sobre os acontecimentos do show, alimentando a sensação de que sua voz e escolhas têm peso no desenrolar da competição. Essa dinâmica cria um vínculo entre o programa e seu público adolescente, tornando-os participantes ativos e não meros espectadores, o que amplifica significativamente seu interesse e engajamento com o BBB.
Outro fenômeno a ser levando em consideração é o FOMO, sigla em inglês para “Fear of Missing Out”, ou o “medo de estar por fora”. Esse desejo de estar constantemente conectado e participar das tendências atuais fortalece ainda mais a presença do programa na vida diária dos adolescentes.Muitos jovens se veem compelidos a acompanhar o BBB para não se sentirem excluídos das conversas que dominam seus círculos sociais. A sensação psicológica, intensificada pelo constante burburinho nas redes sociais sobre os acontecimentos mais recentes do programa, gera uma necessidade quase irresistível de estar a par de cada desenvolvimento, cada meme e cada reviravolta.
A crescente participação de adolescentes na audiência e o sucesso comercial do BBB 24 impõem à Globo uma responsabilidade ampliada na curadoria de seu conteúdo, especialmente à luz do compromisso com grandes marcas que associam suas imagens ao programa. Essa dinâmica de parceria se destaca quando contrastada com os desafios enfrentados pela Record, particularmente no reality show A Fazenda. A emissora da Igreja Universal trabalha anualmente para angariar patrocinadores devido às preocupações destes com o conteúdo frequentemente polêmico do programa, que inclina-se mais para a baixaria do que para o jogo estratégico. A Fazenda é notória por suas cenas de confrontos intensos entre os participantes em episódios antológicos que, embora capazes de gerar burburinho, afastam marcas preocupadas com a associação a conteúdos negativos. A Globo se esforça para distanciar o BBB desse tipo de imagem, buscando equilibrar entretenimento, engajamento e um ambiente onde os patrocinadores se sintam confortáveis em vincular suas marcas.
Por um lado, o engajamento intensificado desses jovens espectadores reflete um cenário midiático em evolução, onde a intersecção entre entretenimento televisivo e dinâmicas sociais digitais pode fomentar importantes debates. No entanto, não se pode ignorar os riscos associados a um consumo acrítico e intensivo de reality shows que frequentemente flertam com a banalização de comportamentos e a glorificação de conflitos interpessoais. A linha é tênue entre entretenimento e influência comportamental e exige uma reflexão aprofundada sobre o papel dos meios de comunicação na modelagem das percepções e valores juvenis. É sempre importante questionar e redefinir os contornos dessa interação midiática, assegurando que enquanto os jovens consomem programas como o BBB, permaneçam equipados para discernir, questionar e extrair o melhor do entretenimento que lhes é tão avidamente servido.
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