Diálogos da Fé

Blog dedicado à discussão de assuntos do momento sob a ótica de diferentes crenças e religiões

Diálogos da Fé

Como lidar com os religiosos que apoiaram um golpe militar no Brasil?

Muitos líderes religiosos optaram por se manter ao lado de Bolsonaro, perpetuando um movimento político que só pode ser classificado como golpista, antidemocrático e intolerante

Silas Malafaia e Jair Bolsonaro. Foto: Isac Nóbrega/PR
Apoie Siga-nos no

É compreensível que aqueles envolvidos no dia a dia da política ou dos movimentos sociais façam uso de rótulos, categorias e conceitos com certa liberdade – mesmo que esses possam ser inoportunos, equivocados ou contraproducentes –, pois o seu objetivo é construir palavras de ordem, “narrativas” e outros elementos mobilizadores. Isso se aplica a termos como “fascista”, “golpista”, entre muitas outras categorias que se popularizaram nos últimos anos. Quem assume o papel de analista, por outro lado, seja no meio acadêmico ou fora dele, deve proceder com mais cautela.

Rotular Jair Bolsonaro e seu círculo político próximo de golpistas, contudo, transcende o simples exagero retórico. Bolsonaro planejou e efetivamente buscou apoio para realizar um golpe militar no Brasil. De fato, estivemos muito próximos de presenciar um golpe militar.

Caso tivesse logrado sucesso, ao menos um ministro do STF se tornaria preso político, um governo eleito seria impedido de tomar posse, e as instituições republicanas seriam coagidas a funcionar sob a ameaça de uso ilegítimo da força. Isso apenas em um primeiro momento, de acordo com o que estava planejado, documentado e acordado entre os golpistas. Em um segundo momento, não saberíamos mais onde o arbítrio poderia chegar, já que o andar de golpes de Estado são sempre imprevisíveis. Na última vez, em 1964, o golpe instalou um regime que privou os brasileiros de direitos por mais de 20 anos, além de ter torturado, assassinado e exilado um número significativo de adversários políticos.

A Justiça brasileira assumirá a responsabilidade de julgar e punir o grupo associado a tentativas golpistas ligadas a Bolsonaro no futuro próximo, garantindo que enfrentem as consequências de suas ações, mais cedo ou mais tarde. Isso evidenciará que nossas instituições, apesar de suas falhas e lentidão, se fortaleceram nas últimas décadas. Entretanto, persiste um desafio político significativo: como confrontar as forças e grupos sociais que expressaram (e muitos continuam expressando) apoio a uma ruptura democrática? Desde cidadãos comuns até políticos eleitos e líderes de instituições religiosas, existe um número considerável de pessoas que continuam alinhadas a Bolsonaro.

No contexto religioso brasileiro, foco desta discussão e deste espaço, numerosos líderes de instituições religiosas apoiaram a reeleição de Bolsonaro e continuam a apoiá-lo até agora, indicando, assim, sua disposição em respaldar um golpe militar no país. Guilherme de Carvalho, intelectual conservador cristão e pastor, que serviu no governo Bolsonaro por meses, declarou, após os eventos de 8 de Janeiro, que subestimou a ameaça que o bolsonarismo representava à democracia. Ele argumentou que os cristãos não deveriam ter apoiado, nem deveriam continuar apoiando, o bolsonarismo. Carvalho manteve suas convicções conservadoras e seguiu criticando a esquerda brasileira de forma legítima e relevante, mas estabeleceu um limite intransponível: a defesa da democracia.

Muitos líderes religiosos poderiam adotar uma postura semelhante, mas optaram e continuam optando por não fazê-lo, mantendo-se ao lado de Bolsonaro e perpetuando um movimento político que só pode ser classificado como golpista, antidemocrático e intolerante. Se apresentam, dessa forma, não como meros atores políticos ou representantes legítimos de um campo político, mas sim como verdadeiros problemas democráticos.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo