Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

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Ivan Lins lança álbum e critica baixa monetização na internet: ‘Acabou com direito autoral’

Cantor e compositor apresenta, por gravadora americana, um novo disco com sofisticação musical e três canções inéditas

Foto: Rodrigo Simas/Divulgação
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Além de inúmeros sucessos no Brasil, Ivan Lins é um músico com sólida carreira internacional. Não à toa, foi convidado por George Klabin, fã de seu trabalho, para lançar um disco pelo selo Resonance Records, uma gravadora independente de jazz dos Estados Unidos.

O projeto foi prontamente aceito e dias atrás foi lançado, com o nome de My Heart Speaks.

“Hoje em dia, para você gravar um disco, você paga de seu próprio bolso. Uma música de MPB um pouco mais sofisticada não tem ajuda nenhuma de gravadora”, afirma Ivan Lins em entrevista a CartaCapital. “Quando aparece um cara que vai pagar um disco todo e tendo uma orquestra sinfônica no meio, você não pode dizer ‘não’. Eu aceitei dentro das condições que ele colocou e ficou bonito.”

My Heart Speaks foi gravado com a Orquestra Sinfônica de Tbilisi, capital da Geórgia (ex-república soviética), e apresenta músicas instrumentais e também com letras, com interpretações do próprio Ivan Lins, das cantoras americanas Dianne Reeves e Jane Monheit e da jovem mexicana Tawanda, que vive nos Estados Unidos. Elas cantam versões em inglês de músicas do artista brasileiro.

O disco tem ainda a participação do trompetista Randy Brecker. Os arranjos, de grande sofisticação musical, são do alemão Kuno Schmid, por quem Ivan tem admiração.

Faz pouco mais de 50 anos que a música de Ivan Lins conquistou os americanos pela primeira vez. Ela chegou ao país pela voz de Ella Fitzgerald, que ouviu a composição Madalena em 1971, quando esteve no Brasil e a gravou. A canção de Ivan Lins e Ronaldo Monteiro havia, à época, estourado nas rádios brasileiras, com interpretações de Elis Regina e do próprio autor.

“Apesar de ter se tornado muito popular, ela é uma música harmonicamente sofisticada. E os americanos têm isso: quando ouvem uma música com uma harmonia sofisticada, já ficam logo excitados. E foi o que aconteceu com Ella”, lembra.

Depois disso, a música ganhou outras versões internacionais, mas foi anos depois, quando conheceu Quincy Jones, uma espécie de Midas da música nos Estados Unidos, que Ivan Lins conquistou de vez o mercado do exterior.

“Fizemos um contrato de coedição e ele começou a colocar minha música para outros intérpretes americanos. Daí minha música começou a ir para o resto do mundo.”

No disco My Heart Speaks, de 11 faixas, as três inéditas são The Heart Speaks (versão em inglês de Antes e Depois, poema de Ana Terra musicado por Ivan), com interpretação de Dianne Reeves, e as instrumentais Congada Blues e Missing Miles (esta com participação de Randy Brecker), ambas homenagens do brasileiro ao trompetista americano Miles Davis.

Completam o álbum as canções Renata Maria (Ivan e Chico Buarque), Não Há Por Que (Ivan e Ronaldo Monteiro), I’m Not Alone (versão em inglês de Anjo de Mim, de Ivan e Vitor Martins), E Isso Acontece, Easy Going (ambas só de Ivan), Corpos, Rio (versão de Rio de Maio, de Ivan e Celso Viáfora), com Jane Monheit, e Nada Sem Você (Ivan, Ivano Fossati e Celso Viáfora).

Sobre a faixa a abrir o disco, trata-se de uma das duas composições que Ivan Lins fez com Chico Buarque. Ele conta que a cantora Leila Pinheiro, após ouvir a melodia da canção, foi quem a encaminhou para Chico inserir a letra. No entanto, uma história curiosa marca a composição de Renata Maria.

“Estava para ser avô. Minha filha Carla estava grávida de gêmeos. E ele (Chico) soube que eu seria avô pela primeira vez. Ele já era avô. Ele ligou para mim e disse: ‘Ivan, estou com a letra quase pronta, mas só vou te entregar quando você entrar na confraria dos avôs’. Aí ele esperou. Meus netos nasceram em 27 de dezembro, e no dia seguinte ele me mandou a letra”, relata, aos risos.

Conhecido no passado por ser um compositor compulsivo, Ivan Lins tem criado muito menos nos dias atuais. “Tenho uma caixa aqui com 200 fitas cassete e dentro delas têm coisas incríveis, novas, inéditas”, revela. Mas o músico procura ânimo para apresentá-las.

Essa monetização da internet acabou praticamente com o nosso direito autoral. A gente hoje recebe de direito autoral talvez 1/100 do que a gente recebia. A gente sobrevivia do direito autoral. E também da venda de CDs, o suporte físico. Então, você perde um pouco a motivação”, diz. “Por que vou colocar uma música nova se não vai acontecer nada com ela? O que me sustenta hoje é show. Não posso parar de cantar, nem pedindo a Deus.”

Ivan Lins conhece bem os meandros do mercado fonográfico. O artista comandou por muitos anos a gravadora Velas, com seu parceiro Vitor Martins. Também participa do Grupo de Ação Parlamentar PróMúsica, formado para defender interesses de artistas.

Ele diz que no passado a luta pelos direitos autorais no País teve mais resultados. Segundo Ivan, as regras atuais são outras e a classe de compositores deve ser mais unida para exercer pressão.

“Na verdade, do bruto que dá a internet, nós ficamos só com 10%; 90% morre nas mãos de outras pessoas… 50% para as gravadoras, 30% para as plataformas e nós fomos para o final da fila. Nós produzimos para eles ganharem dinheiro. Quando deveria ser no mínimo 50% para quem produz a matéria-prima.”

Assista na íntegra à entrevista de Ivan Lins a CartaCapital:

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