Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

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Em disco harmonioso, Paula Santoro grava ‘E Daí?’, canção que lembra tempos sombrios

Cantora e compositora apresenta seu sétimo álbum, com participação de João Donato, João Bosco e Arthur Verocai

Foto: Marcia Charnizon
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E Daí é uma composição de Milton Nascimento e Ruy Guerra lançada no filme A Queda (1976) e depois inserida no clássico álbum Clube da Esquina 2 (1978). Os desconcertantes versos em primeira pessoa são de um cidadão excluído e desassistido.

A cantora Paula Santoro gravou a composição em seu último disco, em voz e piano, executado por Rafael Vernet, que divide com ela a direção musical, fazendo uma lembrança de recentes tempos sombrios.

“Toda vez que ouvia essa música eu chorava. Esse tipo de coisa, quando acontece, eu tenho que gravar, preciso falar de meu jeito”, diz Paula. Ela relaciona o aspecto político da canção ao tempo da primeira gravação, sob a ditadura, e a dias recentes.

Paula afirma ter se incomodado com a resposta do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao ser questionado sobre as mortes na pandemia. Na ocasião, ele disse: “E daí. Lamento, quer que eu faça o quê?”

“Ganhou sentido, para mim, de revolta. Cantei pensando em todas as pessoas que perderam entes queridos. Ela vem imbuída de uma força, tristeza e revolta”, afirma a artista.

E Daí tem um belo e emocionante registro de Paula Santoro em seu sétimo álbum, de nome Sumaúma, em que comemora mais de 35 anos de carreira.

“É um disco que fala do feminino. É como se fosse eu a árvore Sumaúma, considerada a mãe da floresta”, explica a cantora e compositora.

O trabalho de 10 faixas tem diversas participações especiais, incluindo as de Arthur Verocai, João Bosco e João Donato, além de Toninho Horta (guitarra) e Ivan Conti “Mamão” (bateria).

“O João Donato sempre foi uma referência para mim. O João era muito divertido”, diz ela ao exaltar o cantor, compositor e pianista falecido ano passado.

Segundo ela, Donato, ao chegar ao estúdio, se enganou sobre a canção que seria gravada. Teve, então, de executar na hora aquela que de fato entraria no disco: Ê Lala Lay Ê, de Donato com o irmão Lysias Ênio. Paula classifica de “um presente de Deus” a gravação com o inesquecível músico.

Além de E Daí, ela gravou do Clube da Esquina a canção Caso Você Queira Saber (Beto Guedes e Márcio Borges).

Clube na Esquina foi a música que mais ouvi na vida. Essa referência está no meu sangue”, destaca a mineira, nascida em Belo Horizonte e radicada no Rio de Janeiro. “Não posso fazer um disco sem colocar pelo menos uma música do Clube da Esquina ou alguém do Clube.”

A faixa título, Sumaúma, é de uma dupla de jovens mineiros: Alexandre Andrés e Bernardo Maranhão.  “Gosto disso também, de sempre mostrar algo da nova geração. Até esse disco, fiz pouco, porque queria mostrar uma sonoridade dos anos 1970 e trazer meus ídolos que estavam em evidência nessa época, como João Bosco, Donato e Verocai.”

O harmonioso e delicado álbum tem duas composições inéditas de Paula, uma delas em parceria com Arthur Verocai. As restantes são canções que a artista apresenta em nova versão.

O disco tem acento afro nas gravações, duas das quais de referência direta: Yê Melê, do Chico Feitosa e Luis Carlos Vinhas, e Afrikanino.

“Amo a música africana. Amo a nossa origem negra. Trouxe o nosso swing, a cor para a música”, resume. “A música, para mim, sempre foi uma forma de exorcizar coisas. Tem um sentido de salvação. Ele tem um sentido muito profundo, mais que tocar afinado, fazer sucesso.”

Assista à entrevista de Paula Santoro a CartaCapital:

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