Justiça
Novas decisões de Toffoli atingem o espólio da Lava Jato à véspera do recesso
Ao longo de 2023, o ministro do STF acumulou sentenças que alteraram os rumos do que sobrou da operação


Às vésperas do recesso do Poder Judiciário, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, assinou uma série de decisões que impactam direta ou indiretamente processos decorrentes da Lava Jato. A ordem mais relevante é a que suspende uma multa de 10,3 bilhões de reais prevista no acordo de leniência da J&F, dona da JBS, e autoriza o grupo a acessar a íntegra das mensagens da Operação Spoofing, com diálogos entre procuradores e juízes.
Há outros despachos assinados por ele nos últimos dias, porém, de uma importância simbólica e que podem abrir precedentes críticos à operação. Um deles, expedido na terça-feira 19, derruba uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Essa decisão do tribunal havia suspendido uma ordem dada pelo juiz Eduardo Appio, à época era o titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, no Paraná.
Em março, Appio suspendera o bloqueio de bens e valores do empresário Márcio Pinto de Magalhães, ex-representante da empresa Trafigura no Brasil. Na decisão, o magistrado acolheu o argumento da defesa, que alegava que a juíza Gabriela Hardt, então substituta da 13ª Vara, demonstrara “animosidade” contra os acusados e “associação” com a força-tarefa da Lava Jato.
A decisão de Appio foi anulada pelo TRF-4 e a defesa de Magalhães acionou o STF. Os advogados sustentavam, entre outros argumentos, que o tribunal não ofereceu “qualquer oportunidade de defesa” no âmbito de um procedimento correcional.
Na prática, o TRF-4 decidiu em setembro anular todos os atos de Appio à frente da 13ª Vara, sob a alegação de que ele seria “suspeito” em casos ligados à Lava Jato. Hoje, o magistrado está na 18ª Vara de Curitiba, voltada a processos previdenciários.
Outra decisão de Toffoli assinada na terça beneficia Aluísio Teles Ferreira Filho, ex-gerente da área Internacional da Petrobras, que buscava o reconhecimento da 13ª Vara em seus processos. No início de 2019, Hardt o condenou por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Toffoli afirmou haver “flagrante ilegalidade dos atos praticados em desfavor do requerente, consistente na incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR”. Ele enviou o caso à Justiça Eleitoral e reforçou a imprestabilidade de provas oriundas dos sistemas da antiga Odebrecht (atual Novonor).
O ministro do Supremo também decidiu anular na terça-feira 19 todos os atos praticados na Lava Jato contra o deputado federal Beto Richa (PSDB-PR), ex-governador do Paraná.
A anulação ainda atinge decisões em operações decorrentes da Lava Jato, além de atos dos integrantes da força-tarefa de Curitiba e do então juiz Sergio Moro, “determinando, em consequência, o trancamento das persecuções penais instauradas em desfavor do requerente”.
A petição da defesa de Richa menciona os diálogos de Telegram entre procuradores, liderados por Deltan Dallagnol, e juízes, como Moro. O material, que deu origem à série de reportagens Vaza Jato, é parte do acervo da Operação Spoofing.
“Tenho, pois, diante do quanto narrado pelo requerente e de precedentes deste Supremo Tribunal em casos semelhantes, que se revela incontestável o quadro de conluio processual entre acusação e defesa em detrimento de direitos fundamentais do requerente”, escreveu Toffoli.
Ao longo de 2023, Toffoli acumula decisões de impacto contra a Lava Jato. Uma das mais emblemáticas, assinada em setembro, invalidou todos os elementos de prova obtidos no acordo de leniência da Odebrecht.
Naquele despacho, o ministro afirmou que a prisão do presidente Lula (PT) na operação foi “um dos maiores erros judiciários da história do País”.
Na avaliação de Toffoli, prender o petista foi uma “armação fruto de um projeto de poder de determinados agentes públicos em seu objetivo de conquista do Estado”.
Toffoli também considerou que o episódio foi o “verdadeiro ovo da serpente dos ataques à democracia e às instituições que já se prenunciavam em ações e vozes desses agentes contra as instituições e ao próprio STF”.
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