Frente Ampla
Por que defendo a reedição imediata da CPI da Pandemia
É inegável que algumas coisas ainda precisam ser investigadas, especialmente as investidas contra a vacinação, cujo mais novo capítulo envolve jovens e crianças


A CPI da Pandemia entregou uma série de resultados práticos que contribuíram para minimizar os impactos decorrentes da crise sanitária iniciada com a chegada do novo Coronavírus ao País. Um dos exemplos mais patentes foi o avanço da vacinação, mesmo com todo o esforço empreendido por Jair Bolsonaro para atrapalhar a imunização da população contra a Covid-19. Na esfera institucional alguns passos também foram dados, a exemplo das 12 apurações do Ministério Público em andamento a partir do relatório produzido pela comissão.
O trabalho do Ministério Público Federal é direcionado àqueles sem foro privilegiado e dividido em uma dúzia de frentes, englobando diferentes momentos, personagens e instituições investigadas pela CPI da Pandemia, sem prejuízo das demais ações porventura abertas relacionadas ao trabalho da comissão – por exemplo, as conduzidas pela PGR e MP-SP.
As apurações estão concentradas nas ações e omissões do Ministério da Saúde no enfrentamento à pandemia, cujo desdobramento alcança os casos Prevent Senior, Covaxin-Precisa, VTCLog e Davati. Ainda são apuradas usurpação de função pública, fake news e incitação ao crime, responsabilização civil por dano moral coletivo, o impacto da pandemia sobre as populações quilombolas, indígenas, mulheres e população negra, bem como a atuação da Conitec (órgão de assessoramento do Ministério da Saúde) e dos planos e operadores privados de serviços de saúde. Múltiplas linhas de apuração apoiadas nas conclusões da CPI.
Outro resultado prático dos trabalhos da comissão pode ser visto no relatório publicado pela Transparência Internacional sobre o Índice de Percepção da Corrupção. O Brasil agora ocupa o 96º lugar, perdendo duas posições. Entre os critérios utilizados para a elaboração do ranking estão as investigações e denúncias feitas pela CPI da Pandemia.
Ainda no plano internacional, existe a articulação para que o relatório produzido pela comissão seja usado como base para uma comunicação ao Tribunal Penal Internacional com o objetivo de investigar o crime de genocídio no Brasil, cometido com o auxílio da pandemia e as ações deliberadas de fomento à contaminação e profilaxia ineficaz contra o novo Coronavírus patrocinados pelo presidente da República.
Internamente, a CPI cumpriu um papel fundamental ao reforçar a centralidade da ciência e a importância em seguir as suas recomendações. A disseminação do uso de máscaras e maior entendimento do isolamento social foram insistentemente estimuladas durante depoimentos de cientistas ouvidos pela comissão. A desmistificação do curandeirismo apoiado em remédios sabidamente ineficazes contra a Covid-19 foi outro avanço verificado, ainda que o fanatismo ideológico de alguns insista no contrário.
Mesmo que possamos enumerar os múltiplos resultados positivos da CPI da Pandemia, é inegável que algumas coisas ainda precisam ser investigadas, especialmente as investidas contra a vacinação, cujo mais novo capítulo envolve a imunização de jovens e crianças. Diante da insistência do governo federal em se comportar como um aliado do novo Coronavírus, decidimos protocolar um novo pedido para instalação de outra Comissão Parlamentar de Inquérito.
O GOVERNO SEGUE A IGNORAR AS BOAS PRÁTICAS SANITÁRIAS DE ENFRENTAMENTO À COVID-19
Desta vez, o foco será investigar, além das dificuldades interpostas para a vacinação de crianças e adolescentes, a insuficiência de doses de reforço para uso em 2022, o apagão de dados ocorrido no Ministério da Saúde em dezembro do ano passado e início deste ano, justamente no momento em que a variante Ômicron se espalhava sem controle pelo Brasil, a insuficiência na política de testagem e os ataques do presidente da República aos técnicos da Anvisa.
O governo federal segue a ignorar as boas práticas sanitárias de enfrentamento à pandemia. Insiste em tratamentos ineficazes e espalha desinformação sobre os benefícios da vacinação em massa da população. Exemplo mais recente é a nota técnica publicada pelo Ministério da Saúde reforçando o uso da hidroxicloroquina contra a Covid-19 e colocando em dúvida a eficácia das vacinas utilizadas no Plano Nacional de Imunização.
O mais assustador é ver a publicação dessa diretriz em um momento de explosão de contaminações, devido ao avanço da variante Ômicron, novamente colocando pressão nos sistemas de saúde e causando esgotamento nos profissionais dedicados ao tratamento dos doentes. A curva dos óbitos decorrentes da Covid-19 só não acompanha o gráfico de novos casos devido ao fato de um grande número de contaminados estar vacinado contra o Coronavírus, afirmam cientistas e pesquisadores, diminuindo os registros de casos graves da doença.
Entretanto, boa parte daqueles que necessitam de internação nesta nova onda de contaminações é justamente a dos não imunizados ou com o ciclo de imunização incompleto. Dentre eles, uma boa parte é formada por crianças e jovens. Mais uma vez ficam evidentes os benefícios da imunização e o papel que cumprem ao salvar vidas.
Precisamos seguir com as investigações porque estamos diante de práticas continuadas de estímulo à pandemia empreendidas diuturnamente pelo governo federal, seja na aplicação de políticas públicas, a exemplo da recente nota técnica publicada pelo Ministério da Saúde, seja pelas reiteradas declarações de Bolsonaro e integrantes de seu governo que fomentam o espalhamento do novo Coronavírus pelo Brasil e a contaminação da população.
As investigações da CPI da Pandemia mostraram que infectados pela Covid-19 foram usados como cobaias humanas em experimentos sem lastro científico, que o governo brasileiro condicionou a aquisição de imunizantes à distribuição de propinas e que um grupo de fanáticos ideológicos tinha mais autoridade do que cientistas e pesquisadores dedicados ao estudo de crises sanitárias e microbiologia.
O retorno da CPI da Pandemia tem objetivos muito cristalinos: salvar vidas, garantir vacina para toda a população brasileira e frear as atrocidades deste governo corrupto, obscurantista e genocida. Esperamos para breve a sua instalação. •
*Senador pela Rede/AP, foi vice-presidente da CPI da Pandemia.
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1193 DE CARTACAPITAL, EM 2 DE FEVEREIRO DE 2022.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Nova CPI já”
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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