Política

Roubos e furtos triplicam na região da Cracolândia em dois anos

Enquanto a polícia brinca de gato e rato com os usuários de drogas, as gangues fazem a festa no perímetro do 3º DP, de Campos Elíseos

Ao menos mil dependentes químicos persistem na cena de uso. Nas últimas semanas, eles passaram a retaliar as ações de dispersão da polícia com saques e depredações – Imagem: Nelson Almeida/AFP e Amauri Nehn/Brazil Photo Press/AFP
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Na noite da quarta-feira 19, as forças de segurança voltaram a entrar em conflito com os frequentadores da Cracolândia. Após a prisão de um suspeito por tráfico de drogas, houve um tumulto e a Polícia Militar precisou intervir, informou o governo paulista. Segundo ativistas da Craco Resiste, que desenvolve atividades redução de danos na região, os policiais lançaram bombas de gás lacrimogênio contra usuários de drogas encurralados em ruas do Centro. Revoltados, os dependentes químicos depois atearam fogo em materiais recicláveis para montar barricadas na Rua dos Gusmões e nas Avenidas Rio Branco e Duque de Caxias.

Enquanto a polícia brinca de gato e rato com os dependentes químicos, os crimes aumentaram de forma assustadora nos dois distritos policiais que cobrem a região. Desde a deflagração da Operação Caronte, em junho de 2021, os roubos triplicaram e os furtos cresceram 244% no perímetro sob responsabilidade do 3º DP, de Campos Elísios. Na área aos cuidados do 77º DP, de Santa Cecília, os roubos aumentaram 89% e os furtos, 41,5%, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do estado, que divulga as ocorrências mensais registradas em cada delegacia.

Fonte: Dados Estatísticos do Estado de São Paulo, Secretaria de Segurança Pública. As ocorrências mensais por Distrito Policial podem ser consultadas no link: https://www.ssp.sp.gov.br/Estatistica/Pesquisa.aspx.

Quem acompanha o problema de perto garante: a onda de assaltos não é obra dos frequentadores da Cracolândia, mas de quadrilhas especializadas em tomar celulares e raspar as contas bancárias das vítimas pelos aplicativos do aparelho. Há tempos os moradores se queixam da atuação da temida gangue da bicicleta. Da mesma forma, é de conhecimento público que a máfia nigeriana atua na recepção final dos smartphones. A polícia paulista parece, porém, ocupada demais com a urgente tarefa de conduzir a procissão de dependentes envoltos em cobertores de uma rua para outra. Não bastasse, milicianos passaram a assediar comerciantes da região com a cobrança de uma “taxa de proteção”, como mostra a reportagem de capa de CartaCapital desta semana.

Márcia Aparecida mora e trabalha na região há oito anos. Sentia-se segura até a Prefeitura e o governo do estado, sócios na cruzada repressiva, reeditarem a fracassada política de dispersão dos frequentadores da Cracolândia, iniciada por Gilberto Kassab em 2012 e replicada por sucessivas gestões. Antes concentrados na Praça Princesa Isabel, os usuários de drogas foram desalojados de lá e, desde então, um expressivo grupo se aglomera na porta da garçonete. “Essa operação foi uma negação. Atrapalhou todo mundo. Os usuários ficam nervosos, porque são perseguidos. Os moradores não aguentam mais. Nem dá mais para receber visita, porque as pessoas têm medo de vir na casa da gente”, lamenta.

Além do temor provocado pelos contantes confrontos, ela também está preocupada com a escalada de assaltos. “Tem a gangue da bicicleta, que já existia, e também uns infiltrados no fluxo. Mesmo que a gente conheça alguns usuários, por ser morador, ninguém mais se sente seguro”.

Quem circula pela região espanta-se com a quantidade de comércios fechados. Até mesmo as lojas da Rua Santa Ifigênia, tradicional ponto de comércio de eletrônicos, estão sucumbindo. “Quando os usuários estavam concentrados, todo mundo sabia onde eles estavam, eventualmente surgia algum problema, mas nada comparado com o que vivemos hoje. Essa horda de gente sendo levada para lá e para cá assusta as pessoas”, desabafa José Roberto Cheda, dono de lojas de equipamentos de som desde 1975. Segundo ele, o policiamento aumentou, mas não chega a intimidar os bandidos. “Fui o primeiro lojista a contratar segurança particular, há mais de 30 anos”, diz o empresário. “Agora, é indispensável ter essa proteção”.

Aproveitando-se do clima de insegurança, milicianos passaram a competir com os serviços privados de segurança. Após uma denúncia da Controladoria-Geral do Município, o Ministério Público paulista abriu uma investigação para apurar a conduta do guarda civil metropolitano Elisson Assis, apontado como chefe de uma milícia que vendia proteção a comerciantes e moradores. Outros seis agentes da corporação foram afastados de suas funções por suspeita de envolvimento no esquema. Seguranças que atuam na região confirmam a atuação dos concorrentes fardados. Para saber mais detalhes dessa história, leia a reportagem de capa de CartaCapital desta semana, disponível para a assinantes neste link.

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