Saúde

Ômicron: Fiocruz classifica a fase atual da pandemia como ‘janela de oportunidade’

Alto número de casos associado a uma elevada cobertura vacinal poderia bloquear circulação de vírus no país; pesquisadores fazem balanço de dois anos da crise sanitária

Foto: CDC
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A atual fase da pandemia de Covid-19 no Brasil, provocada pela Ômicron, pode ser encarada como “uma janela de oportunidades”. É o que dizem pesquisadores do Observatório Covid-19 Fiocruz no novo boletim divulgado na manhã desta quarta-feira.

Apesar das “controvérsias e incertezas ainda existentes”, os cientistas consideram que “a explosão de casos cria temporariamente uma legião de pessoas com resposta imune ao vírus” e que, mesmo a proteção sendo de curta duração, “isso significa que, por algum tempo, haverá centenas de milhares de pessoas ao mesmo tempo imunes a uma nova infecção”.

Eles sugerem que uma alta cobertura vacinal associada a este cenário de número elevado de infecções — e consequentemente de resposta imune — poderia reduzir o número de casos, internações e óbitos pelo doença, e até mesmo bloquear a circulação do vírus no país, já que o número de pessoas suscetíveis à infecção seria menor, mesmo que temporariamente.

Os cientistas dizem que esse momento da pandemia pode “representar uma oportunidade de readequação do sistema de saúde para o atendimento de casos mais graves e o acompanhamento de pessoas infectadas com sintomas mais leves”. E para que isso ocorra, afirmam que “é necessária a implementação de práticas de telessaúde, testagem estratégica de casos suspeitos e seus contatos, bem como o reforço de estruturas hospitalares e ambulatoriais”.

“Caso o país, neste momento, intensifique a oferta de vacinas, conseguiremos, em tese, impedir a transmissibilidade do vírus de forma comunitária por algum tempo”, dizem os especialistas. Para que isto ocorra, eles listam quatro estratégias de saúde:

Os pesquisadores relatam no documento que a vacinação contra a Covid-19 não avançou de forma homogênea em todo o país. O alto percentual de vacinados nas regiões Sul e Sudeste com a segunda dose não é observado em algumas áreas das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, que ainda apresentam “bolsões com baixa imunização”.

Estas áreas com menor cobertura vacinal, segundo os cientistas, são caracterizadas por um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) menor, populações mais jovens, menos escolarizadas, com baixa renda e residentes em cidades de pequeno porte. “Nestes locais, o fim da pandemia parece mais distante que em grandes centros como Rio de Janeiro e São Paulo, que já apresentam elevada cobertura vacinal com duas doses”, ponderam os especialistas.

Em relação à terceira dose, necessária para reforçar a proteção, a cobertura vacinal ainda é baixa no país como geral, com o percentual ainda menor nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Nesse sentido, os pesquisadores acreditam que Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer.

Os pesquisadores apontam algumas causas para o avanço desigual da vacinal no Brasil, dentre elas, destacam os “déficits estruturais e de financiamento” do SUS e a descontinuidade de programas essenciais, “sobretudo, em locais mais carentes”. Além disso, jogam luz sobre problemas de organização, comunicação e falta de estratégias compartilhadas entre esferas governamentais afirmando que estes fatores “prejudicaram o processo de vacinação e todo o planejamento desenvolvido pelo PNI”.

Mesmo diante de todos estes desafios — como o discurso negacionista a respeito da vacinação —, os cientistas ponderam que ainda assim o Brasil conseguiu um lugar de destaque na fase atual do combate à pandemia com uma cobertura vacinal superior a de países como Estados Unidos e Alemanha.

“O Sistema Único de Saúde no Brasil volta a conquistar credibilidade entre a população. O controle da pandemia, ao final, será um legado, uma oportunidade de fortalecer ainda mais o SUS, ampliando seu financiamento, a Atenção Primária em Saúde (APS) e equipes na atenção básica, bem como uma distribuição mais equitativa dos recursos de maior complexidade, como hospitais e leitos UTI. O Estado deve cumprir seus princípios de saúde gratuita, universal e equitativa (como deve ser qualquer política pública). E mais do que nunca, cabe à ciência cumprir seu papel de comunicar, de tornar a verdade clara, para que a população, em sua forma mais plena, possa exercer o controle social, reivindicando por seus direitos fundamentais”, finalizam os pesquisadores.

No novo boletim do Observatório Covid-19, os pesquisadores fizeram um balanço de dois anos da pandemia de Covid-19. A análise apresenta uma perspectiva da evolução da crise sanitária, dividida em fases, desde a descoberta do vírus até os dias atuais, com base nos estudos realizados pelos pesquisadores da Fiocruz. O trabalho sintetiza a dimensão das perdas, totalizando 388 milhões de casos no mundo e 26 milhões no Brasil (6,7% do total), com 5,71 milhões de óbitos no mundo e mais de 630 mil no Brasil (11% do total).

Para os pesquisadores do Observatório Covid-19 Fiocruz, a cada fase da pandemia se apresentam novos desafios. “Se o diagnóstico e tratamento correto, adequação dos hospitais e estabelecimentos de saúde foram cruciais para a redução do impacto da doença inicialmente, a vacinação hoje é considerada prioridade para o controle da pandemia”, avaliam. No entanto, eles ressaltam que as medidas não-farmacológicas para combater o coronavírus ainda têm importância, uma vez que o distanciamento físico e uso de máscaras são os principais meios de redução da exposição e infecção pelo vírus.

O estudo aponta para uma rápida transmissão da variante Ômicron e especulação sobre o fim da pandemia. O monitoramento da nova variante, associado ao estudo genético de suas mutações, sugere rápido crescimento de casos, por conta da sua capacidade de propagação, 70 vezes maior que a Delta. Apesar de não haver consenso sobre o assunto, alguns pesquisadores defendem que a Ômicron se trata de uma variante menos agressiva, por conta do menor número de hospitalizações e óbitos em comparação com o expressivo aumento de casos.

Alguns países e agências de saúde já discutem ou vêm adotando a transição de pandemia para endemia. Para os pesquisadores, a mudança não representa a eliminação do vírus e da doença, nem mesmo a desobrigação de medidas de proteção individuais e coletivas. “A classificação da doença como endêmica representaria a incorporação de práticas sociais e assistenciais na rotina do cidadão e dos serviços de saúde e só poderia ser pensada após drástica redução da transmissão pelas novas variantes e por meio de campanha mundial de vacinação”, aponta o documento.

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