Saúde

“Materiais descartáveis estão sendo usados mais de uma vez”, denuncia médica

Profissionais relatam falta de equipamentos de proteção individuais e condutas questionáveis em estabelecimentos de saúde durante pandemia

Créditos: EBC
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“O diretor da unidade de saúde está coagindo a equipe para não usar o material [EPI] comprado por conta própria”, relata um médico da cidade de Cruzeiro, em São Paulo. “Não há material suficiente para toda a equipe. O secretário de Saúde mandou reutilizar avental descartável por três dias!”, denuncia um profissional de Tijucas, Santa Catarina. “Negam EPI aos médicos, residentes e aos internos que entram em contato direto com paciente. Um absurdo”, acrescenta um médico residente em Uberlândia, Minas Gerais.

Mais de 2500 profissionais da saúde denunciam a falta de equipamentos de proteção individuais (EPIs) em estabelecimentos de saúde do País. Os relatos foram encaminhados a uma pesquisa feita pela Associação Médica Brasileira (AMB), entidade que busca a valorização profissional da categoria, e que colheu denúncias até o dia 23 de março. As reclamações envolvem 520 municípios brasileiros e 1200 estabelecimentos de saúde.

Grande parte das denúncias (90%) aponta a falta de máscaras para uso nos atendimentos médicos. Em segundo lugar (72%) aparecem os óculos e/ou face shield (protetores faciais), seguidos de capote impermeável (65%), gorro (46%), álcool em gel (35%) e luvas (27%).

Ainda de acordo com a pesquisa, em mais de 75% dos estabelecimentos denunciados há relato da falta de pelo menos três dos EPIS. Em mais de 30% dos casos, todos os equipamentos estão em falta.

“Além da segurança para médicos, enfermeiros e técnicos, os equipamentos garantem a segurança dos pacientes, evitando a disseminação do vírus — uma vez que os profissionais de saúde atendem dezenas de pessoas por dia e podem carregar a doença de forma assintomática”, alerta o vice-presidente da AMB, Diogo Sampaio. “Não podemos pedir empenho, desprendimento e dedicação aos médicos na luta contra esse inimigo invisível se não dermos as condições de proteção e segurança de que necessitam”, acrescenta.

A maior parte das denúncias, 855 delas, referem-se ao Estado de São Paulo e 109 de seus municípios. A capital paulista é a cidade cujos estabelecimentos foram mais denunciados, com quase 25% (250) das denúncias do estado, seguida por Caçapava (59) e Santos (31). O estado de São Paulo tinha 219 mortes por Covid-19 e 4048 casos confirmados na sexta-feira 3.

Procurada pela reportagem para comentar as denúncias, a Secretaria de Saúde de São Paulo afirmou, em nota, que os serviços estaduais estão abastecidos com EPIs e materiais hospitalares. A pasta afirma já ter adquirido 42,2 milhões de itens. Ainda confirmou realizar planejamento estratégico de compras com base no consumo e mais uma margem de segurança para garantir abastecimento, e compras diárias para que não haja falta de produtos. “Os hospitais estaduais seguem todos os protocolos de segurança para profissionais de saúde e pacientes”, afirma o texto.

As outras oito cidades com mais queixas são Rio de Janeiro (148), Porto Alegre (128), Brasília (73), Belém (63), Belo Horizonte (48), Recife (36), Teresina (31) e Campo Grande (31).

O estado do Rio de Janeiro concentra 273 queixas, com a capital fluminense no topo, com 150 denúncias, junto com Duque de Caxias (12) e Nova Iguaçu (9). Segundo boletim da sexta-feira 3, o estado tem 47 mortes e 1074 casos confirmados de coronavírus. Minas Gerais e Rio Grande do Sul aparecem na sequência como os estados com mais denúncias, com 262 e 218, respectivamente. Na região Norte, Belém, no Pará, é o município com mais relatos, 64 ao todo. O estado tem 47 mortes e 1074 casos confirmados de coronavírus, também segundo boletim da sexta-feira 3.

Uma denunciante afirma que, em um hospital de Bangu, bairro da zona Oeste do Rio, “muitos materiais descartáveis estão sendo usados mais de uma vez”. Em outra unidade do Rio de Janeiro, uma médica diz ter perdido o emprego porque passou a comprar seus próprios EPIs, já que o hospital não os fornecia.

A AMB afirma que, a partir dos relatos anônimos recebidos, notifica os estabelecimentos denunciados, e também o Ministério da Saúde, os Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), além das Secretarias de Saúde (municipais e estaduais), assim como Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Ministério Público do Trabalho, para garantir que ações emergenciais para fiscalização e solução dos problemas sejam tomadas.

As denúncias relativas à falta de equipamentos podem ser feitas no site da AMB. Também é possível acompanhar os EPIs que estão em falta por estabelecimento de saúde, município e estado.

O Ministério da Saúde confirmou ter zerado o estoque de equipamentos de proteção individual, esta semana. A pasta reconheceu, em nota, que “há uma demanda mundial por conta da pandemia, o que tem trazido escassez e dificuldades na produção e entrega desses insumos no cenário internacional, mesmo após a celebração de contratos”.

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