Justiça

Tribunal internacional de opinião condena Bolsonaro por crimes contra a humanidade

Junta de juristas internacionais analisou as condutas do presidente durante a pandemia de Covid-19, principalmente com relação aos povos indígenas, quilombolas e profissionais de saúde

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A 50ª edição do Tribunal Permanente dos Povos (TPP) condenou as políticas adotadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a condução da pandemia. 

Conforme análise conjunta de juristas brasileiros e internacionais, o ex-capitão intencionalmente adotou políticas de saúde que resultaram em uma pluralidade de resultados nocivos, configurando crimes contra a humanidade e violação dos direitos humanos dos brasileiros durante o período de emergência sanitária. 

As audiências de instrução aconteceram nos dias 25 e 26 de maio. A leitura da sentença foi realizada nesta quinta-feira 1, simultaneamente, no Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e em Roma, na Itália, sede do tribunal internacional.

Apesar de o TPP não possuir competência para aplicar penas às nações, organizações ou indivíduos condenados, a sentença serve como um alerta para a comunidade internacional, podendo, inclusive, auxiliar no julgamento de causas que tramitem nas cortes internacionais. 

A denúncia foi feita em conjunto pela Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a Coalizão Negra por Direitos e a Internacional de Serviços Públicos (PSI). 

Segundo os advogados de acusação, Jair Bolsonaro teria recorrido à máquina pública para propagar intencionalmente a pandemia de Covid-19 no País, gerando morte e o adoecimento de milhares de pessoas, além de promover genocídio dos povos indígenas pela ausência de políticas públicas para a proteção dos indivíduos e seus territórios.

A sentença expedida pelo órgão determinou que Bolsonaro contribuiu de forma intencional e direta para a morte das 680 mil vítimas da covid no País. 

“Não há dúvida que milhares de vidas foram extintas por efeitos das decisões do governo presidido por Jair Bolsonaro. Não se pode considerar que esse dolo foi eventual, uma vez que houve o resultado das mortes em massa com a intenção de privilegiar a economia em detrimento da vida humana”, cita trecho da decisão lida pelo jurista argentino Eugénio Raúl Zaffaroni. 

Para a junta de juristas, a decisão política de descartar as medidas de isolamento, proteção e vacinação frente à pandemia de Covid-19 configuraram crime contra a humanidade, sendo uma lesão passiva do direito à vida. 

“Esta lesão do direito à vida de várias dezenas de milhares de pessoas não pode ser considerada como o resultado normal de decisões políticas do governo que não poderiam ser contestadas judicialmente.” diz trecho. “É verdade que as políticas são decididas pelos governos e que, invariavelmente, qualquer opção política pode beneficiar uns e prejudicar outros, mas isto é admissível desde que as alternativas em jogo sejam razoavelmente discutíveis, o que na presente causa não ocorre, dado que a opinião científica mundial deslegitimou claramente a opção do governo brasileiro.”

A política adotada pelo presidente, que privilegiava a economia à proteção da vida, foi apontada como uma violação dos direitos humanos. 

Para os juristas, para resguardar a economia, aceitou-se e produziu-se o resultado em detrimento da vida humana. 

“Na realidade, a escolha baseou-se na ponderação de dois valores em jogo: a vida de dezenas de milhares de pessoas ou a desaceleração da economia, como o próprio Sr. Jair Bolsonaro declarou, confessando publicamente que tinha optado pela economia”, declaram os juízes.

Para a equipe julgadora, Bolsonaro agiu com vontade de alcançar o resultado chamado de “imunidade de rebanho”, promovendo o contágio, o que implicou na produção de morte em massa. 

“Esta vontade é suficientemente provada e mesmo confessada pública e expressamente por Jair Bolsonaro, de modo a configurar perfeitamente a subjetividade necessária para afirmar a existência do crime contra a humanidade”,  afirmam. 

Ao final, a sentença recomendou que o caso analisado seja encaminhado ao Tribunal Penal Internacional de Haia para que o presidente brasileiro seja investigado por “constante crime de genocídio contra povos nativos do Brasil”.

Ao final da leitura, o juiz italiano Luigi Ferrajoli observou que pela primeira vez o TPP julga um indivíduo, e não uma nação ou uma organização. 

Para ele, Bolsonaro adotou uma política consciente, de forma ostensiva, voltada a negar e minimizar a pandemia, comparada a uma gripe normal, isso provocou a morte de dezenas de milhares de pessoas. 

“Essa conduta é uma política que responde perfeitamente à figura do crime contra a humanidade descrita no art. 7, parágrafo I, do Estatuto de Roma, que prevê especificamente esse tipo de comportamento voltado a provocar um grande dano à identidade ou à saúde das pessoas. Nesse caso de dezenas de milhares de pessoas, a quantia não é irrelevante”, disse ele. 

Ferrajoli afirmou ainda que a sentença é uma resposta não só contra Bolsonaro, mas contra todos os governantes que adotaram a mesma inércia. 

“Que nossa sentença possa servir para causar a reflexão de todos esses criminosos, induzindo a políticas mais responsáveis. Não só políticas de saúde que permitiram o contágio em massa, mas em geral para todas as condutas massivas que são lesivas aos direitos humanos”, concluiu. 

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