Justiça

Relator no TSE vota para tornar Bolsonaro inelegível por 8 anos

Discurso do então presidente a embaixadores foi marcado por ‘conspiracionismo, vitimização e pensamentos intrusivos’, segundo Benedito Gonçalves

O ministro Benedito Gonçalves, do TSE. Foto: Evaristo Sá/AFP
Apoie Siga-nos no

O corregedor-geral da Justiça Eleitoral, Benedito Gonçalves, votou nesta terça-feira 27 pela condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro à inelegibilidade por oito anos na ação que apura a reunião promovida com embaixadores em julho de 2022. Na agenda, transmitida pela TV Brasil, o então presidente repetiu mentiras sobre o sistema eleitoral e atacou instituições.

O relator do processo decidiu condenar Bolsonaro por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Ele, porém, votou pela absolvição do ex-candidato a vice-presidente Walter Braga Netto.

Gonçalves foi o primeiro ministro do Tribunal Superior Eleitoral a proferir um voto. Logo na sequência, a sessão foi encerrada e o julgamento será retomado na quinta-feira 29, às 9h. Restam, ainda, as manifestações dos seguintes magistrados:

  • Raul Araújo
  • Floriano de Azevedo Marques
  • André Ramos Tavare
  • Cármen Lúcia
  • Kassio Nunes Marques
  • Alexandre de Moraes

“Em razão da relevância, não é possível fechar os olhos para os efeitos antidemocráticos de discursos violentos e de mentiras contra a Justiça Eleitoral”, afirmou Benedito Gonçalves em seu voto.

Segundo ele, Bolsonaro utilizou prerrogativas do cargo para “degradar o ambiente eleitoral”.

“A particularidade do abuso de poder político está na utilização do cargo de presidente da República para a consecução das finalidades eleitorais ilícitas no evento de 18/07/2022″, sustentou. “O que mais sobressaiu na ocasião é o que de fato torna o evento no Palácio da Alvorada um episódio aberrante: foi o uso das prerrogativas de chefe, o poder simbólico de presidente da República e da posição de chefe de Estado para degradar o ambiente eleitoral.”

Já a prática de uso indevido dos meios de comunicação consistiu em recorrer à TV Brasil para difundir informações falsas sobre o sistema eleitoral.

“Conspiracionismo, vitimização e pensamentos intrusivos foram fortemente explorados no discurso de 18/07/2022, para incutir a ideia de que as eleições de 2022 corriam grande risco de serem fraudadas e que o então presidente da República, em simbiose com as Forças Armadas, estaria levando adiante uma cruzada em nome da transparência e da democracia”, considerou o relator.

Em seu voto, ele defendeu manter nos autos da ação penal a minuta golpista encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres.

A inclusão da documento na ação é uma decisão criticada pela defesa de Bolsonaro, por considerar que o ato desrespeitaria uma jurisprudência criada pelo TSE em 2014 e em 2017 a obrigar a recusa da anexação de fatos posteriores ao início do processo.

De acordo com Gonçalves, os fatos posteriores naqueles processos não haviam sido apresentados como desdobramentos dos primeiros, tampouco serviam para “adensar ou corroborar” a tese inicial. Naquelas situações, estava-se diante do tratamento de “ilícitos autônomos”.

“A admissibilidade da minuta de decreto do estado de defesa não confronta, não revoga e não contraria a nossa jurisprudência”, declarou o ministro.

Gonçalves também rechaçou o argumento da defesa de que o ex-presidente do TSE Edson Fachin teria participado de uma reunião semelhante ao encontro de Bolsonaro com embaixadores. A agenda do Tribunal, explicou o relator, já era prevista a fim de transmitir transparência para as missões estrangeiras.

Ele anotou, ainda que “as informações falsas sobre fraude foram exploradas estrategicamente ao longo do mandato do investigado e da campanha eleitoral, para a formação de bolhas”.

No início do julgamento, na semana passada, o Ministério Público Eleitoral pediu a condenação de Bolsonaro. Segundo o vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, o ex-capitão recorreu a um aproveitamento “arbitrário da situação propiciada pelo desempenho de função pública” devido à “desnaturação de ato oficial em acontecimento fundamentalmente eleitoreiro”.

“O discurso ganhou difusão nacional por meio de sistema de televisionamento público federal e reprodução nas redes sociais do investigado. O discurso também se dirigiu ao conjunto dos eleitores brasileiros”, afirmou o representante do MPE.

Gonet citou desrespeito aos conceitos de impessoalidade e de moralidade. “A reunião comporta análise de déficit de legitimidade por desvio de finalidade”, anotou. “O evento, não obstante sua primeira aparência, foi deformado em instrumento de manobra eleitoreira, traduzindo o desvio de finalidade.”

Nos últimos dias, Bolsonaro negou ter cometido qualquer crime, mas não demonstrou confiança em uma absolvição.

“A tendência, o que todo o mundo diz, é que eu vou me tornar inelegível”, declarou em uma entrevista publicada nesta terça pelo jornal Folha de S. Paulo. “Não vou me desesperar. Vou continuar fazendo a minha parte.”

A defesa antecipou que, em caso de condenação, ecorrerá ao Supremo Tribunal Federal.

Assista à sessão:

ENTENDA MAIS SOBRE: , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo