Política

Pandemia leva propostas para saúde ao centro do debate eleitoral; saiba o que os pré-candidatos propõem

Ponto crítico da gestão de Jair Bolsonaro, o enfrentamento da pandemia colocou a saúde entre os temas prioritários nas campanhas de opositores do atual governo

O Sistema Único de Saúde foi fragilizado pelo Teto de Gastos. Foto: Agência Brasil.
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Ponto crítico da gestão de Jair Bolsonaro, o enfrentamento da pandemia colocou a saúde entre os temas prioritários nas campanhas de opositores do atual governo. Do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao ex-governador de São Paulo João Doria (PSDB), pré-candidatos ao Palácio do Planalto preparam propostas que passam pelo fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), incentivo à formação de médicos e investimentos para aumentar a capacidade do país de produzir insumos hospitalares, após dificuldades na importação de máscaras, respiradores e até de seringas.

Em comum, os adversários do presidente pretendem explorar o negacionismo de Bolsonaro à frente da pandemia e o atraso em compra de vacinas. Por outro lado, a estratégia bolsonarista será a de reafirmar que embora não tenha se vacinado, o presidente deu os insumos para que a população pudesse fazê-lo.

O ex-presidente Lula montou um time com seis ex-ministros da Saúde de governos do PT para discutir sugestões. O grupo tem feito reuniões periódicas com o ex-presidente por telefone e por videoconferência e decidiu concentrar as propostas em quatro áreas: superação da pandemia com ampliação da cobertura vacinal e da capacidade de testagem, e a construção de centros de recuperação pós-covid; a criação de um complexo hospitalar de saúde no país; o fortalecimento do SUS; e o atendimento a demandas do sistema que ficaram represadas durante a pandemia, como as cirurgias eletivas.

— Para controlar essa a pandemia e reerguer a economia brasileira o setor da saúde tem um peso econômico muito importante com geração de emprego, renda, geração de inovação tecnológica, de fortalecimento dos serviços. Esse será um tema fundamental — afirma ao GLOBO o deputado Alexandre Padilha (PT), que foi ministro da Saúde no primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT). Além dele, os ex-ministro Humberto Costa, José Gomes Temporão, Arthur Chioro, José Saraiva Felipe e Agenor Álvares fazem parte da equipe.

O Brasil foi o segundo país no mundo a mais registrar mortes na pandemia, com 665.056 vidas perdidas para a covid-19, atrás apenas dos Estados Unidos. Segundo pesquisa Datafolha divulgada no dia 3 de abril, o desempenho de Bolsonaro durante a crise sanitária é considerada ruim ou péssima por 46% da população, enquanto 28% avaliam como boa ou ótima.

Após protagonizar embates com Bolsonaro durante a pandemia, Doria também pretende explorar o tema da saúde como ativo eleitoral. A equipe de comunicação da campanha do ex-governador de São Paulo tenta apresentá-lo como “pai da vacina” após sua atuação para a produção da CoronaVac pelo Instituto Butantan, ligado ao governo paulista, o primeiro imunizante aplicado no país. À frente das propostas de Doria para área está o ex-secretário executivo do Ministério da Saúde durante a gestão de Luiz Henrique Mandetta, João Gabbardo dos Reis. O médico também atuou da secretaria do centro de contingência do combate ao coronavírus em São Paulo.

— A gente vai ter que mostrar na campanha todo o prejuízo que a população sofreu pelas campanhas de desvalorização da importância das vacinas alimentadas pelo governo federal — diz Gabbardo. — No início da pandemia a vacina disponível para as pessoas que mais risco tinham, profissionais de saúde e idosos, era a CoronaVac. Vamos mostrar a importância do imunizante nesse processo.

Entre os pontos explorados, a equipe tucana prevê retomar a articulação do SUS entre a esfera federal, estadual e municipal que, segundo Gabbardo, foi desarticulada durante o mandato de Bolsonaro. O ex-secretário destaca ainda importância de facilitar o acesso dos brasileiros à saúde pública por meio de telemedicina e da inteligência artificial, por exemplo. Na esteira da otimização dos processos, uma das propostas é instituir um registro eletrônico para unificar informações dos pacientes de maneira integrada, a partir do compartilhamento de dados de atendimento em saúde aos quais tenha sido submetido. A exemplo da campanha petista, os tucanos também pretendem abordar o tema do financiamento do SUS.

— O recurso que temos hoje para o SUS é suficiente? Vamos ter que mexer na regra do teto ou não? Sem dúvida, vamos precisar dar mais dinheiro para saúde — questiona Gabbardo.

Além de ajudar na formulação do plano de Doria, Gabbardo também tem sido consultado pela equipe da pré-candidata do MDB, senadora Simone Tebet. No mês passado, o médico se reuniu com o coordenador do programa de governo da emedebista, o ex-governador o Rio Grande do Sul, Germano Rigotto. Gabbardo foi secretário de Saúde no governo de Rigotto. A ideia do grupo de Tebet, que tenta se cacifar como o nome dos partidos da chamada terceira via na disputa presidencial.

— É claro que vamos fazer tudo diferente do que aconteceu agora. Teremos que ter um Ministério da Saúde que faça uma grande coordenação nacional com responsabilidades também de estados e municípios. Nessa pandemia, tivemos a União em muitos momentos se omitindo, não agindo com a celeridade – critica Rigotto.

Para a campanha do ex-ministro Ciro Gomes (PDT), o plano para melhorar a saúde no país passa pelo incentivo à formação de médicos generalistas, fortalecimento da Estratégia Saúde da Família (ESF), e foco na primeira infância. O pedetista tem frisado aos técnicos que atuam na confecção de seu futuro plano de governo ser preciso melhorar a gestão do SUS. Assim como outras campanhas, o prontuário eletrônico integrado, o desenvolvimento de atividades econômicas relacionadas à área da saúde, e a retomada da cobertura vacinal também estão entre as iniciativas listadas.

— O SUS durante o governo Bolsonaro foi bastante desarticulado e consideravelmente desmontado. O sistema tem que ter uma integração muito forte entre a atenção básica, as policlínicas e o atendimento especializado. É fundamental criar um sistema para redução de filas do SUS — afirma Nelson Marconi, que está à frente do desenho do futuro plano de governo de Ciro.

Entre aliados de Bolsonaro, a avaliação é de que a rejeição à atuação de Bolsonaro durante a pandemia deve cair e o tema perder força no debate eleitoral. Para isso, contam principalmente com o avanço da vacinação e a queda no número de novos casos e mortes pela doença. No mês passado, o presidente chegou a dizer que decretaria o “fim da pandemia”, numa tentativa de passar a imagem de que o país superou a crise. A medida, porém, depende da Organização Mundial da Saúde (OMS).

O núcleo da pré-campanha de Bolsonaro quer emplacar o discurso de que o presidente, apesar de se recusar a tomar a vacina e ter feito inúmeros questionamentos sobre a eficácia dos imunizantes, garantiu os recursos para a compra das doses e investimentos para o atendimento da população durante a pandemia. Há o temor, contudo, de que declarações do próprio presidente contra a vacinação voltem a reacender o debate.

O time do projeto de reeleição de Bolsonaro ainda não começou a elaborar a proposta de governo para a reeleição, mas a participação do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, é dada como certa. O ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, alvo da CPI da Covid e denunciado pelo Ministério Público por improbidade administrativa por sua gestão, também deve colaborar com algumas sugestões. O plano de governo será coordenado pelo senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Embora ainda não tenha sido chamado a colaborar com a campanha, Queiroga costuma defender para um eventual segundo mandato de Bolsonaro pautas como a mudança no modelo de remuneração do SUS, baseado pela eficiência e qualidade dos procedimentos; a implementação de um protocolo único de atendimento, além de reforçar o investimento à atenção primária.

Para um eventual segundo mandato, o ministro ainda quer implementar as parcerias público-privadas nas unidades básicas de saúde (UBS). No ano passado, Bolsonaro chegou a publicar um decreto autorizando a iniciativa, mas recuou após críticas. Na visão do governo, o projeto precisa ser melhor comunicado e poderá fazer isso durante a campanha. Queiroga ainda quer propor mudanças na saúde suplementar, entre elas a criação de um modelo de compartilhamento de dados entre planos de saúde para ampliar a concorrência.

As propostas em debate pelo candidato do Partido Novo, Luiz Felipe d’Ávila, incluem a integração do SUS com a rede privada. O modelo, segundo a campanha de d’Ávila pode ser colocado em prática por meio de diferentes ferramentas como convênios, parcerias e até mesmo uso de vouchers.

“Trata-se de superar com eficiência e urgência problemas como a falta de leitos, de equipamentos para realização de exames ou de profissionais especializados”, afirmou a campanha do candidato por escrito em resposta à reportagem.

Além disso, estão nos planos do candidato ampliar o escopo da atuação de agentes de saúde da família para outros serviços sociais, e fomentar iniciativas relacionadas à promoção da saúde mental.

Também procurado, o pré-candidato André Janones (Avante) não respondeu aos questionamentos da reportagem.

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