Política

Os ‘pepinos’ que Lula enfrenta para fechar um acordo com o Centrão

Ministeriável delatado, fator gênero e promessa presidencial de solução rápida afetam negociações; desfecho pode sacrificar Alckmin em ministério

Geraldo Alckmin e Lula. Foto: Evaristo Sá/AFP
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Luiz Inácio Lula da Silva enfim trocou a chefia do Ministério do Turismo, uma decisão para atender os interesses dos deputados do tal ‘centrão’ e, com isso, reforçar a base governista no Congresso. O presidente, porém, criou um problema para si. Disse à turma que resolverá tudo no recesso parlamentar de julho. Mas ainda não há decisão sobre quais espaços abrir no governo e quem nomear.

A troca no Turismo atendeu o União Brasil, que agora terá um deputado na pasta, Celso Sabino (PA). Os outros partidos que Lula quer contemplar são o PP, do comandante da Câmara, Arthur Lira (AL), e o Republicanos, do vice de Lira, Marcos Pereira (SP). O PP gostaria de ver no governo um velho “colaborador” da legenda, Gilberto Occhi. Já o Republicanos quer emplacar o deputado Silvio Costa Filho (PE).

Lula não aceita Occhi. Também resiste às pretensões quanto aos cargos negociados. O Ministério do Desenvolvimento Social – responsável pelo Bolsa Família – Saúde e Esporte são cobiçados, mas o presidente não quer mexer nessas pastas. 

A sinalização de que ajeitaria as coisas com o Centrão rapidamente foi dada por Lula em 7 de julho. Naquele dia, deputados do grupo, incluindo Arthur Lira, visitaram o Alvorada para comemorar a aprovação da reforma tributária. Nas conversas, Lula prometeu encaminhar o rearranjo da equipe durante o recesso parlamentar de julho, segundo um interlocutor do governo que testemunhou o encontro.

Para esta testemunha, o presidente “criou um problema para si”. Motivo: ainda não há uma equação que combine os interesses de Lula e os do PP e do Republicanos.

Lula não aceita nomear Occhi. Em 2017, Occhi foi delatado por um doleiro, Lúcio Funaro, que o apontou como o responsável, na cúpula da Caixa, por recolher dinheiro de propina e repassá-lo aos políticos do PP que apadrinharam sua nomeação. Segundo o doleiro, Occhi tinha uma “meta mensal” de propina para “produzir” para o PP.

Occhi foi vice-presidente da Caixa no primeiro mandato de Dilma Rousseff, depois foi presidente no governo Michel Temer. Entre um momento e outro, havia sido, ainda com Dilma, ministro das Cidades e da Integração Nacional. Com Temer, esteve posteriormente à frente da Saúde.

O Centrão gostaria de chefiar, agora no governo Lula, o ministério da Saúde e a Caixa. No primeiro caso, por uma questão de grana. Há um caminhão de emendas parlamentares no orçamento da Saúde, cerca de 3 bilhões este ano. 

Após o Centrão cobiçar o cargo abertamente por vários dias, o presidente saiu em defesa da ministra Nísia Trindade.  “O Ministério da Saúde é do Lula, foi escolhido por mim e ficará até quando eu quiser”, disse na abertura da Conferência Nacional de Saúde. O recado foi repetido nesta sexta-feira 14.

Na quinta-feira 13, Lula havia feito algo parecido no caso do Ministério do Desenvolvimento Social, outra pasta cobiçada pelo Centrão. “Esse Ministério é um Ministério meu. Esse Ministério não sai. A Saúde não sai. Sabe, não é o partido que quer vir para o governo que pede Ministério. É o governo que oferece o Ministério. É só fazer uma inversão de valores”, afirmou Lula, em entrevista à Record.

Apesar dessa declaração, são comentários do próprio presidente que alimentam os sonhos do Centrão. Em conversas reservadas, segundo um auxiliar presidencial, Lula tem dito que não está satisfeito com o desempenho do ministro Wellington Dias, que é do PT. Dias, que é senador, até pode ser substituído, mas por outro petista.

Rita Serrano, a presidente da Caixa, vive situação similar. Lula acha que a bancária sindicalista tem deixado a desejar. Ao ouvir diretamente de Lula esse tipo de coisa (ou escutar relatos de quem tenha ouvido) os políticos do Centrão crescem os olhos sobre o cargo de Rita. O banco, afinal, tem uma atuação capilarizada e dinheiro para investir.

Um colaborador de Lula aponta um entrave adicional no interesse do Centrão por cargos hoje ocupados por mulheres: a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja. A primeira-dama defende e que haja o máximo possível de mulheres no governo, e ajuda a fazer a cabeça do presidente.

O Ministério do Esporte é um exemplo do dilema de gênero nas negociações. A pasta tem uma mulher, a ex-jogadora de vôlei Ana Moser. O presidente não irá tirá-la, aposta um colaborador dele. Embora não tenha dado uma declaração pública como havia feito com Nísia, Lula recebeu Ana Moser em 11 de julho para dar um sinal de que ela fica.

Segundo relatos do Planalto, o presidente disse para Ana Moser seguir trabalhando, sobretudo nos preparativos para a Copa do Mundo feminina de futebol que o Brasil sediará em 2027. Ao final da reunião, a Presidência divulgou uma foto da ministra ao lado de Lula, uma forma de mostrar que Ana Moser fica.

Não se pode descartar, porém que, na acomodação do Centrão, uma mulher seja preterida: Luciana Santos, do PCdoB, que é ministra da Ciência e Tecnologia. O PCdoB é um partido pequeno, se comparado aos dois do Centrão que Lula quer ter por perto. O PCdoB possui 7 deputados, o PP tem 49 e o Republicanos, 41.

Quem também pode acabar “sacrificado” é Alckmin, do PSB. Além de vice-presidente, é ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. A pasta pode ser tirada dele e cedida ao Centrão. 

Esse ministério já foi ocupado por um deputado do Republicanos, Marcos Pereira (SP), atual presidente do partido. Foi de 2016 a 2018, no governo Temer. Não é ele, porém, que o Republicanos indicou ao governo Lula como ministeriável, mas sim o deputado Silvio Costa Filho.

A ver como Lula descascará os “pepinos”.

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