Entrevistas

O que esperar da relação do governo Lula com as polícias e os militares, segundo Flávio Dino

‘A cada dia, o Lula se torna mais presidente e o Bolsonaro se torna menos presidente’, afirmou a CartaCapital o senador eleito e potencial ministro da Justiça

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O senador eleito Flávio Dino (PSB-MA), um dos favoritos a chefiar o Ministério da Justiça no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), sinalizou nesta sexta-feira 11 ser favorável à manutenção da segurança pública sob o guarda-chuva da pasta. Em entrevista a CartaCapital, ele também indicou como deve ser a relação da nova gestão com as polícias e as Forças Armadas.

Desmembrar as pastas de Justiça e Segurança Pública é uma possibilidade sobre a mesa do governo de transição. Embora Dino não se coloque frontalmente contra uma eventual mudança, avalia que “não se pode falar em política pública de segurança desvinculando do sistema de Justiça”.

“Só iremos conseguir essa efetividade da política pública se conseguirmos essa integração orgânica entre Justiça e segurança pública. Essa integração pode se dar em um ministério ou em dois ministérios, é uma decisão do presidente Lula. Mas jamais pode haver separação entre Justiça e segurança pública, porque isso não funciona”, afirmou.

Dino foi questionado diretamente sobre a Polícia Rodoviária Federal, cujo diretor-geral, Silvinei Vasques, se tornou alvo de um inquérito na Polícia Federal devido à sua conduta no segundo turno das eleições e nos bloqueios de rodovias promovidos por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL).

Para o senador eleito, é necessário “distinguir ideologização e cultura da ilegalidade” e contar com polícias “alinhadas com a lei”.

“Esse desvio não pode perseverar. Nenhuma corporação armada do Estado pode usar o monopólio do uso legítimo da força para objetivos pessoais, partidários ou ideológicos. Então, todos esses casos devem ser apurados – inclusive, é um dever do Ministério Público apurar as denúncias, para que haja essa condução de todas as corporações à noção de legalidade.”

Flávio Dino acrescenta que o policial “pode votar em quem quiser”, mas não tem o direito de militar politicamente usando a polícia”.

Vamos separar o joio do trigo. Não importa a posição ideológica, se o cidadão gosta ou não do PT. Ele tem de cumprir as regras e agir de acordo com a hierarquia e a disciplina. Isso será feito, é o certo, diferente do que foi feito agora [sob Bolsonaro], com uma partidarização da polícia. Se a política entra na polícia, a polícia deixa de cumprir o seu dever.”

Militares no centro do noticiário

De um lado, a semana foi marcada pela tentativa de Lula de recuperar a normalidade institucional no País. Ele se reuniu, entre outros, com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e com 10 dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal, em Brasília. Enquanto isso, o Brasil teve de lidar com um relatório dúbio do Ministério da Defesa sobre as eleições e com uma nota dos comandantes das Forças Armadas a respeito dos atos golpistas de bolsonaristas.

Em texto publicado nesta sexta, os responsáveis pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica condenam o que chamam de “restrições a direitos por parte de agentes públicos” e também “eventuais excessos cometidos em manifestações”. Avaliam ainda que o Poder Legislativo seria “o destinatário natural dos anseios e pleitos da população, em nome da qual legisla e atua, sempre na busca de corrigir possíveis arbitrariedades ou descaminhos autocráticos que possam colocar em risco o bem maior de nossa sociedade, qual seja, a sua Liberdade”.

Segundo Dino, o protagonismo de militares no noticiário político “precisa cessar”. Ele diz, contudo, ver um aspecto positivo na nota.

É o último capítulo de um triste livro. Um livro que se abre com as marchas milicianas – aquelas dominicais, de que militares inclusive participavam -, passa pela participação de muitos militares no desastrado combate à pandemia e chega até esta nota. Considero que a nota é o epílogo de um livro triste da vida brasileira”, resumiu.

O senador eleito declarou que os comandantes “têm suas opiniões, exóticas, e não deveriam nem manifestá-las”, mas ressaltou a noção explicitada no texto de que as desavenças têm de ser resolvidas segundo os métodos do Estado Democrático de Direito.

Com esses episódios, Dino entende que “o pior passou”, uma vez que havia no poder “um presidente com vocação ditatorial instigando as Forças Armadas a romperem com a legalidade, mas elas não toparam”.

“Agora, inverte-se o jogo”, prosseguiu. “O exercício do governo [Lula] vai dissipar certas conflituosidades, porque a carreira vai se renovando e a ação prática vai mostrar que quem respeitou as Forças Armadas no Brasil fomos nós, a esquerda. Os nossos governos respeitam as Forças Armadas de verdade. O Bolsonaro fez de tudo para desmoralizar as Forças Armadas, o tempo inteiro. O risco de golpe de Estado, hoje, é próximo a zero – sempre convém manter uma vigilância, mas é próximo a zero.”

Enquanto isso, Bolsonaro vive um “viés de baixa”, de acordo com o ex-governador do Maranhão.

“Ele vai reduzir seu tamanho. Já não governa. A bem da verdade, nunca governou, mas tinha seu cercadinho, sua live. Não tem mais, não sobrou nada. Agora, é esperar esses 50 dias e fazer o que tenho chamado de posse processual: a cada dia, o Lula se torna mais presidente e o Bolsonaro se torna menos presidente.”

Assista à íntegra da entrevista:

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