Política

O que a PF descobriu contra Carlos Bolsonaro e motivou a operação desta segunda

O vereador faria parte do ‘núcleo político’ de um esquema de monitoramento ilegal por meio da Abin

Carlos Bolsonaro. Foto: Sergio Lima/AFP
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Uma decisão de 17 páginas do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, detalha as razões para autorizar a operação da Polícia Federal contra o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (Republicanos), nesta segunda-feira 29. O filho 02 de Jair Bolsonaro (PL) é retratado como integrante do chamado “núcleo político” de um suposto esquema de monitoramento ilegal por meio da Agência Brasileira de Inteligência.

Segundo a decisão, o núcleo político “também é responsável pelo desvirtuamento da Abin e da ferramente First Mile”, o software pelo qual os envolvidos conseguiriam monitorar desafetos do governo Bolsonaro e autoridades, sem aval judicial.

A investigação da PF identificou um pedido feito por Luciana Almeida, assessora de Carlos, que teria como destinatário Alexandre Ramagem, diretor da Abin entre 2019 e 2022.

A mensagem teria sido enviada por Almeida a Ramagem “através de Priscilla Pereira e Silva”, embora o ano em que a conversa ocorreu não apareça no material.

No diálogo, Almeida afirma precisar “muito de uma ajuda” sobre investigações contra Jair Bolsonaro e familiares. Diz a mensagem:

“Delegada PF. Dra. ISABELA MUNIZ FERREIRA –
Delegacia da PF Inquéritos Especiais
Inquéritos: 73.630 / 73.637 (Envolvendo PR e 3 filhos)
Escrivão: Henry Basílio Moura”

Na avaliação da PF, o diálogo indica que o “núcleo político” se valia de Ramagem para obter informações sigilosas ou ainda pendentes de esclarecimento.

“A autoridade policial ressalta que os dados enviados na mensagem acima referida são compatíveis com informações disponíveis nos sistemas internos da Polícia Federal”, reforçou Moraes. Ele ainda anotou que, conforme os elementos reunidos até o momento, “a organização criminosa instalada na Abin também se valeu de métodos ilegais para a realização de ações clandestinas direcionadas contra pessoas ideologicamente qualificadas como opositoras”.

A interferência registrada nesse caso não seria um “acontecimento avulso” no período, uma vez que a Controladoria-Geral da União teria identificado que Ramagem imprimiu, em fevereiro de 2020, informações de inquéritos eleitorais em tramitação na PF sobre políticos do Rio de Janeiro.

Moraes não descarta, também, a possibilidade de aparecerem novos núcleos da suposta organização criminosa no decorrer da investigação.

A Procuradoria-Geral da República se manifestou contra um mandado de busca e apreensão para Priscilla Pereira e Silva, mas chancelou as diligências contra Almeida e Carlos.

Moraes determinou a apreensão de documentos, computadores, tablets, celulares e outros dispositivos eletrônicos dos alvos. A PF deverá analisar todo o material obtido e apresentar um relatório parcial ao STF em até 30 dias.

O que é a “Abin paralela”

A operação desta segunda contra Carlos Bolsonaro é um desdobramento das diligências cumpridas pela PF na última quinta-feira 25 contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ). Todas as medidas foram autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes.

O objetivo da PF é investigar uma suposta organização criminosa instalada na Abin, órgão chefiado por Ramagem entre julho de 2019 e abril de 2022. O esquema serviria para monitorar desafetos do governo de Jair Bolsonaro, por meio de ferramentas de geolocalização de dispositivos móveis – sem autorização judicial.

A PF identificou que essa organização criminosa espionava autoridades por meio da invasão de aparelhos e computadores, além da infraestrutura de telefonia. A articulação ocorreria em diferentes núcleos.

O principal grupo, denominado pela PF de “Núcleo da Alta Gestão”, seria formado pelos delegados à época cedidos para a Abin e que ocupavam cargos de direção na agência. O principal integrante do núcleo seria Ramagem. O objetivo central seria, por meio da utilização do sistema espião First Mile, monitorar alvos e pessoas públicas e realizar um “serviço de contrainteligência e criação de relatórios apócrifos que seriam divulgados com o fim de criar narrativas falsas”.

O “Núcleo Subordinados” contaria com policiais federais cedidos à Abin que serviriam como “staff” para a alta gestão. Já o “Núcleo-Evento Portaria” teria os responsáveis por diligências que resultaram na tentativa de vincular parlamentares e ministros do Supremo a uma organização criminosa. Por fim, ao “Núcleo Tratamento Log” caberia o tratamento dos logs disponíveis desde o início da investigação.

Segundo a decisão de Moraes, apurações internas da Abin sobre a utilização do software espião teriam sido atrapalhadas por interferência de Alexandre Ramagem e de Carlos Afonso Gonçalves Coelho, ex-secretário de Planejamento e Gestão e ex-diretor-adjunto.

Um dos alvos do suposto esquema de monitoramento ilegal seria o então governador do Ceará, Camilo Santana (PT), hoje ministro da Educação.

Segundo Moraes, policiais federais cedidos à Abin, sob a direção de Ramagem, utilizaram ferramentas e serviços da agência a fim de interferir em diversas investigações da PF – um exemplo seria a tentativa de produzir provas a favor de Jair Renan Bolsonaro, filho do ex-presidente, em um inquérito sobre suposto tráfico de influência.

A decisão também aponta estar confirmada a utilização da Abin na preparação de relatórios para embasar a defesa do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no caso das “rachadinhas”, protagonizado por Fabrício Queiroz. O parlamentar nega a acusação.

Por meio do “Núcleo-Evento Portaria”, a suposta organização criminosa ainda teria tentado associar deputados federais e ministros do STF ao Primeiro Comando da Capital, facção criminosa conhecida como PCC. De acordo com a Procuradoria-Geral da República, o intuito seria “alimentar a difusão de fake news contra os magistrados da Suprema Corte”.

Outros alvos do monitoramento ilegal seriam o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia e a ex-deputada Joice Hasselmann. Além disso, a PF indicou que a Abin foi utilizada para monitorar uma promotora de Justiça responsável pela investigação sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL).

A PF pediu a suspensão do mandato parlamentar de Ramagem, mas a solicitação foi negada por Moraes, sob o argumento de que “não se vislumbra a atual necessidade”.

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