Política

Maioria do STF é favorável à aplicação da nova lei de improbidade em processos antigos que ainda estão em curso

Processos com trânsito em julgado, ou seja, que já foram encerrados e nos quais não é possível mais recorrer, não poderão ser reabertos

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABR
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Sete dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram a favor da retroatividade da nova lei de improbidade administrativa, ou seja, eles entendem que a norma pode ser usada para beneficiar pessoas acusadas ou condenadas por atos ocorridos antes da sua entrada em vigor, em outubro de 2021. Para isso ocorrer, porém, é necessário que os processos ainda estejam abertos na Justiça, e que os réus tenham sido acusados de cometer atos “culposos”, ou seja, caso em que não houve a intenção de cometer a irregularidade.

A decisão não significa a absolvição automática de vários políticos e servidores. Pela decisão do STF, cada caso deverá ser analisado individualmente pelo juiz local, para avaliar se é mesmo um ato culposo, ou se houve “dolo”, ou seja, intenção de cometer a irregularidade.

A nova lei de improbidade também alterou os prazos de prescrição, mas seis dos 11 ministros entenderam que eles não podem ser aplicados nos casos antigos, ou seja, não retroagem. Um meio termo foi aplicado na chamada prescrição intercorrente: a nova lei determinou que, uma vez apresentada a ação de improbidade, há um prazo de quatro anos para a sentença. No caso dos processos antigos, esse prazo começará a contar não a partir da abertura da ação, mas a partir do momento em que a nova lei entrou em vigor, em 2021.

Seis dos 11 ministros do STF também foram contra a possibilidade de a nova lei ser usada para beneficiar pessoas condenadas em processos com trânsito em julgado, ou seja, aqueles que já foram encerrados e nos quais não é mais possível recorrer.

Esta é a quarta sessão de julgamento no plenário do STF de uma ação em que vai ser decidido se a nova lei de improbidade administrativa pode retroagir. Mais branda que a edição anterior, por indicar que só devem ser punidos quem tinha “dolo”, ou seja a intenção de cometer irregularidades, a norma pode beneficiar uma série de políticos, inclusive alguns que pretendem disputar as eleições de outubro, como o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda (PL), que é candidato a deputado federal.

O voto do relator, o ministro Alexandre de Moraes, prevaleceu em todos os pontos. O que variou foi a lista de ministros que o acompanhou em dada questão. Moraes voltou a dizer nesta quinta-feira que a retroatividade não é automática. Cada caso terá que ser analisado pelo juiz, que deverá observar as regras fixadas pelo STF.

Processos em andamento

No caso das ações que seguem abertas, o que inclui aquelas em que já houve condenação, mas ainda há recursos pendentes de análise, seis ministros já votaram para que a nova lei seja aplicada para beneficiar os acusados por atos “culposos”: o relator, Alexandre e Moraes, André Mendonça, Nunes Marques, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e o presidente da Corte, Luiz Fux. Moraes evitou usar a palavra “retroagir”, mas seu voto é no sentido de aplicar a nova lei para casos antigos.

Os quatro ministros contrários à retroatividade — Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Cármen Lúcia — entendem que isso só pode ocorrer, para beneficiar os acusados, em lei penal. A lei de improbidade, embora preveja sanções como perda dos direitos políticos e proibição de firmar contratos com a administração pública, não é considera uma norma penal.

— Entendo que a retroatividade benéfica da lei penal deve ter uma interpretação restritiva, ou seja, circunscrita ao direito penal, na expressa dicção da Constituição Federal, não alcançando o direito administrativo sancionador, mais dinâmico e voltado à tutela do interesse público — disse Rosa Weber na sessão desta quinta-feira.

A corrente contrária, favorável à retroatividade, avaliou de forma diferente.

— A retroatividade da lei mais benéfica encontra amparo institucional, aplicado àqueles que praticaram um ilícito correspondente à improbidade, que não deixa de ser um microssistema do direito penal estatal — afirmou Lewandowski.

Processos já encerrados

Votaram contra a possibilidade de rever casos já encerrados o relator, ministro Alexandre de Moraes, mais Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Nunes Marques. Outros cinco — André Mendonça, Nunes Marques, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes — avaliam que esses processos podem ser revistos. No caso de Mendonça e Lewandowski, isso se daria por meio de uma nova ação rescisória, uma vez que a ação original já foi encerrada.

Prescrição

Seis ministros — Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Luiz Fux — foram contra a retroatividade dos prazos de prescrição. Em relação ao máximo de quatro anos entre a abertura da ação e a sentença, nove ministros disseram esse prazo, no caso dos processos mais antigos, deve começar a ser contado em 2021: Moraes, Mendonça, Fachin, Barroso, Weber, Cármen Lúcia, Lewandowski, Mendes e Fux.

O caso específico que está em análise pelo STF diz respeito a uma ação de improbidade contra uma ex-servidora do INSS, mas o que for decidido deverá ter repercussão geral, ou seja, terá de ser seguido por todos os juízes e tribunais do país.

Atos culposos e dolosos

Há três tipos de improbidade previstos na legislação. Deles, a lei antiga previa tanto a modalidade culposa como a dolosa, quando há intenção de cometer a irregularidade, apenas no caso de atos que causam prejuízo aos cofres públicos. Para os outros dois tipos — atos que levem a enriquecimento ilícito e atos que atentam contra os princípios da administração pública —, a lei nunca mencionou a modalidade culposa. Assim, disse Moraes, a situação não muda nesses casos.

No dia 3 de agosto, antes do voto de Moraes, nove representantes de diferentes instituições passaram pela tribuna do plenário do STF. De um lado, entidades que reúnem gestores públicos e advogados defenderam a retroatividade na nova lei de improbidade. Já os representantes do Ministério Público argumentaram que a norma, aprovada no ano passado, só deve valer para atos posteriores.

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