Política

Isolado por líderes globais, Bolsonaro encerra participação no G20 sem reunião bilateral na agenda

Na manhã deste domingo, o ex-capitão não participou de uma visita organizada pelo premiê italiano, Mario Draghi, à Fontana di Trevi

Foto: FILIPPO MONTEFORTE/AFP
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O presidente Jair Bolsonaro encerra neste domingo 31 sua participação na cúpula do G20, o grupo das 20 maiores economias do mundo. O fim da passagem do ex-capitão por Roma chega sem qualquer reunião bilateral com líderes globais na agenda do dia.

Enquanto isso, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, tem encontro marcado com o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau. O mandatário do país vizinho, a propósito, foi um dos poucos que se dispuseram a conversar na véspera com Bolsonaro – embora o tema central não tenha sido a política ou a economia, mas o futebol.

Na manhã deste domingo, Bolsonaro não participou de uma visita organizada pelo premiê italiano, Mario Draghi, à Fontana di Trevi. Compareceram a primeira-ministra alemã, Angela Merkel, o presidente francês, Emmanuel Macron, e os premiês da Índia, Narenda Modi, da Espanha, Pedro Sánchez, e do Reino Unido, Boris Johnson. A informação é do jornal Folha de S.Paulo.

No sábado 30, chamou a atenção da imprensa italiana o fato de Draghi ter evitado apertar a mão de Bolsonaro, após ter cumprimentado muitos outros chefes de Estado. Veículos do país destacaram que o dirigente brasileiro afirmou categoricamente que “não vai se vacinar contra a Covid-19”.

Relato do jornalista Jamil Chade, do UOL, dá conta de que Bolsonaro também esteve isolado na antessala da reunião principal, no sábado. Ele não foi abordado por qualquer um dos líderes que estavam no local, como Merkel, Trudeau, Johnson e Macron. Assim, dirigiu-se à mesa do café e tentou puxar conversa com garçons. “Todo mundo italiano aí?”, perguntou, segundo o repórter brasileiro. O presidente ainda tentou fazer uma piada com a final da Copa do Mundo de 1970, disputada por Brasil e Itália, mas ninguém se divertiu.

Pouco depois, seguranças de Bolsonaro providenciaram uma conversa informal com o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que durou dois minutos. Questionado sobre as eleições de 2022, o ex-capitão omitiu as pesquisas que apontam a rejeição popular ao governo.

“Eu também tenho um apoio popular muito grande. Temos uma boa equipe de ministros. Não aceitei indicação de ninguém. Fui eu que botei todo mundo. Prestigiei as Forças Armadas”, disse. “Um terço dos ministros [é de] militares profissionais. Não é fácil. Fazer as coisas certas é mais difícil.”

Pesquisa PoderData divulgada na última quinta-feira 28 mostra que a reprovação ao governo é de 58%, mesmo índice do levantamento anterior, realizado na 1ª quinzena de outubro. Os que aprovam a gestão são 33%, marca que também repete a última rodada da pesquisa.

A avaliação do desempenho pessoal de Bolsonaro na Presidência teve leve piora. 56% o classificam como ruim ou péssimo, ante 53% no levantamento anterior. Para 26%, ele é bom ou ótimo (eram 29%) e para 14% é regular (eram 18%).

No encontro informal com Erdogan, o ministro da Economia, Paulo Guedes, acompanhou Bolsonaro. O presidente brasileiro também mencionou a Petrobras, após o turco dizer que o País tem “grandes recursos petrolíferos.”

“Petrobras é um problema. Mas estamos quebrando monopólios, com uma reação muito grande. Há pouco tempo era uma empresa de partido político. Mudamos isso”, acrescentou Bolsonaro.

Ainda antes do evento principal, Bolsonaro trocou poucas palavras com Modi e teve um breve diálogo com Fernández. Ele não reproduziu pessoalmente os ataques desferidos ao país vizinho nos últimos meses em transmissões ao vivo e em contato com apoiadores.

Segundo o jornal Pagina 12, de Buenos Aires, o tema da breve conversa entre os dois foi o futebol. Em julho, antes da final da Copa América, Bolsonaro apostou em uma vitória da seleção brasileira sobre a argentina por 5 a 0. A equipe de Tite, porém, foi derrotada por 1 a 0, no Maracanã.

“Você não ligou para me felicitar pela vitória da Argentina”, disse Fernández a Bolsonaro no G20, em tom de brincadeira.

Em diversas ocasiões ao longo do governo de Fernández, Bolsonaro promoveu ataques à Argentina. No mais recente deles, aproveitou uma visita a um abrigo da Operação Acolhida, em Boa Vista (RR), para fazer provocações. A força-tarefa é responsável pela recepção de migrantes venezuelanos no Brasil.

Em dado momento de seu discurso, Bolsonaro aventou a possibilidade de que a situação de calamidade em Roraima se repetisse no sul do País, em referência à crise econômica na Argentina.

Em entrevista, fake news se repetem

Após o discurso oficial no sábado, Bolsonaro voltou a exaltar uma suposta “recuperação da economia” no Brasil, mesmo em meio a índices que mostram o aprofundamento da crise. Ele tentou demonstrar otimismo com a situação do País em conversa com jornalistas.

“O Brasil está indo muito bem na recuperação da economia. Como eu disse lá atrás, tínhamos dois problemas: o vírus e o desemprego”, repetiu. “O Brasil fez o seu dever de casa e não mediu esforços para atender aos mais necessitados. E precisamos, agora sim, investir na retomada da economia.”

Na última terça-feira 26, o IBGE divulgou o IPCA-15, que é uma prévia da inflação oficial do País. Ele acelerou para 1,20% em outubro, depois de registrar uma taxa de 1,14% em setembro. Trata-se da maior variação para um mês de outubro desde 1995 e da maior variação mensal desde fevereiro de 2016.

Um dia depois, o IBGE comunicou que a taxa de desemprego no Brasil chegou, no trimestre encerrado em agosto, a 13,2%. Apesar de indicar queda, a pesquisa expôs o avanço da informalidade e um abalo histórico no rendimento real dos trabalhadores.

Em meio ao aumento da inflação de alimentos, combustíveis e energia, o Banco Central apertou ainda mais os cintos na política monetária também na quarta-feira 27. Por unanimidade, o Comitê de Política Monetária elevou a taxa Selic, juros básicos da economia, de 6,25% para 7,75% ao ano. A decisão surpreendeu analistas financeiros, que esperavam reajuste para 7,5% ao ano.

Bolsonaro tornou a criticar a imprensa pela cobertura de episódios que ilustram o drama dos brasileiros, como o de pessoas que buscam restos de comida em caminhões.

“A gente lamenta. Agora, quando a gente fala de dobrar o valor do ticket médio do Bolsa Família, a mesma mídia me critica de querer furar o teto. No ano passado, foram 700 bilhões além do teto. Neste ano, com a questão dos precatórios, não furaremos o teto”, acrescentou. O presidente admitiu se preocupar com a dificuldade para aprovar a PEC dos Precatórios na Câmara, mas sugeriu ter um ‘plano B’.

“Preocupa, o ano está acabando. Mas eu sou um paraquedista, sempre tenho um paraquedas reserva comigo, mas com muita responsabilidade.”

Novamente, ele tentou culpar prefeitos e governadores que recorreram a medidas de distanciamento social para frear a pandemia. Também se dirigiu ao “mercado”, em meio à discussão sobre a flexibilização do teto de gastos para acomodar o Auxílio Brasil, programa que acaba com o Bolsa Família e é visto como primordial para a campanha do presidente em 2022.

“Não queremos causar nenhum furor no mercado. O mercado tem de entender que se o Brasil for mal, ele vai se dar mal também. Estamos no mesmo time. O mercado, toda vez nervosinho, atrapalha em tudo o Brasil”, disse Bolsonaro, pouco antes de retomar a ofensiva contra estados e municípios.

“Me criticaram agora há pouco dizendo que eu empobreci. Eu não influenciei negativamente na economia. Não fechei nada no Brasil. Sempre disse que tínhamos de nos preocupar com o vírus e com o desemprego”, acrescentou. “Fiz a minha parte e apanhei muito de grande parte da mídia.”

Protestos nas ruas

No fim da tarde de sábado, Bolsonaro e sua comitiva, que incluía ministros como Walter Braga Netto (Defesa), ouviram gritos de “genocida” quando voltavam de um passeio pelo Vaticano. Apoiadores responderam com gritos de “mito”.

Na frente da embaixada brasileira em Roma, manifestantes distribuíram cardápios de um fictício “Restaurante do Bolsonaro”. Os panfletos traziam críticas ao governo brasileiro nas áreas ambiental, econômica, de direitos humanos e no combate à pandemia.

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