Política

Hacker diz que Bolsonaro lhe prometeu indulto por ‘fraude fake’ em urnas e grampo contra Moraes

Em depoimento à CPMI do 8 de Janeiro, Walter Delgatti Neto disse que Bolsonaro lhe encaminhou ao Ministério da Defesa para articular esquema

O hacker da Vaza Jato, Walter Delgatti Neto. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado
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Ouvido nesta quinta-feira 17 pela CPMI do 8 de Janeiro, o hacker Walter Delgatti Neto afirmou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) prometeu lhe conceder um indulto caso assumisse a autoria de um suposto grampo telefônico com “conversas comprometedoras” do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.

Segundo Delgatti, Bolsonaro teria dito que o grampo havia sido realizado por “agentes de outro país”. O então presidente teria prometido, ainda, “mandar prender” o juiz que, eventualmente, decretasse a prisão do hacker. O diálogo teria ocorrido na primeira quinzena de setembro.

A ideia é que, se assumisse a autoria do grampo, Walter Delgatti não poderia ser questionado pela esquerda, já que havia se tornado conhecido com os vazamentos da chamada “Vaza Jato”.

O ex-presidente teria garantido que o suposto grampo motivaria uma ação contra Moraes e justificaria a realização de uma eleição com o voto impresso. Delgatti disse ter concordado com a proposta.

“Eu falei com o presidente da República, e, segundo ele, eles haviam conseguido um grampo, que era tão esperado à época, do ministro Alexandre de Moraes”, disse. “Segundo ele, esse grampo foi realizado já, teria conversas comprometedoras do ministro, e ele precisava que eu assumisse a autoria desse grampo. Lembrando que, à época, eu era o hacker da Vaza Jato, né. Então, seria difícil a esquerda questionar, porque lá trás eles apoiaram.”

‘Ele [Bolsonaro] disse assim: fique tranquilo, se caso algum juiz te prender, eu mando prender o juiz. E deu risada’, afirmou.

Delgatti também disse que Bolsonaro chegou a lhe prometer a concessão de um indulto em troca de uma demonstração de fraude de uma urna eletrônica ao Ministério da Defesa.

O hacker narrou detalhes de uma suposta primeira reunião na sede do Partido Liberal em Brasília, em 9 de agosto do ano passado, com o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, o marqueteiro do PL, Duda Lima, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), o deputado estadual Bruno Zambelli (PL-SP), irmão de Carla, o marido da deputada e o advogado de Delgatti, Ariovaldo Moreira.

Durante a tarde, teria surgido a proposta de Delgatti “participar como garoto-propaganda da campanha de Bolsonaro”. Inicialmente, o plano era que o hacker concedesse uma entrevista ‘com a esquerda’ e, de forma espontânea, falasse sobre a suposta fragilidade das urnas. A proposta inicial, no entanto, não se concretizou, segundo Delgatti, porque o encontro foi ‘vazado’ pela mídia.

Delgatti: PL sugeriu vídeo com manipulação fake de urna

Teria avançado, então, uma segunda proposta do PL: a de que, no dia 7 de setembro, Delgatti implantasse um “código malicioso” em uma urna eletrônica para demonstrar, em um vídeo, a suposta possibilidade de fraude no sistema eleitoral.

“Eles pegariam uma urna – emprestada da OAB, eu acredito – e eu colocaria um aplicativo meu lá e mostraria à população que é possível apertar um voto e sair outro”, disse.

Mas, para isso, ele não utilizaria o código-fonte do Tribunal Superior Eleitoral, e sim um código criado por ele mesmo. Dessa forma, o vídeo consistiria em uma fake news, por simular que o código-fonte do TSE possibilitaria fraude.

Para comprovar a possibilidade de fraude numa eleição, Delgatti teria de invadir o sistema eleitoral do TSE – o que ele mesmo admitiu que não conseguiu fazer. Conforme já demonstrou a Corte, o sistema é inviolável.

“O código-fonte é o código em si. É o código aberto. Ele tem diversos arquivos. E, compilado, ele vira apenas um, que é o que estava na urna. E quem tem acesso ao código-fonte antes de compilá-lo consegue inserir linhas que façam com que seja apertado um voto e o resultado seja outro”, afirmou.

“Eles queriam que eu fizesse um código-fonte meu, não o oficial do TSE, e nesse código-fonte eu inserisse essas linhas, que eles chamam de código malicioso, porque ele tem como finalidade enganar, como finalidade colocar dúvidas na eleição”.

Delgatti: Bolsonaro pediu reunião de hacker com a Defesa

Delgatti disse ter sido levado ao Palácio da Alvorada em 10 de agosto para se reunir com Bolsonaro, Carla Zambelli, o ajudande de ordens Mauro Cid e o coronel Marcelo Câmara. Na ocasião, o ex-presidente teria encaminhado o hacker para explicar o plano ao Ministério da Defesa.

“O presidente me disse: olha, a parte técnica, eu não entendo. Então, eu irei enviá-lo ao Ministério da Defesa, e lá, com os técnicos, você explica tudo isso. A conversa se resumiu nisso. E, também, ele pediu que eu fizesse o que o Duda havia dito sobre o 7 de setembro”, relatou o hacker.

Bolsonaro, então, teria solicitado que o coronel Marcelo Câmara levasse o hacker até o Ministério da Defesa.

“Ele [Bolsonaro] fala: olha, eu preciso que você leve ele até o Ministério da Defesa. Ele [Marcelo Câmara] contrariou, ele disse: não, mas lá é complicado. E o Bolsonaro disse: não, isso é uma ordem minha, cumpra”, disse Delgatti Neto.

Na mesma reunião, o hacker teria recebido garantia de proteção por Bolsonaro. O então presidente teria prometido um indulto, como o concedido ao ex-deputado Daniel Silveira.

“Inclusive, a ideia ali era que eu receberia um indulto do presidente. Ele havia concedido um indulto a um deputado federal, e como eu estava com o processo da Spoofing na época e com as cautelares que me proibiam de acessar a internet e trabalhar, eu visava esse indulto”, disse.

Após esse encontro, Delgatti diz ter ido ao Ministério da Defesa cinco vezes. Na pasta, ele teria conversado com o então ministro Paulo Sérgio Nogueira e com profissionais de Tecnologia de Informação.

Nessas conversas, o hacker teria ajudado a Defesa a elaborar um relatório das Forças Armadas sobre as urnas eletrônicas, encaminhado posteriormente ao TSE. O relato já havia sido feito à Polícia Federal.

A reação da base governista

A partir do depoimento, a base do governo sustentou que Bolsonaro cometeu irregularidade ao prometer proteção a um hacker em troca de um vídeo que disseminaria fake news sobre a eleição, com o intuito de provocar convulsão social contra o resultado da votação.

A ilicitude seria agravada com as diversas idas do hacker ao Ministério da Defesa, o que comprovaria o planejamento do esquema a mando de Bolsonaro.

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