Política

Empresário repassou dinheiro a filho, advogada e marqueteiro de Bolsonaro enquanto fazia lobby por garimpo

A informação é da Folha de S. Paulo, que teve acesso a uma troca de mensagens interceptadas pela PF. Versões sobre os motivos dos pagamentos contrastam entre si

Foto: Reprodução/Redes Sociais
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O empresário Luis Felipe Belmonte, notório apoiador de Jair Bolsonaro, financiou pessoas próximas ao capitão enquanto atuava como lobista da mineração em terras indígenas junto ao Palácio do Planalto.

A informação é do jornal Folha de S. Paulo, que teve acesso a uma troca de mensagens interceptadas pela Polícia Federal. As conversas levantam suspeitas sobre a relação entre os pagamentos e a aprovação do projeto de garimpo nas áreas protegidas.

As mensagens foram obtidas pela PF ao investigar Belmonte no inquérito que apura o financiamento de atos antidemocráticos de abril de 2020. As conversas, diz o jornal, ocorreram entre 2018 e 2020.

Um dos beneficiados pelos repasses de Belmonte foi Jair Renan Bolsonaro, filho mais novo do presidente. O jovem recebeu quase 10 mil reais do empresário em 2020 com a justificativa de financiar a reforma do seu escritório. O caso abre mais uma frente nas suspeitas de que o ‘04’ cometeu tráfico de influência no governo federal.

Além de Jair Renan, a advogada Karina Kufa, responsável por atender Bolsonaro e seu círculo, e os marqueteiros Sergio Lima e Walter Bifulco, que cuidam da campanha de reeleição do ex-capitão, receberam valores bem mais vultosos. Kufa embolsou 634 mil via seu escritório e os marqueteiros 1,5 milhão de reais.

Em uma das mensagens, o empresário inclusive confessa quais eram suas intenções com os repasses: se aproxima de Bolsonaro para aprovar garimpo nas terras indígenas. Ao ser questionado pela sua esposa, Paulo Belmonte, que é deputada pelo Cidadania no Distrito Federal, ele escreveu:

“Projeto de comunicação: envolve três fatores, a) comunicação e imagem, propriamente dito; b) aproximação com o Planalto e viabilização do projeto dos indígenas. O Presidente já deu sinal verde e já fez comunicação pública. Estou trabalhando no caso com o governo e com a Karina, advogada pessoal dele; c) preparação do Portal”, escreveu o empresário.

Em seguida, ele ainda completa: “Quanto aos indígenas, levei a proposta ao presidente. Foi pedido que eu prepare o decreto. Provavelmente ainda este ano começaremos a extra”.

Procurado, Belmonte negou a relação entre os pagamentos e a liberação de mineração em terras indígenas. Ele disse nunca ter conversado sobre o tema com o presidente, diferentemente do que indicam as mensagens. Ele confessa, no entanto, que tratou do assunto com Jorge Oliveira, então secretário-geral da Presidência, e atual ministro do Tribunal de Contas da União. Kufa e Lima também negam relação entre os pagamentos recebidos e o lobby da mineração.

Sobre a mensagem trocada com a esposa, ele minimiza e alega que foi apenas para se ‘desvencilhar das cobranças’ da mulher. Em outras conversas, porém, Belmonte reforça a atuação em prol do garimpo:

“Saindo agora de longas reuniões no Palácio do Planalto. A ideia de decreto para regulamentar à cata, faiscação e garimpagem está sendo muito bem recebida”, escreve o empresário a um interlocutor registrado no telefone em posse da PF como Samir.

Ainda segundo o jornal, Belmonte trocava mensagens com Alvaro Tukano, um indígena que apoia a mineração no Alto Rio Negro, no Amazonas. O homem já esteve com Bolsonaro e Mourão. Um dia após o encontro no Planalto, Tukano cobrou repasses de Belmonte. “Não se esqueça de alimentar minha conta bancária”, escreveu o indígena em 25 de setembro de 2019.

As versões para os repasses a Kufa e Lima variam a depender da fonte. Belmonte alega que a advogada fez uma perícia judicial sobre um tema de foro reservado e que o marqueteiro teria recebido os valores por um empréstimo e um pagamento de um vídeo. Kufa, por sua vez, diz que o pagamento foi de uma auditoria que ela fez contra o PSL. Já Lima alega que os mais de 1 milhão de reais são de uma empresa que abriria em sociedade com Belmonte, mas que não prosperou.

“A gente encerrou essa empresa. Provavelmente isso [dinheiro pago por Belmonte] vai ficar no passivo do negócio, porque não foi para frente”, afirmou o marqueteiro, contradizendo Belmonte.

Já sobre o pagamento a Renan Bolsonaro, ele diz se tratar de um ‘valor irrisório’. O jovem não comentou. Ao indígena, o empresário diz ter feito ‘apenas caridade’. Belmonte, vale lembrar, é o advogado responsável pela tentativa frustrada de criar o Aliança pelo Brasil, partido de extrema-direita idealizado por Bolsonaro.

Com a palavra, a defesa de Belmonte:

Felipe Belmonte, na condição de advogado, foi contratado para defender um grupo de indígenas favoráveis à mineração em suas terras. A informação é pública e a atuação profissional para tanto é absolutamente legal, tendo-se proposto a ação judicial própria em novembro de 2019, sendo o assunto tratado no âmbito do Poder Judiciário.

No caso específico relacionado a Belmonte, o advogado defendeu que indígenas tivessem reconhecido o direito deles de explorar as riquezas das próprias terras, sendo que não possui a menor lógica questionamentos de ingerências a respeito no âmbito do Executivo, quando a matéria é de competência do Congresso Nacional, conforme os termos do art. 49, inciso XVI e art. 231, § 3º da Constituição Federal, cabendo decisão judicial em casos específicos. Ou seja, a matéria não é da competência do Poder Executivo e não seria lá que o assunto poderia ter solução.

Pagamentos de Felipe Belmonte ao publicitário Sergio Lima, feitos em junho de 2019, não guardam qualquer relação com a defesa da extração mineral em terras indígenas. Os pagamentos dizem respeito a um contrato de construção de imagem pública própria e de atividades esportivas.

O resultado do trabalho de imagem feita pelo publicitário já foi devidamente apresentado às autoridades competentes. Trata-se de uma relação comercial regular entre dois entes privados, sem qualquer ligação com a questão de mineração em terras indígenas, inclusive sendo assuntos realizados em datas distintas, com objetos absolutamente próprios e sem correlação alguma.

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