Política
Em mensagens, Mauro Cid lamenta que plano de golpe não tenha se concretizado: ‘Infelizmente’
Resposta lacônica foi dada a outro militar do Exército, com quem Cid debateu, por diversas vezes, a possibilidade de rompimento da democracia


O tenente-coronel Mauro Cid, principal ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), lamentou, em conversas apreendidas pela Polícia Federal, o fato do seu plano de golpe não ter sido colocado em prática. O lamento foi revelado pela revista Veja nesta sexta-feira 16.
O trecho consta em uma série de mensagens trocadas entre Mauro Cid e o coronel Jean Lawand Junior, então subchefe do Estado Maior do Exército. Na conversa, Cid recebe o desabafo do colega de farda após a constatação de que o golpe planejado não sairá do papel:
“Soube agora que não vai sair nada”, escreve o militar. “Decepção irmão. Entregaram o país aos bandidos”, diz então o coronel. A mensagem é do dia 21 de dezembro do ano passado.
Menos de três minutos depois, Cid responde: “Infelizmente”.
Dias antes, no mesmo canal, os dois debateram a ‘necessidade’ de se ‘dar a ordem’ para que um plano golpista descrito em detalhes semanas antes fosse posto em prática. A trama estava descrita em um documento encontrado pela PF no celular do braço direito de Bolsonaro. O arquivo era intitulado Forças Armadas como poder moderador. Trata-se, mais uma vez, de uma interpretação da Constituição segundo a qual os militares poderiam ser convocados a intermediar um conflito entre Poderes.
O coronel Jean Lawand Junior, então subchefe do Estado Maior do Exército presta continência para Braga Netto.
Foto: Divulgação/Exército Brasileiro
O passo a passo golpista descrito pelo arquivo previa que Bolsonaro encaminhasse ao comando das Forças Armadas um relato de supostos atos inconstitucionais do Judiciário. Se a demanda fosse aceita pela caserna, um interventor seria nomeado e fixaria um prazo para o “restabelecimento da ordem constitucional”. Poderia ser de um mês, um ano ou mais.
Nesse período, o interventor suspenderia decisões que julgasse inconstitucionais – a diplomação de Lula (PT), por exemplo – e afastaria ministros do STF. Esse roteiro do golpe compõe um relatório de 66 páginas produzido pela Diretoria de Inteligência.
“CID, pelo amor de Deus, o homem tem que dar a ordem”, suplica o coronel Lawand Junior no dia 10 de dezembro. O mesmo pedido já havia sido feito pelo militar, em áudio, no dia 1º daquele mês. Naquela ocasião, o braço direito de Bolsonaro respondeu que o então presidente não ‘daria a ordem’ por não confiar no ‘ACe’, uma possível alusão ao termo Alto Comando do Exército.
Ao insistir no pedido a Cid, Lawand Junior avalia que, se Bolsonaro não confia na cúpula, deve acreditar que as camadas mais baixas do Exército estariam com ele ao pôr em prática a trama elaborada. A avaliação, sustenta ele na conversa, foi colhida com outro militar em frente ao quartel de Brasília.
“Assessore e de-lhe [sic] coragem. Pelo amor de Deus”, repete o coronel. Cid então responde: “Muita coisa acontecendo…Passo a passo…”. “Excelente!!!”, se anima Lawand Junior com a confirmação de que o plano teria caminhado.
Cid, braço direito de Bolsonaro, está preso por suspeitas fraudes em cartões de vacinação. Seu celular, apreendido na ocasião, engrossou o inquérito que apura atos antidemocráticos, que incluem as investigações sobre o terrorismo no dia 8 de Janeiro, em Brasília. Pelas revelações, ele se tornou alvo da CPI dos atos golpistas no DF e da CPMI do 8 de Janeiro no Congresso Nacional.
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