Justiça

CNJ também apura suposto envolvimento da Transparência Internacional em destinação de recursos

A ONG foi mencionada em um documento que apontou indícios de ‘gestão caótica’ nos trabalhos da Lava Jato

O ministro do STF Dias Toffoli. Foto: Evaristo Sá/AFP
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A ONG Transparência Internacional, alvo de um pedido de investigação assinado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli, já havia sido mencionada no ano passado em um documento do Conselho Nacional de Justiça que apontou indícios de “gestão caótica” no controle de dinheiro proveniente de acordos de colaboração premiada e de leniência na Lava Jato.

Embora a TI não seja o principal alvo do processo de apuração no CNJ, um relatório parcial produzido em setembro diz ter constatado que “a força-tarefa da Lava Jato discutiu os termos e submeteu minuta do acordo de assunção de compromissos a avaliação de organismo internacional (Transparência Internacional)”.

Entre as diligências realizadas, segundo o Conselho, esteve a oitiva de Bruno Alves Brandão, diretor da Transparência Internacional no Brasil. O teor do depoimento segue sob sigilo.

A expectativa é que o CNJ apresente em março um relatório sobre a correição extraordinária na qual o suposto papel da ONG está sob apuração. Trata-se, porém, de uma investigação muito mais ampla, que mira a 13ª Vara Federal de Curitiba e o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, responsáveis pelos processos da Lava Jato na primeira e na segunda instâncias, respectivamente.

O relatório parcial identificou indícios de ‘um possível conluio envolvendo os diversos operadores do sistema de justiça’, cujo objetivo seria destinar bilhões de acordos no exterior para ‘interesse exclusivo’ de integrantes da Lava Jato. Segundo o CNJ, houve uma “gestão caótica” de verbas resultantes de acordos firmados com empresas pelo Ministério Público Federal e homologados pela 13ª Vara.

No período entre 2015 e 2018, o juiz titular era Sergio Moro e a juíza substituta era Gabriela Hardt. Já o procurador-chefe da Lava Jato em Curitiba era Deltan Dallagnol.

No âmbito desses acordos, a Lava Jato repassou à Petrobras mais de 2 bilhões de reais, entre 2015 e 2018, período em que a empresa era investigada nos Estados Unidos. Cerca de 2,6 bilhões de reais, por fim, serviriam para criar uma fundação que supostamente empreenderia ações contra a corrupção.

O CNJ viu falta de ‘zelo’ aos magistrados nos processos, por conferirem à Petrobras e a outras entidades privadas a destinação de valores oriundos das colaborações, “ao arrepio de expresso comando legal”.

O relatório rechaça a possibilidade de o destino dos bilhões atender ao interesse público, requisito previsto nas cláusulas de um acordo entre a Lava Jato e a Petrobras. A avaliação é que a negociação prestigiava a força-tarefa, “em sua intenção de criar uma fundação privada”, a petroleira e um grupo restrito de acionistas minoritários.

A Lava Jato só desistiu de levar adiante a fundação privada para gerenciar esse orçamento bilionário após uma forte repercussão negativa. Desde então, contudo, a ideia da força-tarefa continua a receber críticas.

O fundo privado chegou a ser criado a partir de um acordo de 853,2 milhões de dólares que a Petrobras fechou com o governo norte-americano. Desse valor, 2,6 bilhões deveriam ser aplicados no Brasil. Em janeiro de 2019, o montante foi transferido para uma conta vinculada à Justiça Federal do Paraná.

O acordo inicial entre MPF e Petrobras, homologado pela 13ª Vara, previa o uso de cerca de 1,3 bilhão de reais para pagar acionistas minoritários da empresa e de 1,3 bilhão para bancar projetos, iniciativas e entidades que “reforcem a luta da sociedade brasileira contra a corrupção”.

Depois de meses de impasse, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, decidiu que os 2,6 bilhões de reais, correspondentes a 80% de uma multa imposta à Petrobras por órgãos americanos, seriam destinados à educação e ao combate a queimadas na Amazônia.

Na segunda-feira 5, ao determinar uma apuração sobre a Transparência Internacional, Dias Toffoli afirmou ser necessário “investigar eventual apropriação indevida de recursos públicos” por parte da ONG e de seus responsáveis, “sejam pessoas públicas ou privadas”.

Segundo Toffoli, as cláusulas sobre os recursos deveriam garantir que o dinheiro fosse destinado conforme as normas legais e orçamenárias, “jamais por uma instituição privada, ainda mais alienígena e com sede em Berlim”.

O outro lado

Em nota divulgada após a decisão de Toffoli, a Transparência Internacional afirmou que “são falsas as informações de que valores recuperados através de acordos de leniência seriam recebidos ou gerenciados pela organização”.

“A Transparência Internacional jamais recebeu ou receberia, direta ou indiretamente, qualquer recurso do acordo de leniência do grupo J&F ou de qualquer acordo de leniência no Brasil. A organização tampouco teria – e jamais pleiteou – qualquer papel de gestão de tais recursos”, diz o comunicado.

A ONG sustenta ter produzido e apresentado um estudo técnico com diretrizes e as melhores práticas de governança para destinar “recursos compensatórios” em casos de corrupção. Diz também que “tais alegações já foram desmentidas diversas vezes pela própria Transparência Internacional e por autoridades brasileiras, inclusive pelo Ministério Público Federal”.

“Reações hostis ao trabalho anticorrupção da Transparência Internacional são cada vez mais graves e comuns, em diversas partes do mundo”, prossegue a nota. “Ataques às vozes críticas na sociedade, que denunciam a corrupção e a impunidade de poderosos, não podem ser naturalizados.”

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