Política
Reeditar o passado não resolverá o futuro da esquerda, diz Boulos
O candidato a presidente pelo PSOL, Isa Penna e espanhol do Podemos debateram maneiras de enfrentar o avanço mundial da extrema-direita


Na ultima quinta-feira 15, Guilherme Boulos (PSOL), a deputada Isa Penna (PSOL) e o espanhol Miguel Urbán (Podemos) discutiram a reorganização global da esquerda. O debate ofereceu caminhos a uma questão central: por que a decepção com o neoliberalismo foi capturada pela extrema-direita?
O candidato a presidente do PSOL apresentou suas saídas para as questões urgentes da política nacional, como a Reforma da Previdência. Boulos é crítico ao regime de capitalização, inspirado na reforma empregada pelo pinochetismo no Chile. “Isso fez do Chile o país com maior taxa de suicídio de idosos acima de 80 anos. O que eles estão propondo é entregar a Previdência para os bancos.”
“Querem falar de mudar a Previdência? Nós topamos. Mas vamos discutir os termos. Não é cortando benefício de prestação continuada de famílias com deficientes físicos. É, por exemplo, cortando privilégios de aposentadoria especial da cúpula do Judiciário, é cobrando 400 bilhões de reais de dívidas das grandes empresas com a Previdência pública. Aí a gente topa.”
Segundo o psolista, o MTST e a Frente Povo sem Medo articulam uma série de mobilizações públicas contra a reforma. “Esse não é apenas um debate pontual de aposentadorias, mas um debate de futuro. Espero a participação de vocês”, completou, sob aplausos de público atento (e muito jovem) na livraria Tapera Taperá, no centro de São Paulo.
Saída pela esquerda
O trio discutiu também da perda do espaço democrático. No Brasil, as derrotas sucessivas culminaram na vitória de Jair Bolsonaro, e no avanço de ideias conservadoras que, de tão arcaicas, já eram consideradas letra morta com teor humorístico.
Isa Penna ressaltou a importância das mobilizações feministas contra Bolsonaro – e porque o movimento é tratado como inimigo pelo governo e pelas franjas obscurantistas que o cercam. “O feminismo coloca questões-chave, como o trabalho doméstico. Pra mim, isso é central. Outro desafio é combater o feminismo liberal, o feminismo da Globo, que quer nos fazer crer que a visibilidade resolve o problema.”
Boulos defendeu que os partidos progressistas brasileiros trabalhem juntos – superando diferenças pontuais e desejos de hegemonia – por uma nova alternativa ao país.
“Não podemos apresentar um projeto de futuro ‘retrovisor’, que quer reeditar o passado. Houve avanços importantes nas experiências progressistas no nosso país, mas houve limites também. Encanto, esperança e perspectiva não se vendem no supermercado. Não se conseguem com aumento salarial”, disse.
Na Espanha, o principal exemplo dessa fenômeno é a rápida ascensão do Vox, um partido de extrema-direita que tem como um dos objetivos acabar com a ‘lei Maria da Penha’ local. Nesta sexta-feira 15, o líder do governo espanhol, derrotado no Parlamento, decidiu convocar novas eleições. “Nas próximas eleições, pode ser que a extrema-direita seja a segunda maior no Parlamento Europeu, a primeira será a direita”, lamentou Urbán.
Para o deputado espanhol, vivemos hoje uma crise civilizatória que o capitalismo acelerou ao invés de frear, e oferecer uma resposta coerente e solidária é o grande desafio da esquerda. E que a solução é solidária e anticapitalista.
“Numa revolta anti-establishment, a extrema-direita se mostrou como elemento mais provocador, mais coerente. Quando os próprios capitalistas passaram a reconhecer as falhas do ‘capitalismo com rosto humano’, descobrimos que a face desse capitalismo na verdade é a de Trump e Bolsonaro”, opinou.
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Depois de anos bicudos, voltamos a um Brasil minimamente normal. Este novo normal, contudo, segue repleto de incertezas. A ameaça bolsonarista persiste e os apetites do mercado e do Congresso continuam a pressionar o governo. Lá fora, o avanço global da extrema-direita e a brutalidade em Gaza e na Ucrânia arriscam implodir os frágeis alicerces da governança mundial.
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