Alberto Villas

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Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'

Opinião

Zé Celso só poderia morrer como morreu

Ah, como eu gostaria que ele estivesse aqui para representar a sua morte ali no Oficina. Seria mais uma obra-prima

Créditos: Reprodução Instagram
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Há dez anos, contei aqui neste espaço, uma história envolvendo o Zé Celso, acontecida em Paris, no ano de 1977. Hoje cedo, a primeira coisa que fiz foi reler o texto e chorar um pouco.

Vou deixar no final da crônica, o link para quem não leu e se interessar a ler, possa. 

De lá pra cá, tudo mudou. O mundo, principalmente. A Internet tomou conta dos nossos corações e mentes. Naquela Paris de 1977, quando o Zé passou quinze dias na minha quitinete, eu datilografava textos e poemas numa máquina de escrever portátil, com teclado adaptado para o Brasil, maquininha creme que comprei numa loja no Boulevard Saint Germain, onde vendiam máquinas com teclado até em russo. 

As fotografias que fiz dele, todas em preto e branco, ficaram no espólio do primeiro casamento. Os discos que ouvíamos naquela época eram vinis de Belchior, de Gonzaguinha, de Egberto Gismonti, de Hermeto Pascoal, dos Novos Baianos cantando mais um Bahia, mais um Buchinha!

Tomávamos Beaujolais e comíamos baguete fatiada com camembert. Falando assim, até parece coisa de rico, mas não era. O nosso coração era de estudante. Tinham podado nossos momentos, desviado nosso destino, o sorriso de menino, quantas vezes se escondeu.

Zé Celso não dormiu ali em um colchão luxuoso. Era um tatame no chão e ele se sentiu bem, ficando na posição de Buda, como se fosse o nosso. 

O tempo passou, eu bem que tentei voltar a me encontrar com ele. E não encontrei. Nunca mais encontrei. 

A minha televisão estava no mudo, cansado que estou de tanta política e economia, no canal a cabo que assino. De tempos em tempos, leio a tarja e foi assim que fiquei sabendo que Zé Celso nos deixou. 

Pensei na ironia. Zé Celso não poderia morrer velhinho, com a respiração cansada, de falência múltipla dos órgãos.

Morreu como morreu, depois de uma noite inteira de trabalho. Acordou já em chamas como se estivesse na Roma de Nero. 

Ah, como eu gostaria que ele estivesse aqui para representar a sua morte ali no Oficina. 

Seria mais uma obra-prima. 

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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