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Vírus não escolhe classe, etnia ou gênero, mas nossas instituições sim

Mesmo métodos de prevenção básicos consistem em itens e serviços de luxo para muitos brasileiros

Foto: Roberto Parizotti
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Essa é a primeira pandemia do capitalismo moderno. O Covid-19 tem se espalhado rapidamente por todo o mundo, sem qualquer distinção social ou geográfica. As viagens internacionais, ainda que restritas às classes privilegiadas, de fato as tornaram mais suscetíveis à exposição ao vírus em um primeiro momento. Contudo, logo a balança pesa para o outro lado: quando a doença já se espalha pelo país, são os pobres os mais expostos e os menos protegidos.

No dia 6 de fevereiro, foi sancionada a Lei nº 13.979, que prevê novas medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública. Dentre as medidas adotadas, duas seriam essenciais para a contensão da propagação do vírus: o isolamento e a quarentena. Além delas, a norma determinou medidas de segurança que poderiam ser tomadas pelos governos federal, estadual e órgãos de saúde e dispensou que órgãos públicos realizassem licitações para a aquisição de materiais de higiene e prevenção à disseminação do vírus.

Enquanto parte do mundo empresarial formalizado aposta nas oportunidades do home office, na informalidade e na própria formalidade precária, e o governo anuncia medidas neoliberais, parcela dos trabalhadores permanece exposta em sua jornada cotidiana e insegura com a manutenção de seus empregos e renda. Para eles, o trabalho remoto não é uma opção. Além disso, essa população encara parte da classe média em pânico, correndo aos mercados, consumindo cegamente e de forma imprudente, estocando alimentos, papel higiênico, máscaras, água, álcool, etc.

 

O vírus não escolhe classe, não escolhe etnia e não escolhe gênero. Mas nossas instituições, nossos hábitos e os monopólios de um ou outro grupo social influenciam inexoravelmente os indicadores sociais de desigualdade; ou seja, o impacto do “isolar-se”, para trabalhadores informais e precarizados, não é uma escolha.

Quando a sua sobrevivência depende do quanto se trabalha, e trabalhar parece ameaçar a sua sobrevivência, tudo fica muito complicado. Ou se fica vulnerável ao vírus, ou não se paga as contas.

Mesmo os métodos de prevenção básica – do acesso à água encanada ao sabão e ao tão aclamado álcool em gel – consistem em itens e serviços de luxo para muitos brasileiros e não contemplam a realidade de grande parcela da população. Precisamos, urgentemente, olhar o “espelho” e compreender a pandemia no contexto da desigualdade social brasileira.

É de tamanha irresponsabilidade e negligência social dizer e pensar “isso não vai me afetar”, ou “eu não sou o grupo de risco”. Todos nós que temos um salário fixo, a opção de se adotar o trabalho remoto, que vivemos em uma casa que comporte todos os seus habitantes confortavelmente, que têm veículo próprio e não precisa se deslocar de transporte público – nós somos socialmente responsáveis e devemos nos levantar contra o discurso negacionista. Relativizar esse tipo de individualismo também é contribuir para sua existência.

Em momentos de crise, o caráter de todos nós se sobressai, ainda mais em um contexto de capitalismo extremo, em que Bolsonaros, Guedes e Trumps querem sucatear os sistemas sociais e enaltecer a privatização e o livre mercado. O pânico disseminado por esses sujeitos políticos precisa se transformar em trabalho coletivo: liberando sua diarista e, ainda assim, assumindo sua diária, ajudando vizinhos idosos com as compras, pressionando empresas para proteger seus funcionários.

Se não mudarmos a forma que habitamos esse mundo, catástrofes ambientais e pandemias vão se tornar uma realidade mundial constante. Por isso é muito importante um Estado que priorize a saúde pública, a educação e a arte.

Não precisamos de um presidente imprudente, que trate com descaso uma pandemia, colocando a vida da população brasileira em risco. Precisamos de resiliência para transformar o desconhecimento em informação, só assim nosso sistema imunológico será capaz de combater o vírus Covid-19 e seus sujeitos políticos antagônicos.

A Organização Mundial da Saúde garante que há como superar a pandemia, mas ela deixará como mensagem o exercício de repensarmos nossa existência.

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