Os ecos de Preussenschlag

Bolsonaro outorgou a si mesmo a condição de guardião máximo da Constituição. Não se trata de mera interpretação temerária da Constituição ou mesmo de abuso, desvio de poder ou de finalidade. É mais grave

Foto: EVARISTO SA / AFP

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Recentemente, o Supremo Tribunal Federal condenou o ­deputado federal Daniel Silveira à pena de reclusão de oito anos e nove meses pelos crimes de ameaça ao Estado Democrático de Direito e de coação no curso do processo. A condenação deveu-se a um vídeo publicado pelo deputado nas redes sociais, cujo conteúdo incluía xingamentos a magistrados do STF. Daniel Silveira foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República por praticar agressões verbais e graves ameaças contra ministros da Corte e incitar a animosidade entre as Forças Armadas e o Supremo.

No dia seguinte ao julgamento – e, portanto, antes mesmo da publicação da decisão e do seu trânsito em julgado –, o presidente da República concedeu-lhe indulto individual ou graça. Não há dúvidas de que o presidente possui competência discricionária para a concessão de indulto individual. Entretanto, discricionariedade não se confunde com arbitrariedade. É preciso aferir se a decisão foi compatível com a Constituição.

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1 comentário

PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 2 de maio de 2022 14h58
É no dizer do mestre constitucionalista José Afonso da Silva que “nos regimes democráticos não existe governante irresponsável. As autoridades designadas para exercitar o governo devem responder pelo uso que deles fizerem uma vez que ‘governo irresponsável’, embora originário de eleição popular, pode ser tudo, menos governo democrático.” Neste sentido, vemos que Jair Bolsonaro pode editar Indulto Individual, dentro de sua discricionariedade, porém, sem arbitrariedade, como pretendeu conceder o mandatário. Ferindo de morte o princípio da Impessoalidade e por Desvio de Função, além de não atender ao Interesse Público, eis que o, ainda deputado, Daniel Silveira atentou contra as Instituições Democráticas, insultando ministros do STF e insuflando a população para atos violentos contra as mesmas instituições. Se o próprio STF não agir para coibir ou cassar o tal Indulto, qualquer um do povo poderá desobedecer qualquer juiz quando condenado, qualquer patrão não cumprir uma sentença que lhe obrigue a pagar o trabalhador, ou mesmo, alguém condenado ao pagamento de uma pensão alimentícia, não cumprir a determinação de um magistrado. A insegurança jurídica dar-se-á de cima para baixo, tendo Bolsonaro aberto precedente para a desobediência civil perante o próprio Poder Judiciário, tendo em vista que é a nossa Corte Suprema a última a dizer o que se deve ou não se deve fazer cumprindo os ditames kelsenianos. Nem na fase da ditadura militar, o Estado de Exceção teve tanta audácia como nesse governo Bolsonaro. Assim, o STF como também toda a sociedade brasileira deveriam reagir no sentido de obstar essa arbitrariedade manejada pelo presidente Bolsonaro em querer editar tal decreto que venha a livrar da sanção um seu aliado. Mas isso serviu apenas de uma forma de experimento para Jair Bolsonaro, eis que seus filhos estão, também com inquéritos no STF, e, também poderiam ser objeto de condenação. Daniel Silveira serviu como uma espécie de boi de piranha para intimidar o supremo e livrar os seus filhos.

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