Alberto Villas

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Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'

Opinião

Os bichos

Eu fui criador de pombos na juventude – sim, fui um columbófilo

Foto: AFP
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A nossa faxineira chegou toda animada. Sabendo que eu fui criador de pombos na juventude, sim, fui um columbófilo, me contou que um casal fez o ninho no peitoril do apartamento onde trabalha alguns dias da semana. Ficou encantada de ver os dois trazendo palha por palha no bico, para deixar o ninho bem seguro e confortável. Caiu na bobagem de contar pra patroa e ela mandou tirar, limpar tudo. Ela não obedeceu. Como era no cantinho do parapeito, fechou a cortina e deixou o casal lá quieto, construindo mais uma família.

Prometeu trazer uma foto. Na semana seguinte, contou que já tinham dois ovinhos no ninho, a coisinha mais linda. Três semanas depois, ela fez um vídeo. Os dois filhotinhos tinham acabado de nascer e ela ficou espantada com a feiura deles. Cabeça grande, olhos roxeados, asinha pequena, penugem amarela, bem destrambelhados.

Expliquei a ela que eles crescem depressa e, em breve, estariam com penas ensaiando sair do ninho, voando. Sábado passado, ela abriu a porta e foi logo dizendo: que sujeira que eles fazem! Meu Deus! Contou que os filhotes já estavam saindo do ninho, andando pelo parapeito e, sorte deles, a patroa estava viajando esses dias todos. Hoje ela mandou uma mensagem de voz: voaram!

Tínhamos apenas um peixinho vermelho que compramos dentro de um saquinho de plástico transparente, dentro de um aquário redondo, desses de desenho animado. O peixinho passava o dia – e acho que a noite toda – nadando pra lá e pra cá, parece que procurando a saída. Os meus filhos mais velhos, hoje adultos, adoravam aquele peixinho que era alimentado com uma farinha meio fedorenta, cheirando a peixe. Estava gordinho, o danado, de tanto comer.

Um sábado, a faxineira (era outra) chegou animada e foi logo dizendo que o apartamento estava precisando de um faxinão. Ela começou pela sala, colocando todos os enfeites na varanda para passar um pano com Poliflor nos móveis. Junto com os enfeites, foi o aquário do peixinho vermelho.

Assim que ela terminou o tal faxinão, foi colocar tudo nos lugares. Foi aí que ela sentiu falta do peixinho vermelho. Com o calor, sol a pino batendo naquele aquário, ele simplesmente pulou, mas como estava perto do abismo, saltou do décimo sexto andar daquele prédio na Rua Sabará, esquina de Maranhão. Pânico em Higienópolis! Corri sozinho até o térreo para ver se encontrava o corpo estendido no chão. Os meninos, chorando, não tiveram coragem de descer comigo para o resgate. Qual foi a minha surpresa ao ver aquele pontinho vermelho no gramado fofo, cercado por duas minúsculas formigas. Quando coloquei aquele corpinho nas minhas mãos, vi que ele ainda respirava. Sim, ele respirava. Subi correndo os dezesseis andares e voei com ele pra dentro do aquário. Não é que ele saiu nadando? Meio de lado, mas nadando. Ficamos eufóricos! Mas, três dias depois ele amanheceu boiando no aquário, agora sim, morto.

A história é do balacobaco. Uma mulher foi presa no Rio de Janeiro, essas coisas de tráfico e golpes. Passou uns dias na cadeia e acabou ganhando liberdade condicional. Foi pra casa, levando no tornozelo uma toronozeleira preta, medonha. Mas, safa, ela pagou uma grana pro carcereiro instalar aquele objeto de uma maneira frouxa, como eles dizem.

Já em casa, ela teve uma ideia. Não dava pra viver com aquela coisa medonha no tornozelo. Não titubeou. Arrancou fora a tornozeleira e, minutos depois, ela estava instalada num porquinho que ela criava no chiqueiro, no fundo do quintal. Alguns dias depois, lá na delegacia, desconfiaram daquela presa que passava o dia num cômodo de dois metros quadrados, inclusive dormia lá. Foram fiscalizar e encontraram o porquinho chafurdando na lama, e com tornozeleira. Ao ler a notícia, não pude deixar de rir. Fiquei imaginando os policiais pulando o chiqueiro, tentando agarrar o porquinho para retirar a tornozeleira do bicho. Resultado: a mulher voltou pra cadeira e o porquinho continua em prisão domiciliar, mas sem tornozeleira.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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