Camilo Aggio

Professor e pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais, PhD em Comunicação e Cultura Contemporâneas

Opinião

Jair Bolsonaro cresceu nas pesquisas, meu Deus!

Os climas de opinião importam e serão determinantes nesta eleição

Foto: EVARISTO SA / AFP
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Expectativas irrealizáveis, falsas ou desmedidamente otimistas são um prato cheio para a frustração. Não há fórmula mais eficaz para a fossa emocional. Eu diria que, em todas as dimensões da vida, abraçar o realismo em detrimento de idealismos é um bom caminho para a saúde mental e emocional. Para a vida coletiva, idem.

Quando chegamos na dimensão da política, no entanto, adentramos um outro aspecto: as expectativas não levam apenas à frustração, mas à derrota antes improvável.

Chegamos a uma sexta-feira de uma semana de júbilo para as pretensões eleitorais de Jair Bolsonaro. E nada tem a ver com as repercussões de sua tática de campanha acertada e coordenada ao ir ao podcast Flow ou mesmo com algumas oscilações positivas documentadas por pesquisas de opinião, mas sim com as reações antibolsonaristas a tudo isso. Ou, ao menos, supostamente antibolsonaristas.

Trata-se de um comportamento gestado há algum tempo: a qualquer movimentação dentro da margem de erro, eis os alarmistas de plantão: Jair Bolsonaro cresceu, meu Deus. Para eles, pouco importa se Bolsonaro continua sendo o mandatário, com todo o poder que essa posição comporta, em um segundo lugar ainda muito distante de Lula.

Também pouco importam detalhes técnicos, como a necessidade de recalibrar margens de erro conforme a amostra de uma pesquisa. É comum ver analistas usando a margem de erro dos dados agregados, do cenário geral, para tratar dos votos discriminados por sexo, renda, região e outros.

Mas, por enquanto, vamos deixar esse aspecto de lado e lidar com os dados mais palpáveis para evitar riscos de negacionismo. Hoje saiu uma nova pesquisa do instituto Quaest com as intenções de voto em Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do Brasil.

Na comparação com o levantamento anterior, Bolsonaro teria subido 5 pontos e Lula caído 4. Pronto. A casa caiu, outra vez mais, nas redes digitais. Há razão para tanto? Eu creio que não. A não ser que você realmente acreditasse que Lula ia manter, como um ato de fé, uma margem tão confortável de distância até o fim da disputa presidencial, sem percalços e oscilações. Ora, ledo engano, ainda que a desde sempre improvável vitória no primeiro turno continue sendo uma possiblidade, segundo a própria Quaest e o instituto Datafolha.

A mesma pesquisa que mostra crescimento de Bolsonaro indica Lula quase 10 pontos à frente  no cenário de primeiro turno. Minas é aquele estado que deu quase 60% de votos ao presidente em 2018. Respondam-me: quem está em vantagem relativamente confortável? Quem deve se preocupar mais ou disparar alarmes, visto que estamos a menos de dois meses das eleições? Na última pesquisa de alcance nacional da Quaest, Jair Bolsonaro está distante 12 pontos do primeiro colocado. No último DataFolha, 18%.

Eis a gravidade das reações públicas desmedidas, alarmistas e irrealistas para um embate eleitoral tão delicado e fundamental para a democracia brasileira: elas geram climas de opinião, como demonstrou Elizabeth Noelle-Neumann. Isso significa que as reações formam opiniões que se agregam na esfera pública e constroem um clima de propagação de impressões com poder de influência em mais percepções e atitudes públicas. Quanto mais as pessoas vão se convencendo de que tem algo de errado, mais pessoas vão sendo convencidas de que há algo de errado, mesmo que, empiricamente, isso seja falso ou um retumbante exagero.

A constatação da existência desse fenômeno na opinião pública está umbilicalmente ligada à teoria da espiral do silêncio da mesma cientista  política, ou seja: a crença pública em qual candidato vai vencer ou perder é crucial para o resultado de disputas eleitorais. O candidato que consegue vencer a disputa sobre a percepção pública de quem será eleito aumenta significativamente as suas chances. Traduzindo: a cada alarde sobre o crescimento de Bolsonaro (ainda que marginal, ainda que o candidato continue em expressiva desvantagem), maiores as chances de formação de um clima de opinião de que ele vai vencer. Ou seja, uma ajuda magistral de seus concorrentes.

E isso é crucial para que sua militância se anime e se engaje, busque influenciar, e suas bases de militância adversárias se desanimem, se desengajem.

Trocando em miúdos, confundir prudência, sobriedade e realismo com posições de alerta constantes em detrimento dos que os melhores dados e informações sugerem é uma excelente tática de autossabotagem derrotista. Climas de opinião importam e influenciam.

A disputa por percepções na opinião pública é o cerne de qualquer eleição que dependa de comunicação política em larga escala. Nesta semana, Bolsonaro saiu-se muito bem, graças a seus adversários.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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