Diálogos da Fé

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Malafaia em surto expõe a falência moral do bolsonarismo religioso

Sem coordenação e sem pacto simbólico, os fiéis deste projeto se voltam uns contra os outros

Malafaia em surto expõe a falência moral do bolsonarismo religioso
Malafaia em surto expõe a falência moral do bolsonarismo religioso
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o pastor Silas Malafaia durante ato pela anistia a golpistas em Brasília – Foto: Sergio Lima/AFP
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Silas Malafaia, pastor midiático que há décadas se apresenta como paladino da moral cristã e defensor da família tradicional, foi flagrado em um surto de fúria. Em áudios direcionados a Jair Bolsonaro, chamou Eduardo, filho investigado do ex-presidente, de “babaca” e prometeu “arrebentar” o deputado. A cena é grotesca — sobretudo vinda de quem se vende como líder espiritual de milhões. O episódio não apenas rompe o verniz moralista que sustenta parte da extrema-direita religiosa no Brasil, como expõe o método de intimidação que atravessa esse projeto político.

O choque não é pequeno para fiéis que veem na fé um espaço de oração e dignidade, e não um palanque de insultos. O evangélico comum não é Malafaia. E ouvir um pastor usar esse vocabulário, ainda mais em meio a uma crise política, causa constrangimento e abala a confiança. O discurso que sequestrou a moralidade pública por anos mostra sinais de falência.

Nos áudios, Malafaia fala menos como líder espiritual e mais como chefe de facção. Sua retórica é de humilhação e ameaça: controla, enquadra, reprime. Entre o púlpito e os bastidores, o objetivo é o mesmo — manter poder por meio do medo. O discurso bíblico é distorcido em ferramenta de dominação. A violência verbal se naturaliza, mesmo entre quem diz falar em nome da paz de Cristo.

Reprodução/PF

A cena soa como colapso ideológico. Não há sobriedade nem confiança, só raiva e desespero. O alvo, desta vez, não é a esquerda, a imprensa ou o STF, mas Eduardo Bolsonaro, suposto aliado. É a própria hierarquia do bolsonarismo religioso que se desfaz em público.

Malafaia nunca se limitou ao púlpito. Agiu como operador político, negociando cargos, silenciando adversários, ditando condutas. Seu título de “conselheiro espiritual” de Bolsonaro sempre foi um eufemismo para articulador de guerra santa. Como inquisidor moderno, definiu ortodoxos e desviantes, fiéis e infiéis, quem merecia acolhimento e quem precisava ser “arrebentado”. O bolsonarismo lhe deu carta branca. Agora, a imagem de uma direita cristã unida e disciplinada se esfarela pelas mãos de seus próprios profetas.

A unidade que serviu como arma contra inimigos externos rui em insultos e ameaças internas. A teocracia informal que marcou o debate público na última década revela suas fissuras não pela oposição de esquerda, imprensa ou Judiciário, mas pela corrosão dos próprios líderes. O altar rachou. E, sem coordenação nem pacto simbólico, os fiéis desse projeto se voltam uns contra os outros. O bolsonarismo está em fratura exposta.

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