Frente Ampla

Fortalecer o papel dos sindicatos na luta pela reconstrução nacional

O enfraquecimento da capacidade de mobilização e resistência dos sindicatos tem impacto direito na perda de direitos, precarização e piora na qualidade de vida dos trabalhadores

Orlando Silva quer cassar alvarás de estabelecimentos por racismo. Créditos: Jennifer Glass
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No último dia 11 de setembro, o Supremo Tribunal Federal finalizou um julgamento de grandes repercussões políticas e sociais ao declarar como constitucional a instituição da contribuição assistencial, através de negociação ou acordo coletivo, aos empregados de uma categoria para seu sindicato, resguardado o direito de oposição. 

Não faltou quem corresse às redes sociais a protestar contra a suposta volta do “imposto sindical”, mais uma mentira difundida com propósitos políticos. Na verdade, o STF faz uma correção de rota que assegura que a entidade sindical possa receber uma pequena contribuição por um serviço essencial que presta a toda categoria sob sua representação. 

Funciona assim: quando o sindicato de trabalhadores e o patronal se sentam à mesa, no período de dissídio coletivo, negociam e celebram um acordo de reajuste salarial ou de benefícios, eles estão atuando para a totalidade de suas categorias, prestando-lhes um serviço que contempla o conjunto dos representados. Também nesse período seria acordada a contribuição assistencial.

Nada mais razoável que, quando se aprova os termos do acordo em assembleia, esse mesmo fórum possa deliberar sobre uma contribuição destinada à manutenção da entidade sindical que conquistou os benefícios. Ainda assim, pela decisão do STF, o empregado ou empregador poderá exercer seu direito de oposição, seja na própria assembleia ou comunicando oficialmente a entidade que não aceita o desconto.

A decisão do Supremo faz justiça e vem em boa hora. A famigerada Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) foi uma verdadeira revanche do capital que acarretou a desregulamentação das relações laborais, superexploração dos trabalhadores e até mesmo a desestruturação do sistema de proteção sindical, através da inviabilização do financiamento das entidades. Findaram com o imposto sindical e não colocaram nada em seu lugar, sequer foi estipulado um período de transição. 

Para além do papel reivindicatório, que per si já é de grande relevância, os sindicatos podem e devem ser entidades ativas no debate sobre projetos para o país, de elevação da consciência crítica da classe trabalhadora e de sua organização para a construção de um país mais democrático, socialmente justo, desenvolvido e soberano. Em suma, sindicatos fortes e atuantes são essenciais para a própria democracia.

Mas é impossível manter entidades com esse caráter sem qualquer meio de financiamento. Segundo estimativas oficiais, já no primeiro ano de vigência da reforma, os sindicatos perderam mais 90% de suas receitas, um abismo de R$ 3,6 bilhões (2017) para R$ 500 milhões (2018). Engana-se quem pensa que o garrote financeiro só atingiu os trabalhadores. Eles foram os mais afetados, é fato, com perda de R$ 2,24 bilhões para R$ 207,6 milhões, mas as entidades patronais também perderam grande volume de recursos, de R$ 806 milhões para R$ 207,6 milhões.

O resultado não poderia ser mais desastroso. Inúmeras entidades sindicais se viram obrigadas a fechar as portas ou a se fundirem, deixando muitas categorias desassistidas e até mesmo num limbo de representação jurídica, sem contar os diversos serviços que sindicatos e centrais prestavam a seus sócios e tiveram que deixar de oferecer. Um dos reflexos é que, segundo a PNAD Contínua, na última década, os sindicatos brasileiros perderam 5,2 milhões de sindicalizados, sendo 1,3 milhão nos últimos 3 anos. A taxa de sindicalização caiu abaixo dos 10%, com pouco mais de 9 milhões de associados frente a 99,6 milhões de população ocupada.

O enfraquecimento da capacidade de mobilização e resistência dos sindicatos tem impacto direito na perda de direitos, precarização e piora na qualidade de vida dos trabalhadores

Durante os quatro anos de Bolsonaro, por exemplo, foi a primeira vez na história que um governo concluiu seu mandato sem dar 1 real sequer de aumento real no salário-mínimo. 

Segundo o Dieese, de 2018 para 2019, portanto ainda no período anterior à pandemia, caíram de 74,8% para 49,9% os acordos coletivos que conquistaram reajuste além da inflação, e, no mesmo período, subiram de 9,3% para 23,7% os acordos que sequer repuseram as perdas inflacionárias. Se considerarmos a pandemia, a situação é ainda mais grave, pois em 2021, quando o galope inflacionário foi de 10,06%, nada menos que 47,7% dos acordos coletivos ficaram abaixo desse índice.

Relações de trabalho equilibradas requerem que o poder político e a capacidade de organização e luta dos trabalhadores não deixem a balança pender excessivamente para o polo mais forte. A mão livre do mercado já deu mostras que tem uma singular predisposição para amparar o capital e deixar o trabalho solto no ar. 

O projeto de reconstrução nacional liderado por Lula não pode prescindir de um sindicalismo fortalecido, atuante, politizado e ligado aos desafios contemporâneos do mundo do trabalho. Para cumprir sua função social e a missão histórica de garantir direitos e dignidade à classe trabalhadora, elevar sua consciência crítica e de participação política, os sindicatos precisam ter meios adequados para manter suas atividades. A contribuição assistencial é justa e fundamental para esse objetivo.  

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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