Alberto Villas
[email protected]Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'
Juro que da próxima vez quer for a BH, vou experimentar essa tal de empadinha de jiló. Não tive tempo
Fazia muito tempo, um tempão mesmo que não ia a Belo Horizonte. Quando fui pela última vez, o meu neto Raul não sabia ler, nem escrever. Agora me conta histórias com um livrinho na mão.
Cheguei animado para rever os irmãos, todos os parentes, matar a saudade de um bom e verdadeiro pão de queijo, acompanhado de um cafezim quentim.
Isso aconteceu.
Na verdade, a cidade em si não reconheci. Ruas, avenidas, becos, morros, o comércio, o trânsito, os automóveis, as motocicletas, tudo muito diferente.
Achei que ia comer uma coxinha de galinha acompanhada de um Mate-Couro, ali na Torre Eiffel, Rua Espírito Santo. A Torre Eiffel não existe mais, não consegui nem localizar o comércio que ocupou o lugar.
Senti uma saudade danada das Estâncias Califórnia, coladas ao Viaduto Santa Tereza, onde meu pai comprava frutas secas importadas da Turquia e aquelas caixinhas vermelhas com passas da Califórnia. Já sabia do fim das Estâncias Califórnia, mas passei pra conferir. Não existe nada no lugar.
Já sabia também que a Guanabara, que vendia de tudo, um prédio imponente em plena Avenida Afonso Pena, já não existia mais. Como já não existia mais a Padaria Savassi, a banca de jornal do Seu Benito, o Posto Fraternia, a Drogaria Nossa Senhora do Carmo, o Armazém Colombo, o Bar Grapette, nem mesmo o Sobrado do Torra.
Mas algumas coisas resistem em Belo Horizonte. O Mate-Couro e o Guarapan, o pão doce com açúcar cristal por cima, o sotaque que diz arreda pra lá, a palavra trem pra significar qualquer coisa, a palavra boba no final de muitas frases:
– Vai embora não, tá cedo, boba!
O meu América Mineiro sobrevive, agora com uma loja chiquérrima no Boulevard Shopping. O Mercado Central, mais espetacular do que nunca, a taioba, a moela acebolada nos botequins, o jornal O Tempo, o Minas Tênis Clube, a Lagoa da Pampulha, por exemplo.
Mas o que o tempo levou, ficou na memória.
Frei Claudio, hoje, é apenas um grafite numa das colunas da passarela da Avenida Nossa Senhora do Carmo, que eu ainda chamo de BR-3.
Coisas novas apareceram: a empadinha de jiló, a instalação da Yayoi Kusama, em Inhotim, os viadutos com nomes dos escritores mineiros, a Livraria Jenipapo.
Juro que da próxima vez quer for a Belo Horizonte, vou experimentar essa tal de empadinha de jiló. Não tive tempo.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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