Opinião

A extrema-direita não visa apenas permanecer no poder, mas ampliar sua dominação

Dia 30, escolhamos a democracia, a verdade, o bem comum

Imagem: Marcos Corrêa/PR
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“Diakrisis’ (diácrise) é o discernimento dos espíritos; São Bento a traduz como ‘discretio’. Para ele, essa é a melhor de todas as virtudes. Ela capacita para discernir se os diversos pensamentos que vêm à mente provêm do Espírito Santo, dos demônios ou de nós mesmos. Os monges reconhecem de onde eles provêm pelo efeito que produzem. Pensamentos oriundos do Espírito Santo sempre provocam vivacidade, liberdade, paz e amor. Pensamentos que provêm dos demônios acarretam estreiteza e medo, ou arrogância e orgulho. Nesse caso, a pessoa se sente especialmente importante. Já os pensamentos advindos de nós mesmos dispersam, não fomentam vínculos; passeamos nas áreas da nossa fantasia.” – Anselm Grün.

Mais uma vez, estamos sendo chamados a discernir.

Muitos dizem que a última eleição presidencial – e a atual – passaram e passam primordialmente pelas igrejas.

Acho factível que isso esteja ocorrendo. Principalmente, porque uma das partes em contenda no Brasil é a extrema-direita.

Dessa forma, somos instados a revisitar todo o nosso arcabouço de crenças, que alguns confundem com crendices, por não terem lido corretamente Karl Marx e Antonio Gransci, embora aquelas sejam coisas diversas, antípodas mesmo.

É dos seres acreditar.

Não podemos viver, inclusive do ponto de vista mais fisiológico, sem contarmos com instrumentos de discernimento.

Com efeito, até os animais precisam de parâmetros para suas vidas.

Os humanos, criamos, ao longo de toda a história da nossa existência, coletiva e individual, um sistema articulado de crenças, que vão do empirismo – por exemplo, a arte do cultivo, a agricultura – à espiritualidade.

Posteriormente, transformamos esse referencial em instrumentos, que passam a formar parte de nossa bagagem cultural coletiva: nosso consciente coletivo.

Trata-se, no fundo, de um sistema de poder tão ou mais abrangente do que aquele de estado.

Com efeito, Maik Hosang, em “Amar é a única revolução” (editora Vozes), reflete a propósito: “…o filósofo social Michel Foucault escreveu ser necessário ‘compreender’ o fato de que o poder não está localizado no aparelho do estado e que nada na sociedade será mudado sem que se troquem os mecanismos de poder exteriores, subjacentes e paralelos ao aparelho estatal a funcionarem em nível muito inferior, cotidiano.”

A extrema-direita explora isso muito bem. Por isso, privilegia a pauta de costumes. Sabe o poder e as possibilidades de manipulação que se encontram no âmbito da sociedade e os explora, sem qualquer resquício de moral ou ética.

O genocida e a ex-ministra da goiabeira, recentemente eleita senadora pelo Distrito Federal, são os casos mais evidentes: espalham as mentiras mais estapafúrdias para encobrir a pilhagem que promovem no País em benefício pessoal, auxiliados por uma verdadeira legião de demônios, alguns deles os filhos e esposas do próprio monstro.

De fato, a extrema-direita não visa apenas a permanecer no poder, mas ampliar sua dominação para todo o conjunto da sociedade, instaurando o mais completo autoritarismo.

Naquela mesma obra, Hosang cita o neurobiólogo Humberto Maturana, que amplia aquela reflexão: “Nossas atuais dificuldades não consistem no fato de não dispormos de suficiente saber ou de capacidades técnicas; nossas dificuldades do presente derivam da falta de sensibilidade […], são consequência da perda que sofremos por estarmos inseridos forçosamente nos discursos de conquista, poder, controle sobre a vida e a natureza a marcarem determinantemente nossa cultura patriarcal.”

Essa é uma descrição precisa do projeto de dominação da extrema-direita para o Brasil e o mundo.

Entretanto, a ele se contrapõe uma outra visão de país e mundo.

Nessa outra vertente, Hosang identifica que: “O futuro não apenas da sociedade ocidental, mas também do humano e da Terra em seu todo, depende, sob múltiplos aspectos, da implementação de formas de organização política e, daí derivada, econômica, com características predominantemente cocriativas e não opressoras. Sob o conceito de ‘holocracia’ está se desenvolvendo nos últimos anos uma forma integrativa muito promissora de organização política, mas também de integração social e econômica (tanto para estruturas societárias imediatas como para as mais complexas).”

É incrível como ainda não nos demos conta, mesmo depois da Covid e do aquecimento global, de que a salvação da humanidade será coletiva ou não haverá.

O mesmo vale para a saúde, humana e do planeta; a justiça socioeconômica e a paz, todas impossíveis em a concorrência de todos e todas no planeta.

Dia 30, escolhamos a democracia, a verdade, o bem comum.

A esperança de dias melhores já nos faz pregustar a liberdade e a prosperidade.

Lembremos sempre que, mesmo em meio às trevas, a luz sempre encontra a passagem.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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